Por Otávio Novo (advogado, profissional de Gestão de Riscos e Crises, autor do livro “Gestão da Qualidade e de Crises em Negócios do Turismo”)*
Nesse momento, todos. E esse é um efeito comum nos casos de grandes crises e catástrofes, e no caso do Rio Grande do Sul não seria diferente, afinal a situação é grave e a comoção é geral. Entretanto, como será depois que o momento mais crítico passar? E quando as câmeras e postagens mirarem para outro acontecimento? Obviamente, ações e providências reativas emergenciais são compreensíveis e muito válidas para minimizar impactos. Mas e com o processo completo e que realmente pode evitar perdas importantes, ou seja, a Gestão de Crises como a do Rio Grande do Sul, quem se importa?
A pergunta se mantém e enquanto ainda há água e destruição nos espaços públicos e privados do Rio Grande do Sul, equipes de resgate e atendimento voluntários em todo o país e principalmente na região afetada se esforçam para ajudar as vítimas e trazer o mínimo de dignidade nesse momento. E tudo é transmitido por pessoas físicas e jurídicas da comunicação, seja na mídia tradicional ou nas redes sociais. Além disso, representantes políticos e de setores da sociedade se engajam, discutem e aprovam ações para auxilio prático no árduo processo de financiamento da reestruturação do estado.
Esse olhar é fundamental, mas é parte subsequente de procedimentos anteriores e da mesma forma essenciais. Ou seja, a resposta às ocorrências e crises deve vir, obrigatoriamente, após o levantamento de riscos e a preparação ampla, e muitas vezes simples, dos atores e estruturas desse contexto. Assim, a chamada Gestão de Crises será realizada da forma correta, caso contrário o Gerenciamento da Crise ocorrerá, contudo sem a devida preparação e consequentemente com efeitos danosos que poderiam ter sido evitados.
A Pandemia parecia ter sido uma oportunidade dolorosa de ensinamento para todos, especialmente para aqueles que ainda sentem, de uma forma ou de outra, os efeitos dessa crise tão grave. Mas o que percebemos é que pouco transformamos, ou pouco restou, dessa experiência em maturidade. E de modo geral, não existem sinais expressivos de mudança de comportamento de gestores e público. E isso é preocupante porque pode reforçar a tendência geral de esperar que os problemas aconteçam para buscar uma solução, ou seja, o famoso : “Se acontecer a gente dá um jeito”.
E apesar de totalmente indesejada e lamentada por todos, a calamidade do Rio Grande do Sul é mais uma oportunidade que todos temos de entender as nossas demandas adiante. No caminho da transformação responsável estamos nós como atores que podem ou não assumir papéis adequados nos cenários a que estamos inseridos.
É preciso se importar com toda a cadeia de ações e responsabilidades da Gestão de Crises e não só com a resposta que acontecerá com menos ou mais potencial de caridade, de isenções fiscais e outras medidas paliativas. A atitude responsável e esperada de gestores e líderes, exemplos seguidos pelos liderados, é o olhar preventivo e antecipatório, não só diante das possibilidades de ocorrência, mas da criação de cultura de proteção em todos os níveis e papéis das organizações, seja nas grandes estruturas públicas ou privadas, seja no pequeno comércio e na casa de cada um.
A observação ampla de vulnerabilidades, mesmo distante de plena solução para todas, leva qualquer estrutura, de qualquer nível, a um patamar de redução de impactos muito considerável, já que o conhecimento do que pode nos afetar nos tira das sombras do passivo sentimento de medo para a exposição da bravura das ações reais e efetivas.
Uma das grandes críticas ao pensamento de gestão de riscos e crises é o foco em históricos e acontecimentos passados como base das soluções de futuro, ou seja, seria como alguém dirigir um carro olhando o tempo todo pelo retrovisor. Conhecer o passado é importante, contudo uma visão ampla da gestão de Crises inclui a capacidade de antecipação, que dará a possibilidade de decisões serem tomadas considerando o passado e também de situações até então imponderáveis.
E até mesmo nas medidas reativas há a necessidade do olhar antecipatório para que as ações emergenciais não agravem outros pontos do mesmo cenário. Como exemplo, no caso do Rio Grande do Sul será importante haver cuidados na reconstrução, pensando não só em restabelecer rapidamente o que já existia, mas pensar na prevenção total (sociedade em geral) para evitar recorrência de erros, além de não deixar com que restrições de orçamento e investimentos prejudiquem os demais serviços essenciais e etc.
A coragem dos líderes e daqueles que norteiam o amadurecimento das organizações e da sociedade deve ir além da solidariedade e do socorro no momento trágico. Quem se importa de verdade com a resiliência e proteção da sociedade, age antes, ao tratar antecipadamente de temas desagradáveis enquanto a maioria vive a tranquilidade dos momentos de calmaria e céu azul.
*artigo publicado originalmente no Diário do Turismo.
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