A PoliFeira do Agricultor é uma feira livre que busca diferenciar seus processos de produção e comércio. Um dos exemplos está na prática de manejos biológicos, alinhada a pesquisas e testes, que fazem com que os alimentos comercializados sejam favoráveis à saúde e ao bem-estar do consumidor.
O agricultor André Raddatz, feirante e um dos idealizadores da PoliFeira, tem sua propriedade rural estabelecida na localidade de Três Barras, interior do município de Santa Maria. Entre as suas principais preocupações encontra-se a de buscar alternativas de produção ao sistema convencional, conhecer espécies e cultivares (forma de uma planta cultivada), testá-las e promover inovações ao longo da cadeia produtiva. A PoliFeira, por sua vez, representa o espaço de aprendizado e interação e busca de conhecimentos para a produção de alimentos saudáveis. Entre as ações desenvolvidas pelo projeto que o agricultor sempre acompanha, está o monitoramento de resíduos de pesticidas desenvolvido pelo Laboratório de Análises de Pesticidas dos Alimentos (LARP – UFSM). Ainda que a legislação permita limites de resíduos de agrotóxicos, o trabalho se centra na eliminação da utilização ao longo do processo produtivo, de modo que o alimento chegue ao consumidor com zero de agrotóxicos.
Para garantir que o alimento comercializado não tenha a presença de resíduos, a organização do projeto prioriza a comercialização de alimentos cultivados pelos próprios agricultores, sem intermediação, já que quando o agricultor intermedia a produção de terceiros não tem como garantir a mesma qualidade daquilo que produz. Todavia, no caso de alimentos agroindustrializados, os agricultores precisam fazer esta mediação, já que dependem da compra para produzir os produtos que levam para a feira, como é o caso, por exemplo, das farinhas utilizadas para elaboração de panificados, entre elas a de trigo. O trigo se caracteriza por ser um carboidrato com grande valor energético, com presença de proteínas, gorduras, fibras e minerais (fósforo, cálcio, ferro e vitaminas como B1 e B2), sendo considerado um dos ingredientes mais utilizados na dieta dos humanos.
Foi com o pensamento de ter um produto livre de agrotóxicos que o agricultor André Raddatz se propôs a produzir o ingrediente básico dos panificados por meio de manejos agroecológicos e com a utilização de insumos biológicos. Hoje, no Brasil, grande parte do trigo utilizado é importado, o que acontece em função das condições climáticas do inverno, que favorecem a ocorrência de doenças e, com isso, comprometem a qualidade da farinha. Outra questão, segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Trigo (Abitrigo), é o fato de que apenas 30% da produção nacional possui a concentração necessária de glúten para a panificação.
O produtor Raddatz conta que o processo começou pela pesquisa de variedades de trigo resistentes a doenças comuns nas plantações. Depois de muita busca, a cultivar da Embrapa BRS Bela Jóia, foi definida para plantio pelo fator resistência a doenças. Primeiramente, foi feita uma semeadura teste do cereal, de modo experimental, mas também como cobertura do solo. Ele afirma que não esperava uma produção expressiva, mas que gostou da experiência e conhecimento que adquiriu com o estudo e todo o processo, assim como da descoberta de que é possível produzir um trigo semelhante ao orgânico. Foram colhidos aproximadamente 35 sacos por hectare, menos do que se colhe em outras áreas e em outros modelos de produção. Porém, considerando o baixo custo de produção, esta experiência de cultivo mostra-se como uma alternativa em uma rotação de culturas, na melhoria das condições do solo e, também, como uma possibilidade de geração de renda.
Os impactos da produção de trigo sem o uso de agrotóxicos realizada por André vão além da PoliFeira. Durante o ciclo das culturas de inverno, alunos do curso de Agronomia do IFFar São Vicente do Sul realizaram um estudo na disciplina de Fitopatologia (estudo das doenças de plantas), sob coordenação da professora Emanuele Junges, durante o qual foi promovida uma troca de experiências com os produtores da PoliFeira. Durante a atividade, os produtores enviaram relatos e fotos de suas propriedades e de doenças que estavam em suas plantações. Em aula, os alunos realizaram a identificação e proposições de manejo de acordo com a realidade de cada produtor. Para muitos alunos, este foi o primeiro contato com um produtor que não fosse de sua família, e com os desafios que a produção sem o uso de agrotóxicos representa. A atividade proporcionou um aprendizado técnico e pessoal para os participantes, que puderam vivenciar que uma produção sustentável de alimentos é possível, porém desafiadora.
Espera-se, agora, que as práticas de manejo sugeridas – entre elas, as que ocorreram na propriedade de Raddatz – contribuam para reduzir perdas causadas por doenças de plantas nos cultivos seguintes.
Texto: Júlia Petenon
Edição: Giuliana Seerig