Com o grande avanço de áreas cultivadas com soja no país nos últimos anos, aumentou também a incidência de pragas oportunas dessa cultura nas lavouras brasileiras. Isso se deve, em grande parte, ao uso intensivo de agrotóxicos com o mesmo modo de ação (MoA). Com o passar do tempo e uso constante de inseticidas com o mesmo modo de controle, favoreceu a sobrevivência de insetos “pré-adaptados” que carregam genes resistentes. Esse processo aumentou a frequência destas pragas nas lavouras e diminuiu a eficiência dos produtos. Em 2013, teve-se a adoção de cultivares de soja expressando a proteína Bt Cry1Ac com efeito inseticida, tecnologia que se mostrou eficiente no controle das principais pragas-alvo da soja. Contudo, deve-se atentar sobre a importância de fazer o manejo integrado de insetos para que se consiga retardar ou minimizar a evolução da resistência.
A proteína Cry1Ac é eficiente no controle de lepidópteros como a lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis), lagartas falsas-medideiras (Chrysodeixis includens) e (Rachiplusia nu), broca-das-axilas (Crosidosema aporema) e espécies do gênero Helicoverpa spp (BERNARDI et al., 2016) e a única disponível no mercado para a soja. Contudo, com a introdução da cultura da soja subsequente à do milho nas mesmas áreas, as lagartas do complexo Spodoptera, em especial a S. frugiperda estão cada vez mais presentes nas lavouras e apresentando hábito de rosca no estádio de plântulas. Estas lagartas não são controladas pela proteína e, por isso, devem ser manejadas com uso de inseticidas.
Para prolongar a vida útil da proteína Cry1Ac, presente nas sojas Bt, é indicado fazer o uso de refúgio — área de plantio destinada a cultivares que não expressam genes da bactéria Bacillus thuringiensis, recomendada aos agricultores que fazem uso de sementes com tecnologia Bt. A indicação técnica é de que o tamanho da área destinada ao refúgio deve ser 20% da área total plantada. A cultivar de refúgio deve ter tempo de desenvolvimento e maturação similar à Bt e estar a menos de 800 metros de distância da área com cultivo de soja Bt (Figura 1.) (BERNARDI et al., 2016). Segundo o Comitê de Ação a Resistência a Inseticidas (IRAC-BR), as áreas de refúgio devem ser manejadas como toda a lavoura, tentando ao máximo minimizar o uso de inseticidas foliares nestas áreas para não causar a mortalidade de insetos suscetíveis que estão presentes ali (objetivo principal do refúgio). Se houver a extrema necessidade do uso de inseticidas, deve-se optar por aqueles que não sejam da tecnologia a base de Bt e buscar por inseticidas que apresentam MoA distintos. Essas ações irão ajudar na preservação da tecnologia por mais tempo.
Uma das estratégias usadas com maior frequência e em maior área para controle das pragas da soja são os inseticidas químicos, mas seu uso contínuo selecionou populações de pragas resistentes, como a falsa-medideira (C. includens), que hoje é considerada uma das principais pragas desfolhadoras de soja e algodão no Brasil. Monitoramentos do Comitê de Ação a Resistência a Inseticidas (IRAC-BR), juntamente com empresas privadas e instituições de ensino, vêm desenvolvendo desde a safra 2013/14 o monitoramento da suscetibilidade dessa praga oriunda de diversos estados do país. Os estudos constataram que os insetos apresentaram redução na suscetibilidade na maioria das populações quando expostos ao MoA 15: inibidores da biossíntese de quitina, tipo 0 e MoA 18: agonistas de receptores de ecdisteroides (IRAC-BR).
Desta forma, é muito importante fazer o uso de inseticidas respeitando rigorosamente os períodos específicos na cultura em que deve ser feita a aplicação de inseticidas (as chamadas “janelas de aplicação”), os estádios fenológicos da planta e o nível de dano de ataques de pragas. Se dentro de um mesmo período for necessário fazer mais de uma aplicação é aconselhado fazer a rotação de inseticidas com modos de ação diferentes para não induzir resistência na próxima geração. No entanto, se for aplicado mais de uma vez o mesmo produto, o seu efeito residual não deve passar de 30 dias para diminuir a possibilidade de o efeito atingir mais de uma geração da praga.
Nas pulverizações com inseticidas durante o ciclo da cultura recomenda-se rotacionar os modos de ação, tentando ao máximo usar apenas uma vez o mesmo modo de controle, uma vez que inseticidas com modos de ação diferentes (por exemplo, IRAC MoA 1A, 13 e 22A) ligam-se em sítios diferentes atacando os insetos de formas diferentes, o que diminui as chances do inseto desenvolver resistência múltipla, ou seja, a mais de um mecanismo de ação (Figura 2.).
Sendo assim, para garantir uma maior eficiência no controle de pragas, retardando ou minimizando a evolução da resistência desses insetos na lavoura, aumentando a produtividade, a vida útil dos inseticidas e da proteína expressa em cultivares Bt, é extremamente importante que o produtor adote boas práticas agrícolas. Entre elas ressaltam-se o manejo da resistência de insetos, fazendo uso de áreas de refúgio, a rotação de inseticidas com modos de ação diferentes e o monitoramento da frequência de pragas-alvo na propriedade.
Referências
IRAC-BR, Comitê de Ação a Resistência a Inseticidas Brasil. Disponível em: https://www.irac-br.org/
BERNARDI, Oderlei et al. Manejo da Resistência de Insetos a Plantas Bt. Edição. PROMIP–Manejo Integrado de Pragas, Engenheiro Coelho, SP, Brasil, 2016.
BOAS PRÁTICAS AGRONÔMICAS. Soja Bt. Disponível em: https://boaspraticasagronomicas.com.br/culturas-bt/soja-bt/
REVISTA GLOBO RURAL. O que é e como fazer refúgio agrícola. Disponível em: https://revistagloborural.globo.com/vida-na-fazenda/como-fazer/noticia/2017/02/o-que-e-e-como-fazer-refugio-agricola.html
Autor:
Venicius Ernesto Pretto — Acadêmico do 3º semestre curso de Agronomia e Bolsista do PET Agronomia na Universidade Federal de Santa Maria — UFSM