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Estudante do Curso de Arquivologia é o primeiro com deficiência intelectual a defender TCC na UFSM



Marthon Militz tem 31 anos, estuda Arquivologia na UFSM e é apaixonado por televisão. Natural de Itaara/RS, viaja todos os dias para Santa Maria para estudar e trabalhar. Foi na paixão pelo audiovisual que encontrou o tema do seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e, foi a partir disso, que se tornou o primeiro aluno com Deficiência Intelectual a apresentar e defender um trabalho final de graduação na universidade. A deficiência, que se caracteriza por dificuldades para aprender, entender e realizar atividades, não foi empecilho para o estudante. No dia 4 de dezembro, acompanhado por Educadoras Especiais do Núcleo de Acessibilidade da UFSM, uma comissão examinadora interdisciplinar e orientado pelo professor do Departamento de Arquivologia Danilo Ribas Barbiero, atingiu a nota máxima (10) em seu TCC.

O TCC, intitulado “A memória da televisão brasileira e seus arquivos audiovisuais”, faz um resgate histórico dos principais momentos da história da televisão brasileira através de telenovelas, retoma os principais incêndios nas TVs brasileiras e apresenta a situação atual dessas emissoras com relação aos seus acervos arquivísticos audiovisuais. Segundo Marthon, foram longos semestres de pesquisas, que tiveram início no segundo semestre de 2018 e acabaram no segundo de 2019. “Precisava recordar essas memórias que estavam perdidas. Nenhum aluno em outros trabalhos resolveu levantar esse assunto”, comentou o aluno.

O trabalho foi elaborado e discutido com Marthon, mas foi o professor orientador Danilo Barbiero, respeitando a singularidade linguística do aluno, o responsável pela parte escrita e organização, devido às dificuldades do estudante relacionadas à sua motricidade. Além da escrita, o TCC é composto por recursos digitais, tridimensionais e sonoros. Para que o autor entendesse melhor as seções de um trabalho científico, o TCC foi comparado a um programa de televisão hipotético, chamado “Arquivo Agora”, onde cada seção correspondia a um bloco deste programa. A estratégia ocorreu durante a apresentação do TCC também, onde o estudante se transformou em um apresentador de televisão.

Os métodos utilizados facilitaram a apresentação e finalização do TCC. Além de se tornar um apresentador daquilo que havia estudado, foram levadas uma maquete, documentos audiovisuais e mapas mentais, recursos educacionais que auxiliaram no desenvolvimento do trabalho. “É sempre necessário mudarmos a estratégia de ensino-aprendizagem com os alunos. Também, utilizamos um recurso da metalinguagem onde o Marthon foi um apresentador de televisão falando sobre televisão. Fez isso muito bem e foi algo que também colaborou muito no processo de elaboração e apresentação do TCC”, comentou o professor orientador Danilo.

Núcleo de Acessibilidade auxilia alunos durante todo o curso

Estudante utilizou metodologia diferenciada para elaboração e apresentação do TCC

Marthon recebe atendimento especializado desde o início da faculdade. Além do Núcleo de Acessibilidade da UFSM, contou com o auxílio de diversos professores que adaptaram suas aulas ao estudante. No núcleo, foram desenvolvidos diversos jogos que auxiliaram sua memória e concentração. “Ele precisa ter um ponto de partida, uma orientação prévia e, a partir disso, ele vai se desenvolver. O professor Danilo organizava questões norteadoras para os textos acadêmicos, a mãe fazia a leitura desses textos e ele ia respondendo em vídeo falando o que compreendeu”, explicou Fabiane Breitenbach, Educadora Especial do Núcleo de Acessibilidade.

No início de cada semestre, o Núcleo de Acessibilidade recebe uma lista com alunos que ingressaram pelas cotas na universidade. Segundo a Educadora Especial e intergrante do Núcleo de Acessibilidade, Danieli Wayss Messerschmidt, o núcleo entra em contato com essas pessoas e agenda uma entrevista. São realizadas as avaliações, onde ocorrem perguntas sobre a trajetória pessoal, quais adaptações utilizam e precisarão. Então é elaborado um documento que, posteriormente, é encaminhado às coordenações dos cursos dos alunos. Os coordenadores recebem os memorandos e têm a responsabilidade de encaminhá-los aos professores. A partir disso, os professores possuem a função de orientá-los em sala de aula.

Segundo Danieli, é preciso “identificar nesse estudante quais são as coisas que ele gosta. Por exemplo, o Marthon gosta muito de TV. Ele gosta de vídeos, recursos visuais e auditivos. O TCC dele é uma coisa que ele gosta utilizando estratégias de estudo que funcionam para ele”. A educadora explica ainda que o acompanhamento com esses alunos acontece uma a duas vezes por semana, dependendo da demanda do estudante, e pode ser aceito ou não pelo aluno. “Mas ele sabe que a qualquer momento do curso ele pode recorrer. Todos os semestres enviamos e-mails informando sobre o atendimento”, explicou.

Apesar de existirem pessoas dispostas a auxiliar estudantes nessas condições, há quem não saiba lidar com essas situações. É importante estar preparado para receber alunos como o Marthon em sala de aula. Danieli ressalta que a UFSM e as demais universidades ainda estão em processo de aprendizagem com relação a estudantes como Marthon. “Estamos em um processo de aprender. Há dificuldades, mas a vida é assim. O Marthon vai encontrar dificuldades antes, encontrou na faculdade e vai encontrar na vida. As coisas se criam pela demanda. A demanda faz a gente se preparar. A gente vai se preparando no caminho”, destacou.

Reportagem: Eloíze Moraes, acadêmica de jornalismo e bolsista da Agência de Notícias da UFSM
Edição: Davi Pereira

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