Coordenadoria de Transferência de Tecnologia da Agittec e pesquisadores buscam parcerias que permitam levar a tecnologia até as usinas
Uma nova tecnologia desenvolvida por pesquisadores da UFSM e da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI) permite o aproveitamento da glicerina, um subproduto gerado na produção de biodiesel. O método criado por eles é uma alternativa para o uso comercial dos sais residuais gerados durante o processo de destilação da glicerina. Segundo os pesquisadores, as usinas poderão faturar R$ 15 milhões por ano com a venda do sal purificado, e uma economia de aproximadamente R$ 2,25 milhões de reais com a conta do aterro desse material que não será mais descartado, colaborando para a preservação do meio ambiente.
Segundo a edição mais recente do Anuário Estatístico da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em 2018 as usinas de biodiesel fabricaram um total de 440,6 milhões de litros de glicerina como resultado de suas atividades. Para cada 10 litros de biocombustível é gerado cerca de um litro de glicerina.
Em entrevista para o portal da revista Biodieselbr, mídia especializada no assunto, o professor do curso de Engenharia Agrícola da UFSM em Cachoeira do Sul, Marcus Vinícius Tres, explica que o problema é que essa glicerina não sai das usinas em condições de uso imediato. Antes, o material precisa passar por um processo de destilação que deixa para trás quantidades consideráveis de um tipo de resíduo sólido – entre 17 e 18 mil toneladas apenas no ano passado – que, até agora, tinha que ser descartado com cuidados especiais que geram um alto custo para as empresas do setor. “Ele é classificado como um resíduo classe 2 não inerte, ou seja, possuem propriedades, como biodegradabilidade, combustibilidade ou solubilidade em água. Isso exige que ele seja descartado em aterros sanitários especiais para a indústria química ao custo de R$ 150 por tonelada”.
Para identificar e buscar soluções para reduzir o custo do descarte dos resíduos, o grupo de pesquisadores realizou visitas técnicas em empresas do setor. “Fizemos reuniões com o pessoal da direção de algumas usinas e esse foi um dos problemas que eles identificaram como prioritário”. Como a maior parte do resíduo era formada por sais, uma solução seria destiná-lo para a indústria de alimentação animal, mas isso esbarrava na rejeição do produto in natura. “Esse sal está contaminado por ácidos graxos e os animais não o aceitam sem purificação, mesmo quando misturado à ração convencional”, explica.
Entenda como funciona o Processo de Purificação de Sal Residual e Uso do Sal desenvolvido pelos pesquisadores
O sal bruto é misturado com um solvente que separa contaminantes do sal purificado. No final, cerca de 80% da massa total pode ser aproveitada. “Estamos falando de algo em torno de 14 a 15 mil toneladas anuais”, ressalta o professor. Além de uma economia de aproximadamente R$ 2,25 milhões por ano só com a conta do aterro desse material. O professor Marcus estima que as usinas também poderão ganhar R$ 15 milhões por ano com a venda do sal purificado. O professor ressalta que com a nova tecnologia, o setor deixa de gastar com sua disposição final, além de ganhar com a comercialização de um produto, “também, podemos relacionar ganhos indiretos vinculados a imagem e visibilidade da empresa no se refere às questões ambientais”, explica.
Invenção que colabora para a preservação do meio ambiente
Recentemente, a Agência de Inovação e Transferência de Tecnologia (Agittec) da UFSM publicou uma reportagem sobre o Dia Mundial da Propriedade Intelectual, e neste ano o tema da campanha era Inovar para um futuro verde. A Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), reconhece cada vez mais que a tecnologia constitui parte da solução. Para a organização, isto evidencia ainda mais a necessidade de esforços redobrados para criar sólidos sistemas de inovação nacionais e de possibilitar o acesso a sistemas eficazes de Propriedade Intelectual (PI) que apoiem o desenvolvimento e a aplicação das tecnologias, produtos e serviços necessários para a transição a um futuro verde.
Para o professor do Departamento de Engenharia Química e Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Marco Di Luccio a invenção pode colaborar para o meio ambiente, porque os sais gerados na purificação da glicerina, não serão mais descartados de formas inadequadas no solo, ou em aterros industriais controlados. “Ao aproveitar esse resíduo para o uso em ração animal, o descarte no ambiente deixa de ser necessário, diminuindo a necessidade de uso de aterros ou ainda evitando a contaminação de solos pela disposição inadequada”, ressalta.
Glicerina gerada na produção de biodiesel no Brasil
Segundo a edição mais recente do Anuário Estatístico da ANP, a Região Sul é a maior geradora de glicerina na produção de biodiesel no Brasil. Só o estado do Rio Grande do Sul representa 26% da geração desse subproduto no Brasil. A partir disso, é perceptível que a tecnologia desenvolvida pelos pesquisadores atende uma demanda maior no estado.
A glicerina gerada pode variar em função do processo de produção e das matérias-primas utilizadas. Em 2018, a maior geração de glicerina se deu na Região Sul (40,7% do total), seguida das regiões Centro-Oeste (39,7%), Sudeste (9%), Nordeste (7,7%) e Norte (2,9%). A tabela e o gráfico abaixo estão no Anuário Estatístico da ANP, e referem- se à geração de glicerina bruta na produção de biodiesel no Brasil, veja:
Transferência da tecnologia
Os pesquisadores receberam o suporte da Coordenadoria de Propriedade Intelectual (CPI) da Agittec, que realizou o depósito da patente dessa nova tecnologia junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). Atualmente, a tecnologia está em fase de prospecção de parcerias que permitam levar a tecnologia até as usinas. Essa fase é desenvolvida pela Coordenadoria de Transferência de Tecnologia (CTT) da Agittec, juntamente com os pesquisadores. Segundo o professor Marcus, “o foco são empresas que tenham plantas de destilação de glicerina”, finaliza. A CTT atua na relação entre a UFSM e instituições públicas ou privadas para apoiar iniciativas de pesquisa tecnológica e inovação, com a finalidade de incentivar à transferência do conhecimento gerado no ambiente acadêmico à sociedade.
Os inventores do Processo de Purificação de Sal Residual e Uso do Sal são: Marcus Vinícius Tres (UFSM); Rogério Marcos Dal Lago (URI Erechim); Marshal Paliga (URI Erechim); Carolina Elisa Demaman Oro (URI Erechim) e Marcelo Luis Mignoni (URI Erechim).
Texto: Luana Giazzon, acadêmica de Jornalismo e bolsista da Agência de Inovação e Transferência de Tecnologia (Agittec)
Edição: João Ricardo Gazzaneo