Ir para o conteúdo Observatório da Comunicação de Crise Ir para o menu Observatório da Comunicação de Crise Ir para a busca no site Observatório da Comunicação de Crise Ir para o rodapé Observatório da Comunicação de Crise
  • International
  • Acessibilidade
  • Sítios da UFSM
  • Área restrita

Aviso de Conectividade Saber Mais

Início do conteúdo

Braskem: omissão leva a desastre ambiental e humanitário



Por João José Forni (Autor do livro “Gestão de Crises e Comunicação – O que Gestores e Profissionais de Comunicação precisam saber para enfrentar Crises Corporativas”)

 

Durante anos, no subsolo da lagoa Mundaú, em Maceió, uma mineradora de sal-gema cavou dia e noite para tirar de lá um produto que gerou milhões de dólares de lucro. Mal sabiam os moradores dos bairros na região que estavam à beira de uma tragédia e em cima de uma autêntica arapuca: solo comprometido, afundando, vulnerável, imóveis com rachaduras e interditados para morar. A imprensa cochilou ou esqueceu de acompanhar, apurar e informar. Os governos, órgãos ambientais e, durante certo tempo, até o Judiciário deixaram de fiscalizar. Um por um foram cúmplices ou pelo menos lenientes com o que o jornalista André Trigueiro chamou de “o maior desastre urbano do mundo”. 

Passados cinco anos das primeiras denúncias de rachaduras nos imóveis de vários bairros de Maceió, próximos à lagoa Mundaú, parece que agora esse acidente entrou numa fase decisiva, para não dizer catastrófica. Até porque não há como minimizar ou esconder que milhares de pessoas estão sendo deslocadas de seus lares ou ainda permanecem lá, sob ameaça de acontecer um desabamento e ficarem sem teto, em consequência de anos de escavação nas minas de sal-gema.

 

Uma longa história de abusos

Em maio de 2018, com o agravamento de danos estruturais nos imóveis e ruas do bairro do Pinheiro, além de tremor de terra relatado por moradores desse bairro, o MPF/AL instaurou o primeiro inquérito inicialmente para apurar a possível relação do tremor com a exploração de sal-gema, e posteriormente o processo foi deslocado para acompanhar as ações do poder público e privado voltadas à proteção dos direitos do cidadão. 

É uma crise que emergiu há pelo menos cinco anos, quando se agravou. Mas a origem dos problemas, bem como os danos e os erros começaram bem antes. Os moradores do bairro Pinheiro foram os primeiros a relatar os problemas, mas em seguida moradores do Mutange e do Bebedouro também registraram danos semelhantes em seus imóveis. Num primeiro momento, a empresa negou sua responsabilidade e tentou desqualificar os estudos da CPRM, que atribuíam-lhe a causa da subsidência (1). A Braskem contratou estudos externos, para que indicassem que o motivo das rachaduras se devia às condições do solo, falta de saneamento e área de grande incidência de sismos.

Diante do agravamento da situação e sob ameaça de um grave acidente, a Braskem montou uma equipe exclusiva para fazer a gestão, com autonomia e recursos para implementar as ações que julgava necessárias. A partir daí, a empresa tentou pelo menos parecer diligente e estruturou um programa em várias frentes, o que incluía indenizações e remoções dos moradores que estivessem em áreas de risco. Seria uma estratégia de contenção de danos, que começou, digamos, com boas intenções.

 

Onde falhou

Por que a Braskem manteve essa crise segregada da gestão ou estratégia de negócios? Talvez para não contaminar a marca com a ameaça de um possível acidente ou de desgastes futuros. A empresa tentou blindar a marca Braskem do efeito dessa crise. E, como se não fosse grave, a empresa deu continuidade a seus projetos, incluindo a agenda verde e seus desdobramentos. A crise de Maceió não era considerada na sua estratégia de sustentabilidade.

A Braskem continuou com campanhas institucionais de ser uma empresa verde. Inclusive omitindo da página principal da empresa, na Internet, a ameaça de um desastre, durante anos. Essa prática de fazer de conta que não é comigo, no mundo globalizado e tecnológico, não funciona, no caso uma crise grave. Pelo contrário. Há inúmeros exemplos no mundo corporativo de crises ou ameaças ignoradas, que deram errado.

Além disso, essa crise, pela dimensão da empresa e as consequências sociais acabou entrando na disputa política que existe em Alagoas com os grupos do Senador Renan Calheiros e do deputado Arthur Lira, com desdobramentos que estão ocorrendo e prejudicam o que deveria ser uma gestão profissional e isenta do acidente. Ou seja, o problema técnico e humanitário de Maceió foi capturado pela briga política, que incluiu outra figura que pode sair arranhada desse caso, o prefeito de Maceió. A última notícia dessa querela é que o governador de Alagoas, aliado de Renan Calheiros, anunciou que vai ao STF pedir a anulação dos acordos firmados pela Braskem com Maceió, ainda que chancelados por órgãos federais e estaduais.

No meio desse cipoal de falhas de gestão e de interlocutores, quem sofre e tem as vidas afetadas definitivamente são as milhares de pessoas que moram ou moravam em cima das minas e que foram ou estão sendo obrigadas a se deslocar. Calcula-se que pelo menos 14.500 imóveis foram desocupados e 60 mil pessoas seriam afetados pela remoção. Apesar das rachaduras e da intervenção da Justiça, a Braskem só interrompeu a extração de sal-gema e paralisou a operação da fábrica do Pontal da Barra, em maio de 2019.

Crises dessa gravidade e consequências exigem aquilo que se recomenda ao bom gestor: rapidez nas decisões, transparência total, disposição para resolver o passivo e, principalmente, “compassion” (3) pelas pessoas, que sempre estão em primeiro lugar, em qualquer tipo de crise. Ainda mais naquelas situações que afetam diretamente a vida, o lar, a saúde mental e o futuro das famílias. Até agora, crise grave como essa, precisa também ter um comando, um líder que esteja coordenando todas as ações dessa gestão. Vários interlocutores opinam sobre a crise e a sociedade não sabe quem está no comando.

 

Responsabilidade

Importante frisar que “Um ano após o tremor de terra, e com base na realização de diversos estudos, análises e com envolvimento direto de 52 pesquisadores, o SGB/CPRM apresentou, em maio de 2019, em audiência pública, estudos conclusivos que apontaram a extração mineral de sal-gema, pela empresa petroquímica Braskem, como a responsável pelos danos. (grifo nosso). Na ocasião, o fenômeno foi classificado como subsidência, ou seja, um rebaixamento da superfície do terreno devido às alterações ocorridas no suporte subterrâneo.” (Paper do MPF/AL) 

Em 2020, foi “firmado o Termo de Acordo para Apoio na Desocupação das Áreas de Risco entre MPF, MP, DPU, DPE e Braskem na Justiça Federal, viabilizando a evacuação da área de risco de criticidade 00 e a respectiva indenização justa paga pela empresa.” À época, a conselheira do CNJ Maria Tereza Uille perguntou ao diretor-geral da Agência Nacional de Mineração (ANM), Victor Hugo Bicca, se havia no Brasil a chance de uma nova tragédia, parecida com a de Brumadinho, onde morreram 270 pessoas. “Maceió. O afundamento do Bairro Pinheiro pode ser uma tragédia muito maior que Brumadinho e Mariana”, foi a resposta.

A partir dessas evidências e acertos legais, o engajamento da empresa na crise deveria ser total, até porque não se tratava de uma situação crítica que dizia respeito exclusivo à Braskem, algo que ela, nos bastidores, devesse administrar por conta própria, com decisões exclusivamente internas, ainda que estivesse fazendo tudo certo. Toda a crise grave é um evento social, comunitário, dos contribuintes, dos consumidores. Na maioria dos casos, eles são vítimas da crise, não importa o tamanho ou a natureza do evento. Nessa crise, especificamente, inúmeros agentes públicos e privados estão envolvidos, sem falar nas pessoas, nos negócios atingidos por uma atividade que envolve a extração de sal-gema na região da lagoa Mundaú desde a década de 1970, gerando vultosa receita para a companhia, durante anos.

A propósito de resultado, a empresa vinha de uma série de índices positivos nos últimos anos. Em novembro, a Braskem anunciou prejuízo de R$ 2,4 bilhões, no 3º trimestre de 2023, aumento significativo em relação às perdas de R$ 1,1 bilhão no mesmo período do ano anterior. A empresa atribui esse resultado negativo ao impacto da variação cambial na sua receita. A crise de Maceió não teria ainda relação com os resultados da empresa.

Para se ter uma mínima dimensão dessa tragédia, “até a liberação do laudo pela SGB/CPRM havia 35 poços de extração em área urbana. Os poços estavam pressurizados e vedados, no entanto, a instabilidade das crateras causou os danos ao solo, visíveis na superfície”, segundo o MPF/AL. “Já foi constatado, pelos cientistas envolvidos nos estudos, que o tremor de terra ocorrido em março de 2018 se deu em razão do desmoronamento de uma dessas minas. De acordo com as pesquisas, aquele não foi o único tremor, pois os laudos apontam a existência de outras minas deformadas e desmoronadas.”

Em dezembro de 2020, o MPF formalizou acordo de reparação socioambiental e urbanístico por parte da Braskem, que é obrigada a adotar medidas de mitigação, reparação ou compensação socioambiental, bem como garantir os recursos necessários para o seu cumprimento. O entendimento é que o desastre geológico que afundou o solo, causou tremores de terra e ameaçou a vida de cerca de 40 mil pessoas de cinco bairros de Maceió, denominado “Caso Pinheiro”, foi o maior caso de prevenção de desastres já solucionado pelo Sistema de Justiça.

Ainda mais. Como não existem crises locais, todas as crises são globais, na quinta-feira passada, a agência de classificação de risco Fitch cortou a nota de crédito em escala global da Braskem para “BB+”, de “BBB” e colocou o rating em observação negativa, o que fez a empresa perder o que o mercado chama de “grau de investimento”. Como a crise mal administrada expôs a empresa ao mercado, na semana passada a Bolsa de Valores brasileira anunciou a exclusão da Braskem de seu índice de sustentabilidade em razão do desastre ambiental de Maceió. Segundo a B3, a decisão considerou aspectos como o impacto ESG da crise, a gestão da crise pela Braskem, o impacto de imagem e a resposta da companhia diante do problema.

 

Cascata de erros históricos

Importante lembrar também que esse desastre ecológico não começou a ser gestado em 2018. Conforma registra Editorial da Folha de S. Paulo (3), de 07/12/2023, “A história da Braskem está ligada ao velho desenvolvimentismo brasileiro. O complexo petroquímico que explora sal-gema em Maceió constava das diretrizes do PND lançado no longínquo 1971, durante a ditadura militar. Apesar de o então órgão ambiental de Alagoas não recomendar a mineração, o governo estadual a autorizou e, em 1976, a Salgema Indústria Química de Alagoas iniciou suas atividades – o nome mudou para Braskem em 2002, após uma fusão com outras empresas”.

E diz mais: “Em 2018, tremores foram reportados, com 14,5 mil imóveis afetados nos bairros Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol. Rachaduras em casas já haviam sido verificadas cerca de dez anos antes. Desde os anos 1980, pesquisas da Universidade Federal de Alagoas alertam para os riscos da mineração na área de restinga.” Ou seja, da fiscalização federal à estadual, todos foram lentos ou, sabiam do risco, se acomodaram, como se empurrar o problema, fosse uma solução. Na falsa expectativa de que se resolveria por si mesmo.

Esse desastre ecológico, como intitula o citado Editorial, “tem uma longa história de erros da Braskem e, para o MPF, dos órgãos fiscalizadores”. Infelizmente, por trás das tragédias brasileiras, quase sempre há o comportamento relapso de órgãos fiscalizadores e do próprio poder público, como neste caso.

No Brasil, a fiscalização acaba sendo a grande vilã de boates, centros de treinamento, favelas, museus e hospitais que incendeiam, além de barragens que rompem, encostas que deslizam sobre residências e prédios que desabam, todos com centenas de vítimas fatais. Triste rotina de um país onde se acha normal não pagar multas, nem se atender a notificações, quando se trata de segurança e preservação da vida.  

 

Consequências

Além do escrutínio da mídia, do MPF, dos órgãos ambientais, no Congresso, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Braskem foi instalada em 13/12/2023, já no apagar das luzes do ano legislativo. Vai ser um palco para depoimentos televisivos e pouca utilidade para realmente esclarecer esse passivo ou – mais importante – ajudar a solucionar a crise dos moradores daquele bairro.

A CPI poderá contribuir para minorar a tragédia humana e ambiental que atinge Maceió? Improvável. CPI será mais um palanque político para os dois grupos políticos se digladiarem, do que algo de utilidade para resolver o problema social das pessoas atingidas. CPI sempre fascina parlamentares, pela oportunidade de aparecerem na mídia. A exemplo de outras CPIs, há muito holofote, ataques, constrangimentos, testemunhas-bomba, bate-boca, mas – como aconteceu na CPI da Covid – muito pouco de prático e efetivo. Uma CPI é mais um capítulo na saga que desde 2018 parece não ter fim. Pelo histórico de outras CPI, nada que deixe as vítimas dessa tragédia animados. Elas sabem, como aconteceu em Mariana, com os atingidos pela barragem da Samarco, que uma solução pode demorar anos. No mesmo dia, o Ministério Público Federal pediu que a Justiça bloqueasse R$ 1 bilhão da mineradora para o pagamento das indenizações aos donos de imóveis que foram afetados pelo afundamento no solo.

 

Por que a mídia fingiu não saber

O jornalista e professor da USP, Marcelo Ratier, em artigo publicado no Uol, em 08/12/23, Caso Braskem: “No Brasil, o descaso é parte da paisagem, suscita um questão delicada sobre a cobertura pela mídia desse acidente. “A imprensa levou cinco anos para noticiar a tragédia em Maceió, alegando que poderia ter havido um consentido conluio para não dar muita ênfase a essa tragédia e esconder o nome da empresa associado ao acidente. Uma tragédia socioambiental que, aos olhos da imprensa, ficou por cinco anos no subterrâneo, escondida da vista como o sal-gema cuja extração hoje colapsa a capital das Alagoas…”

E aí, ele toca num ponto muito sensível da relação mídia x empresas privadas, quando se trata de misturar o que no jargão publicitário se chama Igreja e Estado, uma possível cooptação da pauta jornalística pelo investimento publicitário. “Denunciar um suposto conluio da grande mídia para varrer o nome Braskem do noticiário é a explicação mais recorrente. Greenwashing, irrigação de veículos com verbas publicitárias, atribuição de responsabilidades a intempéries ou a sujeitos ocultos, cooptação de jornalistas com coquetéis e prêmios, comunicados de imprensa que omitem e confundem são, sim, estratégias recorrentes no capitalismo extrativista praticado por tantas empresas ao redor do mundo.”

Segundo o jornalista, “Isso conta um pouco da história, mas não tudo. A começar pelo suposto efeito dessas medidas, que tende a ser desigual em alcance e duração – falar em “conluio” pressupõe uma imaginativa uniformidade, algo como uma combinação secreta entre os barões da mídia pelo silenciamento”. Se o jornalismo tem como missão básica informar o que está acontecendo, principalmente se for do interesse público, por que levou tantos anos para se descobrir que os negócios e lucrativos subterrâneos da Braskem estavam minando o subsolo de Maceió? Sem avaliar o risco que isso representava para quem morava em cima e para o meio ambiente? Sem que ações enérgicas dos órgãos do meio ambiente tivessem sido tomadas para intervir, corrigir ou suspender a mineração? Ou, no limite, fechar definitivamente a mina?

O jornalista faz uma análise da cobertura dessa tragédia nos últimos anos, sob o aspecto do valor-notícia. E conclui: “Jornalismo tem compromisso com o interesse público, noticiário não é feito para ser divertido. O que a gente precisa saber para navegar na vida cotidiana às vezes é incômodo, difícil, chato. O modelo atual, aquele que só enxerga problemas depois de cinco anos para em seguida devolvê-los ao esquecimento, agoniza. O jornalismo míope para o Brasil real precisa rever seus agentes e seus valores.”

Quando o assunto virou manchete, nas últimas semanas, o ombudsman do jornal Folha de S. Paulo, José Henrique Mariane, na edição de 10/12/2023 (O buraco noticioso da Brasken) vai mais adiante sobre o papel da mídia. “A primeira menção ao problema de Maceió, no índice da Folha, é de 13 de dezembro de 2018, há quase cinco anos. O nome da Braskem aparece apenas no 12º parágrafo, como uma terceira hipótese para o ocorrido, que ainda seria investigado pelo Serviço Geológico Brasileiro. No dia anterior, a empresa curiosamente surgia já no título com roupa de ativista ambiental: “Braskem lança oito diretrizes para economia circular”. Ou seja, enquanto a escavação nas minas daquela região avançavam, a imprensa passou batida, sem saber ou priorizar o que acontecia no subsolo de Maceió. A empresa aparecia na mídia mais pelo tamanho de seu ativo, do que pela ameaça que significavam as minas de sal-gema.

 

Crime ambiental, crise social.

O que vem acontecendo em Maceió ou poderá ainda acontecer de pior assemelha-se ao que representou do ponto de vista humano, ambiental e social as tragédias nas cidades mineiras de Mariana e Brumadinho, em 2015 e 2019. Exploração de minério há anos, no caso sal-gema, que vai acumulando resíduos ou mesmo escavações ou barragens sem fiscalização, sob a complacência dos governos estadual e federal, e que avançam sob a sedutora placa de progresso, mas que no fundo são ações que, dia a dia, degradaram o meio ambiente, sem que tivessem sido interpelados por quem deveria fiscalizar. Onde estavam os políticos do estado, sempre ágeis em ir atrás e descobrir e escancarar os erros dos adversários, por coisas muito menos importantes do que essa tragédia?

Os efeitos colaterais dessa crise são ainda imensuráveis. Mas já se evidencia que o possível rompimento da mina da Braskem pode impactar definitivamente a lagoa Mundaú, uma das principais fontes de renda de pescadores e catadores de sururu, além de comprometer a fauna e a flora daquele aprazível local de Maceió. Eles alegam que os peixes que agora sumiram da lagoa são a única fonte de alimentação das famílias. Há anos, eles só sabem fazer aquilo: pescar. E como vai ser agora? Perguntam.

Segundo o site Globo.com, em caso de colapso, parte da água da lagoa seria escoada para a cratera formada pela mina, que, segundo as previsões mais otimistas da Defesa Civil, seria do diâmetro de uma piscina olímpica e meia. Ao mesmo portal noticioso, o pesquisador e professor Emerson Soares, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), que coordena o projeto Laguna Viva, explica que “A mina só tem cloreto de sódio. É sódio e cloreto. A nossa única preocupação era que índices de cloreto de sódio e alguns outros compostos que existem na rocha calcária, cálcio, por exemplo, ou algum tipo de magnésio, iam aumentar na lagoa e iam reagir com outros compostos que já estão ali e tornar a lagoa um pouco mais complicada para os organismos, mas o efeito não seria tão negativo, visto o que a já se observa na lagoa”.

“Coletas de amostras de água feitas bimensalmente apontaram que a lagoa está poluída por esgotos, agrotóxicos e outras substâncias contaminantes. A gente encontra metais pesados em alguns níveis altos, três grandes fontes de esgoto do município de Maceió, que trazem muitos contaminantes, solventes, BTEX, entre outros compostos, que eutrofizam (4) o ambiente e trazem doenças, bactérias e verminoses. Compostos que são cancerígenos que vêm via esgoto”, diz o professor.

Além de esgotos de Maceió e da região metropolitana que chegam à lagoa sem tratamento, agrotóxicos também contaminam a água. “Agrotóxicos que vêm via rio Mundaú com os processos erosivos nas áreas marginais, com deflorestação dessas áreas e com lançamento de agrotóxicos nesses terrenos, trazidos pelo rio Mundaú, acabam vindo parar na lagoa. Então esses são os maiores problemas da lagoa atualmente”, afirma o acadêmico.

Por causa do impacto ambiental causado pelo afundamento do solo na área onde era feita a mineração, o Instituto do Meio Ambiente (IMA) de Alagoas multou a Braskem em mais de R$ 72 milhões na semana passada. Apenas um espasmo, para dar a impressão de que algo está sendo feito. Pena que tarde. Multar no Brasil é muito fácil. Existem até respostas-padrão desde os sindicatos quando fazem greve ilegal até edifícios que não têm extintores de incêndio para fugir das multas. Há uma cultura no Brasil de que multas não precisam ser pagas. Na prática, nesse caso, deve ser o que vai acontecer. Boa manchete no dia da divulgação e depois, esquecimento.

 

A natureza pedindo socorro

No último domingo, os moradores de Maceió foram surpreendidos por um vertedouro em plena Lagoa de Mundaú, o que indicou um colapso na mina 18 da Braskem. Técnicos e autoridades esperam que a situação se estabilize sem maiores consequências para outras minas na região ou para os moradores de Maceió. Mas esse diagnóstico é simplista, porque até os equipamentos que mediam dia e noite o nível da água da lagoa foram levados no redemoinho formado pelo vertedouro.

Num momento em que a COP28, que reuniu milhares de autoridades e ambientalistas de todo o mundo em Dubai, passa 15 dias discutindo se coloca ou não no relatório final uma data para a “eliminação” ou “redução” dos combustíveis fósseis, aqui, nas barbas das autoridades, uma tragédia ambiental, social e humana foi sendo gestada nos últimos 50 anos, sem que ninguém tivesse coragem de tomar uma decisão coerente, corajosa e decisiva para interromper esse ciclo de degradação do subsolo de Maceió. O que o Brasil e milhares de moradores atingidos pela catástrofe esperam é que a Braskem, agora, cumpra o que anuncia na chamada do seu site: O compromisso com as pessoas e o planeta impulsiona a Braskem.

 

O que diz a empresa

Comunicado sobre Maceió

“A Braskem reafirma o seu compromisso e manifesta solidariedade irrestrita a todos os moradores da cidade de Maceió. Nossa prioridade continua sendo a segurança das pessoas. É para isso que trabalhamos incansavelmente há quatro anos nos trechos da cidade afetados pelo afundamento do solo.

Desde 2019, já realizamos as seguintes ações na região:

  • Paralisação definitiva da atividade de extração de sal, em maio de 2019
  • Realocação preventiva de cerca de 40 mil pessoas da área definida como de risco pela Defesa Civil
  • Desocupação de 100% dessa área de risco definida em 2020 – moradores dos últimos 23 imóveis, que ainda permaneciam na região, foram realocados na semana passada
  • Apresentação de 19 mil propostas de indenização a moradores e comerciantes, o que representa 99,8% do total, com aceitação de 99%

Além disso, disponibilizamos apoio psicológico, cuidado com animais de estimação, suporte para regularização de documentos e mudança. Os bairros desocupados continuam recebendo serviços de zeladoria que incluem limpeza, controle de pragas e vigilância patrimonial, em conjunto com a segurança pública.

Como medida de prevenção, uma das mais modernas redes de monitoramento do solo foi instalada na região a partir de abril de 2019, e em novembro de 2020 foi iniciado o plano de fechamento definitivo das cavidades (poços de sal) desativadas, que já tem 70% dos trabalhos concluídos.

Medidas adicionais de mitigação, reparação e compensação foram definidas em acordos com órgãos federais, estaduais e municipais. São ações nas áreas social e ambiental, além de um programa de mobilidade urbana, projetos de reurbanização e de conservação do patrimônio histórico.

Para isso, provisionamos R$ 14,4 bilhões, dos quais já foram desembolsados R$ 9,2 bilhões, sendo R$ 4,4 bilhões pagos em indenizações de moradores e comerciantes.

Sobre a movimentação do solo registrada nos últimos dias em um local específico do bairro do Mutange, em Maceió, é importante lembrar que a situação se dá em um trecho da área já 100% desocupada desde abril de 2020, e segue sob monitoramento constante.

Hoje, temos mais de mil profissionais integralmente dedicados a cumprir todos os compromissos assumidos com Maceió, colaborando com as autoridades e priorizando a segurança das pessoas

________

 1 – Subsidência – A subsidência é um fenômeno de rebaixamento da superfície do terreno devido às alterações ocorridas no suporte subterrâneo. O fenômeno ocorre em diversos lugares do mundo devido à extração de água, petróleo e gás do subsolo.

 2 – Compassion: De acordo com o budismo, “compassion” é uma aspiração, um estado mental, querendo que outros se libertem do sofrimento. Não é passivo  – não é somente empatia – mas um altruísmo empático, que ativamente luta por libertar o próximo do sofrimento. (Gestão de Crises e Comunicação, Atlas, 2019, 3ª edição, pág. 178).

3- Tragédia AnunciadaFolha de S. Paulo, 07/12/23.

4- Eutrofizar: caracteriza-se a eutrofização (termo vindo do grego que significa bem nutridi) como um processo em que ocorre um aumento na concentração de nutrientes (principalmente fósforo e nitrogêncio) em ambientes aquáticos, tais como rios e lagos.

 ________

Artigo publicado originalmente no site www.comunicacaoecrise.com

Artigos assinados expressam a opinião de seus autores.

Divulgue este conteúdo:
https://ufsm.br/r-880-269

Publicações Relacionadas

Publicações Recentes