O Programa VOLVER entrevista Douglas Oscar Ceolin Mariano, egresso da Universidade Federal de Santa Maria no curso de Ciências Biológicas, turma de 2011. Douglas é Coordenador de Produção no Núcleo de Produção de Soros do Instituto Butantan e atualmente ajuda a produzir um novo soro, o soro hiperimune anti-SARS-CoV-2, que será utilizado nas pessoas acometidas gravemente pela doença.
VOLVER – Para iniciarmos, nos conte como ingressou na carreira científica, quais desafios e recompensas em trabalhar com pesquisa?
DOUGLAS – Eu iniciei a minha carreira científica enquanto cursava Ciências Biológicas, no ano de 2008, no laboratório de Bioquímica Toxicológica, sob a orientação do Dr. João Batista Teixeira da Rocha. Acabei optando por esta carreira uma vez que sempre fui uma pessoa curiosa e interessada pela ciência. Além disto, sempre pensei que por meio da pesquisa eu conseguiria fazer algo que pudesse ajudar a sociedade.
Esta é uma carreira que exige muita dedicação, estudo e leitura, além de ter que dispender muitas horas da sua vida dentro de um laboratório, realizando vários testes e experimentos. Nem sempre os experimentos saem como o planejado ou obtemos os resultados que gostaríamos, o que muitas vezes gera frustrações. No entanto, no meu ponto de vista, todo o empenho investido torna-se gratificante uma vez que consigo terminar uma pesquisa e ajudo a contribuir com o desenvolvimento do conhecimento científico.
VOLVER - Quais as lembranças que guarda da UFSM e como a instituição contribuiu para o seu ingresso na pesquisa?
DOUGLAS - Eu guardo lembranças muitas boas desta época, pois além de ter sido um período de amadurecimento e desenvolvimento pessoal, acabei conhecendo várias pessoas e fiz vários amigos, que até hoje mantenho contato. Em termos profissionais, durante o curso de Ciências Biológicas, tive a oportunidade de conhecer vários professores/pesquisadores e suas respectivas linhas de pesquisa, que acabaram me incentivando, e muito, a trilhar o caminho da pesquisa.
VOLVER – Você possui mestrado e doutorado em Toxinologia, nos conte mais um pouco sobre esse estudo.
DOUGLAS – Após o término da graduação, acabei me mudando para São Paulo em 2012, onde realizei o meu mestrado no Instituto Butantan, no laboratório de Bioquímica e Biofísica, sob a orientação do Dr. Daniel Pimenta. Esta pós-graduação havia sido criado a pouco tempo e tem como objetivo estudar as diferentes biomoléculas presentes nas secreções cutâneas e nos venenos, produzidos pelos diferentes animais, em termos bioquímicos, farmacológicos ou imunológicos, por exemplo.
Durante o meu mestrado, eu acabei estudando as biomoléculas presentes nas secreções cutâneas dos anfíbios, principalmente do anuro Pipa carvalhoi, com o intuito de caracterizá-las bioquimicamente e tentar entender o papel delas na biologia do animal. Para isto, aprendi técnicas cromatográficas para o fracionamento e purificação destas moléculas, assim como trabalhei com análises de espectrometria de massas destes materiais.
Isso me encantou, o que me fez optar por fazer o meu doutorado no mesmo laboratório de pesquisa, realizado entre os anos de 2014 e 2018. Neste período aprofundei os estudos envolvendo as moléculas presentes nas secreções cutâneas dos anuros, assim como acabei estudando os componentes dos venenos de alguns animais, tais como formiga, serpentes, escorpiões, entre outros materiais biológicos.
VOLVER – Em 2017 você recebeu a Menção Honrosa da Federação de Sociedades de Biologia Experimental, o que essa premiação representou na sua carreira como pesquisador?
DOUGLAS – Neste trabalho eu fui colaborador de uma pesquisa científica realizada por uma aluna de doutorado, que na época estudava na USP. É sempre bom ter o seu trabalho reconhecido, pois nos incentiva a cada vez mais a seguir o caminho da pesquisa e a procurar novos desafios e descobertas.
VOLVER – Como é trabalhar no Butantan? Nos conte um pouco sobre o seu trabalho e a sua pesquisa no Instituto.
DOUGLAS – Eu adoro estar e trabalhar no Instituto Butantan, pois nem parece que estou morando em São Paulo. Isto porque é um local calmo e que possui uma ampla área verde, sendo possível observar a presença de vários animais, inclusive lagartos e até saguis durante determinadas épocas do ano. Além disto, por ser um parque, é um local frequentemente visitado por muitas famílias que buscam descansar, visitar os museus e passear pelo instituto. Eu comecei a trabalhar na Fundação Butantan em 2020, no Núcleo Estratégico de Venenos e Soros, pertencente ao Laboratório dos Artrópodes.Atualmente, ocupo o cargo de Coordenador de Produção no Núcleo de Produção de Soros. Resumidamente, estou envolvido na produção dos diferentes soros produzidos pelo Instituto Butantan, como por exemplo, os soros utilizados para o tratamento de picadas por animais peçonhentos (cobras, aranhas e escorpiões).
No meu trabalho eu estou envolvido no controle em processo e implementação de novas abordagens metodológicas para a produção dos soros, desde a etapa do antígeno utilizado na imunização dos cavalos, na resposta imunológica dos cavalos imunizados e até a etapa de processamento do plasma para a obtenção do soro hiperimune.
VOLVER – Na sua opinião, qual a importância do Instituto Butantã para a sociedade?
DOUGLAS – O Instituto Butantan é uma instituição que se dedica à pesquisa em saúde pública e produção de imunobiológicos desde o início do século XX. Atualmente, o Instituto Butantan ocupa uma posição de destaque, devido ao seu envolvimento na produção das vacinas contra o SARS-CoV-2, além de estar envolvida na produção da vacina Influenza, entre outras. No entanto, esta instituição também é mundialmente reconhecida devido a produção de 12 diferentes tipos de soros utilizados no tratamento de antivenenos, antitoxinas e soro antirrábico. A palavra soro refere-se a qualquer imunobiológico produzido em animais e utilizado no tratamento de enfermidades provocadas pela ação do veneno de animais peçonhentos, por toxinas de agentes infecciosos, como os causadores da difteria, botulismo e tétano, ou ainda, na profilaxia pós-exposição ao vírus da raiva.
VOLVER – Relate a sua atual pesquisa, em que fase está e quais os principais resultados.
DOUGLAS – Atualmente, a área em que trabalho está ajudando a produzir um novo soro, o soro hiperimune anti-SARS-CoV-2. A ideia deste soro é utilizá-lo em pacientes acometidos pela doença, em estado grave. No momento, este produto recebeu uma autorização da Anvisa para o início dos testes em humanos.
VOLVER – Por que o conhecimento científico e o desenvolvimento da ciência são importantes para a área de conhecimento em que você atua?
DOUGLAS – Ambos são fundamentais para o desenvolvimento de qualquer área, uma vez que sempre há perguntas a serem respondidas e a cada resposta obtida, surgem-se novos questionamentos. Por exemplo, na área em que atuo estamos sempre procurando formas de melhorar o processo de produção do soro, seja estudando as toxinas presentes nos venenos, compreendendo a resposta imunológica dos cavalos ao entrarem em contato com o antígeno e até mesmo, em formas de melhorar a produção do soro durante as etapas produtivas da fábrica, como a inclusão de novas abordagens metodológicas ou inserção de novos equipamentos. E para isto, sempre recorremos ao conhecimento descritos na literatura científica.
VOLVER – Como você se vê daqui 10 anos? Pretende continuar atuando em pesquisas?
DOUGLAS – Eu não me vejo em outra área que não seja a da pesquisa. Isto porque eu adoro discutir ciência e me sinto realizado, ainda mais sabendo que o meu trabalho ajuda a contribuir com o desenvolvimento do conhecimento científico. Além disto, sinto uma imensa gratificação quando eu posso utilizar este conhecimento, mesmo que pequeno, em prol da sociedade.
Texto: Júlia Ferrari B Oliveira