Por Valdeci Verdelho (Jornalista, fundador da Verdelho Comunicação, especialista em gestão de crise)
No campo da gestão de crises, há um binômio tão evidente quanto frequentemente ignorado: preparação e vulnerabilidade, termos com significados opostos, mas fortemente interligados. Enquanto um se refere ao estado de prontidão de uma organização diante de crises, o outro está relacionado ao grau de despreparo, à falta de adequação para lidar com situações críticas. Quando a preparação aumenta, a vulnerabilidade diminui – e vice-versa. A maioria das organizações, no entanto, parece esquecer essa lógica básica, que preparação e vulnerabilidade constituem, os dois lados da mesma moeda.
O que é, de fato, preparação?
Em muitas empresas, a preparação é mal compreendida — ou pior: negligenciada. É comum vê-la reduzida a manuais genéricos, checklists burocráticos, protocolos engessados e ações desestruturadas, que não resistem ao primeiro teste real e podem até se tornar agravantes.
No contexto da gestão moderna de riscos e crises, preparação é o processo sistemático de se antecipar aos riscos e planejar respostas para lidar com eventos críticos previsíveis, emergências e situações inesperados. Parte essencial do processo de gerenciamento de crise, envolve políticas internas, práticas e procedimentos que tornam a organização apta para agir de forma coordenada, rápida e eficaz diante de situações adversas que afetam reputação.
Neste sentido, inclui:
- Identificação prévia de riscos potenciais, independente da escala de impacto ou probabilidade;
- Monitoramento das ameaças que podem afetar continuidade dos negócios ou a imagem;
- Planos de contingência para todas as situações possíveis e singularidades;
- Relacionamento transparente com os stakeholders, especialmente a mídia;
- Capacitação de equipes com treinamentos constantes e efetivos;
- Estruturação de comitê de crise apto para ser acionado a qualquer momento.
Para organizações que optam pela preparação, estas são as medidas de precaução e proteção incorporadas pela liderança no sentido de minimizar impactos negativos, assegurar continuidade dos negócios e evitar danos operacionais, financeiros e reputacionais que podem ser causados por crises.
Vulnerabilidade: um descuido que custa caro
A vulnerabilidade raramente se apresenta de forma explícita. Ela se acumula nos bastidores: em procrastinação sistêmica, em cortes de investimentos estratégicos e em lideres com síndrome do avestruz – ave que foge dos problemas escondendo cabeça na areia – e na perigosa crença de que “aqui isso nunca vai acontecer”.
Ela é estrutural, ainda que silenciosa. E pode estar em todos os níveis de uma organização:
- Institucional: ausência de governança de riscos, de políticas claras, de diálogo com públicos estratégicos e stakeholders.
- Operacional: falta de planos de continuidade; de redundâncias críticas e dos padrões recomendáveis de segurança.
- Cultural: falta de transparência nas relações, ambientes de baixa escuta e alta pressão nas condições de trabalho.
O problema é que, por não gerar ruídos no cotidiano, a vulnerabilidade costuma ser invisível — até o momento em que uma crise a revela todas as fragilidades enrustidas.
Preparação ou vulnerabilidade: uma questão de escolha
Toda organização, em algum momento, será testada por uma crise — seja ela acidental, cibernética, ambiental, reputacional, regulatória ou ética. O que determina o tamanho do impacto e, principalmente, o seu custo de uma crise são as escolhas feitas antes de a crise acontecer.
Ataques cibernéticos são previsíveis e crescentes. No entanto, muitas empresas seguem sem backups confiáveis, com falhas básicas de segurança e sem um plano de resposta. A vulnerabilidade não começa com o ataque — ela começa com o descaso.
Eventos climáticos extremos são amplamente rastreáveis. Ainda assim, operações são mantidas em áreas de risco, sem rotas alternativas ou contingência logística. A vulnerabilidade não está na natureza — está na negligência diante dela.
Fraudes internas e falhas éticas costumam dar sinais antes de emergirem. Mas sem mecanismos de controle e uma cultura organizacional vigilante, o invisível vira inevitável.
Mudanças regulatórias não são surpresas. Elas são monitoráveis. A vulnerabilidade aqui está na falta de inteligência competitiva e na paralisia decisória.
Crises de imagem ganham força onde há negligência, imprudência ou omissão. A falta da preparação adequada potencializa riscos e ameaças. Pequenos eventos podem se transformar em situações dramáticas com danos imprevisíveis.
No final das contas, toda organização escolhe, diariamente, com qual lado da moeda está conectado: o da preparação ou o da vulnerabilidade.