
Os microRNAS (miRNAs) são pequenas moléculas de RNA que desempenham um papel fundamental na regulação da produção de proteínas dentro da célula. Para entender melhor, podemos imaginar que em cada célula do nosso corpo existe uma “fábrica” que é capaz de produzir diferentes tipos de proteínas, essenciais para o funcionamento do organismo. Os miRNAs funcionam como pequenos operários, fornecendo instruções sobre quais tipos de proteínas devem ser produzidas. Eles fazem isso se ligando aos RNAs mensageiros (mRNAs), que são responsáveis por levar as instruções para a produção das proteínas. Quando um miRNA se liga a um mRNA, ele pode impedir que uma proteína seja produzida ou diminuir a sua expressão, ajudando a manter o funcionamento das células equilibrado.

No contexto do envelhecimento, os miRNAs tem se mostrado reguladores importantes. O envelhecimento é um processo biológico complexo e irreversível, caracterizado pela gradual perda de funcionalidade celular e aumento da susceptibilidade a doenças, sendo causado por inúmeros fatores, como acúmulo de danos no DNA, inflamações e enfraquecimento dos mecanismos de reparo celular. Pesquisas revelam que alterações nos níveis de certos miRNAs estão associadas ao envelhecimento celular e ao desenvolvimento de doenças relacionadas à idade. Por exemplo, alguns miRNAs podem promover a senescência celular – estado em que a célula perde a capacidade de se dividir – enquanto outros podem atuar na proteção contra danos celulares. Além disso, pesquisas recentes indicam que a manipulação dos microRNAs pode ajudar no combate ao câncer, uma vez que alguns miRNAs específicos controlam genes que impedem a multiplicação descontrolada das células. Esse potencial uso terapêutico pode representar um avanço significativo na oncologia e na medicina regenerativa.
Um estudo publicado na revista “Cell” em janeiro de 2025 destacou o potencial terapêutico dos miRNAs no combate ao envelhecimento. Pesquisadores chineses conduziram o experimento em camundongos, nos quais injetaram exossomos – pequenas vesículas que transportam moléculas entre as células – contendo o miRNA-302b. Esse miRNA específico foi capaz de reverter a senescência celular nos animais tratados. Os camundongos apresentaram sinais de rejuvenescimento, como melhora na capacidade cognitiva, crescimento de pelos em áreas calvas e aumento da longevidade. Além disso, não foram observados efeitos colaterais significativos, como o desenvolvimento de tumoras, durante o período de estudo de 2 anos e meio.
Outras pesquisas indicam que diferentes miRNAs estão envolvidos em processos cruciais do envelhecimento, como a inflamação e degradação celular. Estudos publicados no Journal of Cell Science e Current Genomics destacam que a manipulação de mi RNAs pode influenciar positivamente a longevidade e a saúde das células. Um exemplo é o miRNA-146a, que tem um papel anti-inflamatório e pode ajudar a proteger contra doenças relacionadas a idade, como Alzheimer e artrite. A descoberta do papel dos miRNAs abre caminho para avanços significativos na medicina. Cientistas acreditam que, no futuro, será possível desenvolver terapias que utilizem essas moléculas para retardar o envelhecimento e tratar doenças crônicas, tendo possíveis aplicações em terapias rejuvenescedoras – restaurando a função celular e retardando sinais do envelhecimento -, diagnóstico precoce de doenças – servindo como biomarcadores para a detecção de doenças – e prevenções de inflamações crônicas – utilizando a regulação de miRNAs que controlam processos inflamatórios para reduzir o impacto de doenças.
O reconhecimento da importância dos microRNAs na biologia celular foi consolidado com a premiação de Victor Ambros e Gary Ruvkun com o Prêmio Nobel de Medicina de 2024, por suas descobertas sobre o papel dessas moléculas na regulação gênica. Seu trabalho revolucionou a compreensão da biologia molecular e abriu portas para novas pesquisas no campo do envelhecimento e da medicina regenerativa.
Dessa forma, é possível notar que os miRNAs, apesar de pequenos, são poderosos reguladores do funcionamento celular. O que antes era considerado “DNA lixo”, segmentos do genoma sem função aparente, hoje desempenha papéis fundamentais na regulação gênica. Ao controlar a produção de proteínas, essas moléculas influenciam diretamente o envelhecimento e a saúde das células. Apesar do enorme potencial, ainda há desafios a serem superados, como o desenvolvimento de métodos seguros e eficazes para alterar os níveis de miRNAs no organismo sem causar efeitos colaterais indesejados. No entanto, os avanços na área são promissores e mostram que a ciência está cada vez mais próxima de encontrar soluções para prolongar a vida saudável.
Referências Bibliográficas:
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Autora:
Débora Luísa Filipetto Pulcinelli
Acadêmica do curso de Farmácia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e colaboradora do Portal Ciência e Consciência.
Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/7672415642403469