Realizado no dia 28 de março na cidade de Mata (RS), o Simpósio Internacional sobre Mortandade de Abelhas e Agrotóxicos contou com a participação de cerca de 75 organizações. Organizado pela Articulação Para a Preservação da Integridade dos Seres e da Biodiversidade (APISBio) e pela Associação dos Apicultores e Meliponicultures de Mata (APISMA), o evento buscou discutir a relação entre o uso indiscriminado de substâncias nocivas em lavouras de grãos e os altos níveis de mortandade de abelhas. Estiveram presentes no Simpósio o professor Gustavo Pinto Da Silva, do Colégio Politécnico, e a professora Martha Adaime, adjunta do Laboratório de Análises de Resíduos de Pesticidas da UFSM (LARP).
No dia 25 de março, o LARP, vinculado ao Departamento de Química do Centro de Ciências Naturais e Exatas (CCNE), divulgou os resultados das análises feitas com as abelhas mortas nas propriedades de produtores de mel de Mata, que encontraram milhares de abelhas sem vida em cerca de 300 caixas. O caso ocorreu em outubro de 2018, levando os apicultores a buscarem respostas sobre o ocorrido, uma vez que constataram que as colméias haviam morrido de causa não natural. Com isso, o grupo de produtores procurou a Patrulha Ambiental para efetivação de uma denúncia, que culminou no registro de um Boletim de Ocorrência junto à Polícia Civil. Posteriormente, a Polícia iniciou um inquérito de investigação, coletando amostras das abelhas mortas e encaminhando-as ao Laboratório de Análises de Resíduos de Pesticidas da UFSM. A pesquisa envolveu o trabalho de Renato Zanella, coordenador do LARP, e dos professores Osmar Prestes e Martha Adaime, também ligados ao Laboratório
As amostras coletadas foram georreferenciadas com o auxílio dos professores Gustavo Pinto e Alessandro Carvalho Miola e, assim, chegou-se à informação espacial dos locais em que houve a morte das abelhas. Com base nos laudos de análise desenvolvidos pelo LARP, também foi possível indicar quais colméias foram extintas por conta das aplicações de pesticidas nas lavouras. Desse modo, confirmou-se que as colméias haviam sido exterminadas pelo uso de agrotóxicos, uma vez que o arquivo de espacialização gerado a partir da localização das amostras revelou que havia muitas plantações – especialmente de soja – no entorno das colmeias exterminadas.
O professor Alessandro Miola explica que a cultura de soja é a que mais realiza a aplicação de pesticidas por via aérea, que acabam chegando a espaços adjacentes por conta da força do vento, gerando impactos negativos para outras culturas menores como a fruticultura, a horticultura e a própria apicultura. “A consequência é a descapitalização do pequeno produtor. Nós estamos indo para um estágio em que, futuramente, os resíduos desses pesticidas irão chegar nas frutas, nas hortaliças, nos tanques de produção de peixes […] Toda essa atividade diversificada da pequena propriedade rural, que é o que mantém as famílias de produtores pequenos no campo, está sendo impactada pelo interesse dos grandes produtores que cultivam uma monocultura e não respeitam as legislações e as normas técnicas para o uso desses produtos […] Enquanto profissionais, educadores e pesquisadores da Universidade, nós temos uma preocupação muito grande com o descumprimento da Lei em relação ao uso de produtos proibidos […] Isso é grave do ponto de vista da segurança pública, da segurança alimentar”, complementa Alessandro.
Os dados obtidos pela análise do LARP foram apresentados pela professora Martha Adaime no Simpósio Internacional sobre Mortandade de Abelhas e Agrotóxicos. Após as falas e palestras ministradas por diferentes associações e pesquisadores, o público presente no evento protocolou uma representação (termo utilizado para se referir a uma denúncia feita a um fato ilícito ou irregularidade que possibilita a adoção de providências) junto ao Ministério Público Estadual sobre a mortandade de abelhas por agrotóxicos no município de Mata. A ação foi firmada com o apoio de 25 organizações, associações, movimentos sociais, cientistas independentes e juristas.
É possível conferir um minidocumentário produzido pelo Coletivo Catarse sobre a mortandade de abelhas em Mata e região no canal da organização no YouTube (youtube.com/coletivocatarse). O material, intitulado “Medo da Primavera – uma hecatombe em andamento”, foi lançado no dia 04 de abril e construído a partir de reportagem feita por Marcelo Cougo, Billy Valdez e Gustavo Türck.
A Universidade Federal de Santa Maria visa, agora, constituir um projeto de apoio científico aos apicultores afetados pelos pesticidas, em especial o 2,4-D Nortox, que sofre com o fenômeno da deriva de vento e alcança distâncias de mais de 30 quilômetros, podendo afetar outras plantações de modo grave. A ação da UFSM deve ocorrer em conjunto com o LARP e com a Secretaria de Agricultura do Estado.