Nos dois primeiros domingos de novembro, cerca de 3,9 milhões de estudantes brasileiros prestaram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) a fim de ingressar em uma instituição de ensino superior. Entretanto, diversos desses alunos não tiveram acesso a disciplinas cobradas no exame como física, sociologia, biologia e literatura, por conta da instauração do Novo Ensino Médio (NEM). A estudante Ana Laura Bayer, 19 anos, compartilha sua experiência: “O novo ensino médio só afetou negativamente aos alunos, porque além da pandemia os itinerários formativos eram ministrados por professores de áreas totalmente diferentes, nos fazendo perder tempo. Em 2020, perdemos aulas de biologia, física e química, matérias importantes no processo seletivo do Enem”, afirma.
A fala da estudante retrata a dificuldade enfrentada por alunos da rede pública com o novo modelo de ensino, que os deixa em déficit na sua formação escolar. Atualmente, o Enem é composto por provas de Linguagens, Ciências Humanas, Matemática e Ciências da Natureza que, juntas, somam 180 questões objetivas de múltipla escolha, além de uma prova de redação.
Criado por meio de Medida Provisória durante o governo do ex-presidente, Michel Temer (MDB), o Novo Ensino Médio está sendo implantado gradualmente nas escolas do país, ganhando maior escala no ano de 2022. Nos últimos meses, a movimentação pela revogação do NEM tem mobilizado grande parcela da população,. incitada por entidades de representação estudantil (UNE, UBES e ANPG) que defendem que “reformar a reforma” não é o suficiente. O atual ministro da Educação, Camilo Santana, reconheceu que “Há varios erros no Novo Ensino Médio.” mas não indicou ser favorável à revogação.
Mas o que é o Novo Ensino Médio?
O novo modelo de ensino amplia a carga horária de formação estudantil (de 800 para 1000 horas anuais) e institui uma nova organização curricular, incluindo a opção de formação técnica profissional. As disciplinas passam a ser divididas em quatro grandes áreas do conhecimento: linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas, que juntas devem ocupar 60% da carga horária do ensino médio. Os outros 40% são preenchidos por itinerários formativos, um conjunto de matérias complementares, acoplados de acordo com a área que o estudante escolhe para se especializar, como humanas, exatas ou biológicas.
“Ela vai poder escolher seu futuro!”
Amplamente divulgado, as propagandas do Governo Federal, prometeram que, “Com o novo Ensino Médio você pode decidir o seu futuro!”. No entanto, na prática, a liberdade de escolha para os alunos não se concretizou. No estado de São Paulo, 1.327 escolas de Ensino Médio da rede estadual (35,9% do total) ofertam apenas dois itinerários formativos, de acordo com a pesquisa realizada pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo (Seduc-SP). Por lei, toda escola deve ofertar, no mínimo, duas opções. Mas, por falta de recursos e infraestrutura (salas de aula em número insuficiente, por exemplo), muitos gestores não conseguem atender a legislação. Outro problema, é o número limitado de vagas para os itinerários, os quais o aluno não é assegurado de sua matrícula.
Os itinerários, ainda são desconectados da realidade dos estudantes. ‘Cuidados com o Pet’, ‘Brigadeiro Gourmet’ e ‘Como se Tornar um Milionário’ são algumas das disciplinas ofertadas pela rede estadual de ensino, que incluem áreas de Linguagem, História, Geografia, Arte, Filosofia e Sociologia.
“É comum eu notar pessoas que largam o colégio”, afirma estudante
Em 2017, a Lei nº 13.415, tinha a proposta de tornar o ambiente escolar um espaço mais dinâmico. No entanto, o novo ensino médio acabou por afastar os alunos do ambiente escolar Pedro Gayer, estudante que teve contato com o Novo Ensino Médio, desde 2021, por estudar em uma escola “piloto”, explica que se tornou corriqueiro ver colegas abandonando a escola: “Nesse ano principalmente, está sendo comum eu ver colegas que estão desistindo do colégio, porque não tem um suporte do estado é uma educação que está bem defasada.”, compartilha. O aluno ainda se mostra preocupado com com seu desempenho no Enem “Nós não sabemos como vamos ir pro Enem, como vamos entrar em uma faculdade, sendo que não temos disciplinas básicas”, acrescenta o aluno.
Texto: Victor Souza
Repórter do Gritos do Silêncio, estudante de Jornalismo pela UFSM. Contato: victor.souza@acad.ufsm.br
Ilustração e Revisão: Pedro Pagnossin, repórter do Gritos do Silêncio e estudante de jornalismo pela UFSM. Contato: pedro.moro@acad.ufsm.br
Publicação: Elisa Bedin, repórter do Gritos do Silêncio e estudante de jornalismo pela UFSM. Contato: elisa.bedin@acad.ufsm.br