Após a colheita da safra de verão no sul do Brasil, o agricultor se depara com muitas possibilidades de coberturas do solo, visando introduzir plantas de cobertura para proteger o solo da exposição à ação dos agentes climáticos. A cobertura auxilia no controle de plantas daninhas, doenças e pragas, evitando perdas de nutrientes e, consequentemente, da fertilidade. Outro benefício é garantir a rotação de culturas, um dos pilares do Sistema Plantio Direto, que consiste em alternar espécies vegetais em uma mesma área agrícola, melhorando as características químicas, físicas e biológicas do solo. Atualmente, existem várias espécies de plantas que podem ser utilizadas como plantas de cobertura, entre as quais o trigo mourisco (Fagopyrum esculentum Moench), conhecido também como trigo sarraceno, trigo mouro ou trigo preto, vem ganhando destaque (Imagem 1).
Imagem 1: Lavoura de trigo mourisco.
O trigo mourisco é uma planta dicotiledônea que, apesar de ser chamada de trigo, não possui parentesco com o seu homônimo mais popular, que é uma monocotiledônea. A semelhança é baseada na comparação entre as sementes e sua composição química. Recomendado para culturas de segunda safra, o trigo mourisco é uma excelente planta para cobertura de solos (WENDLER, 2016). Pertencente à família Polygonaceae, é uma planta de elevada rusticidade e ciclo curto, destaca-se pela tolerância à acidez do solo e pela capacidade de absorção de sais de fósforo e potássio que são de baixa solubilidade.
O Trigo Mourisco, segundo Gerarda da Silva (2019), pode ser uma boa alternativa para a rotação de cultura por ser uma planta de múltiplas aptidões, cujas principais características são:
- Tolerância a baixo pH e nível de alumínio tóxico (Al3+) ou cobre no solo, tendo bom desenvolvimento em solos nutricionalmente pobres.
- Apresenta boa capacidade para a utilização dos sais de fósforo (P) e potássio (K), os quais são pouco solúveis no solo.
- O sistema radicular agressivo atinge maiores profundidades, otimizando o acesso a nutrientes e água.
- Seu período de floração é proporcionalmente longo, de aproximadamente 40 dias, sendo muito procurado por insetos polinizadores.
- Não há relatos de doenças que ataquem a cultura.
- São excelentes fontes de adubo verde, sendo utilizados inclusive para a recuperação de solos degradados.
- Auxiliam no manejo de plantas daninhas de difícil controle.
- Cresce com mínimo de precipitação, suportando estiagem
O ciclo total da planta é de aproximadamente 80 dias, podendo variar com a região, possibilitando a realização de até três safras por ano; apresenta rápido crescimento produzindo boa quantidade de massa verde 15 a 25 (t/ha) e seca 3 a 6 (t/ha). A recomendação para a semeadura é que seja realizada longe do período de geadas, já que se trata de uma cultura suscetível.
Existem duas janelas de plantio do trigo mourisco:
- Na rotação de culturas com milho ou soja é indicada semeadura na primavera ou no fim do inverno, quando a temperatura do solo é mais elevada. Também pode ser introduzido antes do plantio da soja, sendo semeado no final de agosto ou início de setembro.
- Em rotação com soja ou milho hiperprecoces, colhidos em janeiro, fevereiro ou março, o trigo mourisco é semeado com o intuito de ser colhido antes das primeiras geadas do ano.
A população recomendada pode variar de 300 a 800 plantas por metro quadrado, onde o dossel e porte de plantas podem ser observados na imagem 2. Segundo Ferreira (2012), como o objetivo de plantio para supressão de plantas daninhas ou cobertura do solo, deve-se utilizar maiores populações, caso seja colheita de grãos, pode-se reduzir o número de plantas.
Imagem 2: Trigo mourisco.
No centro-oeste a utilização do Trigo Mourisco no mix de plantas de cobertura já é uma realidade entre as safras, enquanto no sul do país é utilizado após a colheita da cultura de verão, antecedendo a implantação de culturas de inverno, como trigo, cevada ou aveia. Segundo Menezes e Leandro (2004), ao avaliarem a produção de fitomassa de diferentes espécies de coberturas do solo e a extração de diversos nutrientes, bem como o potencial dessas espécies vegetais em fornecer nutrientes às culturas subsequentes, o Trigo Mourisco apresentou bons resultados, como pode ser observado na imagem da Tabela 2.
Imagem 3: Tabela de relação C/N.
Além de apresentar alta relação carbono/nitrogênio, promovendo a ciclagem de nutrientes e favorecendo as culturas subsequentes, esta planta também se destaca na supressão de nematóides, inibindo a reprodução do gênero Pratylenchus Spp e suprimindo o desenvolvimento em 90% de formas juvenis de Meloidogyne Incognita. Segundo a Sociedade Brasileira de Nematologia, as perdas causadas por este fitopatógeno variam entre 5 e 35%, dependendo do tipo de cultivo. Essas espécies de fitonematóides possuem potencial para sobreviver de uma safra para outra, com a implantação do trigo mourisco ocorre uma quebra de ciclo de desenvolvimento e multiplicação. O mecanismo de ação envolve a produção de exsudatos radiculares que inibem o desenvolvimento de nematoides, além de ser rico em taninos, substâncias com ação anti-helmíntica, que atuam reduzindo a fertilidade de nematoides fêmeas, consequentemente, reduzindo a sua taxa de reprodução (SILVA, 2019).
Levando em consideração todos esses benefícios que o trigo mourisco apresenta para a agricultura, como o bom aproveitamento da fertilidade natural do solo, facilidade no manejo de plantas daninhas, tolerância a pragas e doenças, maior produção de biomassa em curto tempo, redução de nematoides no solo, entre outros, torna-se uma ótima cultura para o sistema de rotação de culturas, visando aumentar a qualidade da produção agrícola.
Referências:
VUICIK, Eduardo. Plantas de cobertura na entressafra das culturas da soja e trigo. Revista cultivando o saber ISSN 2175–2214 Volume 9 — n 3, p.44 a 51. Julho a Setembro de 2018.
ORSO, G. A. Teste de vigor em sementes de trigo Mourisco (Fagopyrum esculentum moench) cultivar IPR-92-Altar. Faculdade Assis Gurgacz,Cascavel, 2010. Disponível em: https://www.fag.edu.br/upload/revista/cultivando_o_saber/592735dc96cae.pdf . Acesso em 30 abr 2021.
SILVA, Gerarda Beatriz Pinto. Conhecendo o trigo mourisco, Instituto agro excelência no agronegócio. Disponível em: https://institutoagro.com.br. Acesso em 30 abr 2021.
FERREIRA, D. B. Efeito de diferentes densidades populacionais em características Agronômicas de Trigo Mourisco (Fagopyrum esculentum, Moench). Universidade de Brasília Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária. Brasília: UNB, 2012.
Sementes com Vigor, Incrementando a rotação de culturas com Trigo Mourisco, 2018. Disponível em: http://www.sementescomvigor.com. Acesso em 30 abr 2021.
Autora:
Luana Campagnolo Flores, acadêmica do 4º semestre de Agronomia e bolsista do grupo PET Agronomia — Universidade Federal de Santa Maria.
Texto publicado em: https://maissoja.com.br/trigo-mourisco-na-rotacao-de-culturas/
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