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Relatos de Extensão 2023: Cineclube da Boca



Número: 059331

Nome do projeto: Cineclube da Boca: cinema, audiovisual, patrimônio, memória e movimento.

Coordenação: Gilvan Odival Veiga Dockhorn

Objetivo geral: Criar um campo de formação, qualificação e capacitação ampliada tendo o cinema e o audiovisual como elementos centrais.

Linhas de Extensão: Cultura e Arte

Período de Realização: 25/01/2023 a 25/01/2028

ODS: 04

Desde 2016, o auditório do prédio 67 da UFSM vê uma rotina diferente das aulas e palestras, nas chamadas noites de sessão. Os cineclubistas, coordenados pelo docente do Departamento de Turismo, Gilvan Veiga Dockhorn, chegam por volta das 17h, e somente saem depois que a última pessoa for embora, o que dificilmente ocorre antes das 23h, horário em que o Prédio fecha. Eles organizam o espaço, a exibição do filme do dia, e depois o debate e as discussões pós-filme. Durante aquelas horas, é criado um espaço em que todos são iguais, têm direito a voz, e podem ser empoderados por meio da produção audiovisual. Esse é o Cineclube da Boca.

De acordo com dados da ANCINE (Agência Nacional de Cinema), o Brasil possui em torno de 3.500 salas de cinema que estão concentradas em capitais ou cidades com mais de 100 mil habitantes. Fora isso, quase 85% das cidades do Brasil não tem cinemas. Gilvan comenta que, na maioria das vezes, a única forma de acessar esse tipo de conteúdo é em festivais, mostras, e cineclubes. “Ao se elitizar, [o cinema] vai excluindo uma parcela da população, e vai transformando aquele público original em espectador. Então o cineclube surge para priorizar o público que quer se apropriar dessas obras de cinema”, completa o coordenador.

O Cineclube também surge como uma alternativa para a falta de um curso de Cinema na Universidade. Gilvan explica que havia um plano pedagógico para o curso, mas que a falta de recursos e vagas para docentes impediram sua realização. Dessa forma, além de promover a exibição e divulgação de produções brasileiras, gaúchas e santa-marienses, o Cineclube supre a falta de aulas e cursos voltados para aspirantes a cineastas e cineclubistas. 

As ações são organizadas de forma que os primeiros meses do ano são dedicados à formação de novos cineclubistas, com oficinas mais teóricas, que tiveram 87 inscritos no ano de 2023. “Tem convidados que vão falar sobre história de cinema de modo geral, história do cinema brasileiro, história do cinema local, um pouco sobre a linguagem narrativa de cinema, e também como montar o estrutural de uma sessão cineclubista. Findada essa parte, a gente experimenta esses discentes da oficina na prática, que são as sessões do cineclube”, explica Gilvan. Durante o segundo semestre o projeto pretende realizar um curso de extensão em produção de cinema e audiovisual junto do Laboratório de Pesquisa em Arte Contemporânea, Tecnologia e Mídias Digitais (LABART) do Centro de Artes e Letras (CAL).

O Cineclube, que foi oficializado como Programa de Extensão no ano de 2023, possui vários colaboradores externos como a ONG TV Ovo, a Cooperativa dos Estudantes de Santa Maria (CESMA), e o Conselho Nacional de Cineclubes (CNC). Além de terem o apoio de produtoras, como a companhia Toca Audiovisual, para o fornecimento de materiais e equipamentos. Na Universidade, envolve o Departamento de Turismo, o Centro de Ciências Sociais e Humanas (CCSH), o Centro de Artes e Letras (CAL), e a Pró-Reitoria de Extensão (PRE). Também neste ano, o Cineclube recebeu uma doação do festival Santa Maria Vídeo e Cinema de um acervo com mais de 3.500 filmes.

O projeto conta com duas bolsistas do FIEX no momento, que são discentes dos cursos de Tecnologia de Gestão em Turismo e Produção Editorial. Por meio dele, as discentes têm a oportunidade de desempenhar atividades técnicas, como lidar com aparelhos e materiais técnicos de áudio e vídeo, além de interagir com os participantes das sessões e realizar práticas mais próximas de seus cursos, como fazer as divulgações nas redes sociais do Cineclube.

Sobre a importância dos cineclubes para a memória da sociedade, Gilvan destaca que apresentam uma forma de retratar a comunidade, assim como de preservação do patrimônio e da identidade da cidade. “Tudo é meio transitório em Santa Maria, a maioria vem pela Universidade e pelas Forças Armadas, então quanto mais estabelecermos elementos que aproximem as pessoas da história da cidade, da memória da produção cultural, mais essas pessoas se sentem pertencentes”.

Um dos principais intuitos do Cineclube para o futuro é a criação de uma filmoteca digital, que possibilitaria a preservação dessas obras, para posteriormente serem organizadas em um espaço que as disponibilizaria para o grande público ter acesso. A principal dificuldade é a catalogação dos filmes, os quais o docente explica estarem em CD ou VHS, em grande parte. É preciso definir de quem é o filme, quando foi feito e quem foi a equipe de produção, para então ser feita uma análise do estado em que se encontra para ser realizada a digitalização.“Toda essa produção está dispersa e ela se perde, porque essa é a contradição da contemporaneidade. Então essa preservação é o objetivo final [do Cineclube]”, complementa o docente.

 
O que são Cineclubes?

Em paralelo ao surgimento dos cineclubes, a história do cinema considera a exibição dos Irmãos Lumiére em 1895 como a primeira sessão pública e paga a fazer sucesso. Já o primeiro cineclube, registrado em 1913, é o chamado Cinema do Povo, criado por uma cooperativa anarquista em Paris. O docente explica que Santa Maria tem uma forte tradição cineclubista, que começou por volta dos anos 50 com a criação do primeiro cineclube da cidade, o Clube de Cinema de Santa Maria, fundado em 1951 por Edmundo Cardoso. Outro exemplo histórico é o Cineclube Lanterninha Aurélio, fundado em 1978 pela Cooperativa dos Estudantes de Santa Maria Ltda (Cesma)

 
História do professor

Para cada amante de Cinema, ele tem um significado e impacto diferente. Para Gilvan, natural do município de Três de Maio e formado em História na UFSM, representou uma grande mudança em sua vida. “O cinema é um pouco fundador da minha existência”, define.  Gilvan se mudou para Santa Maria no final dos anos 90, e como estudante já participava das sessões do cineclube Lanterninha Aurélio. Sobre a importância do Cinema, ele declara: “É difícil mensurar hoje, porque se tem um acesso individualizado e facilitado, mas há 30, 40 anos atrás era muito diferente, o cinema me permitiu pensar o mundo que não o que eu vivia concretamente. Então de certa forma eu devo muito ao que o cineclube me possibilitou”.

 
Era digital

Na era digital e de serviços de streaming, que tomaram conta do audiovisual no mundo, Gilvan comenta que “A ideia é tentar fazer com que se redescubra essa arte”, declara o docente. Ainda comenta que o papel dos cineclubes é juntar as pessoas, ao estimular, não apenas o consumo das produções, mas a interação que proporciona entre os participantes. “O desafio não é exibir filmes, ou ter estrutura, é convencer as pessoas que elas podem, durante uma hora e meia ou duas das suas vidas, se dedicar a assistir um filme e conversar”.

Texto por: Giulia Maffi

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