A Qiron Robotics, startup incubada na Pulsar Incubadora Tecnológica, especializada na criação de robôs sociais, com foco particular no campo educacional e terapêutico, foi selecionada no edital Startups em Tecnologias Habilitadoras da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O projeto aprovado utiliza robôs humanoides em sala de aula e ambiente clínico como uma ferramenta para o auxílio do
desenvolvimento de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA). O edital foi lançado em setembro de 2022 e o resultado publicado em janeiro deste ano. Com o valor previsto para a startup de R$ 1.623.615,28, através do edital, a Qiron Robotics poderá investir ainda mais em inovações que possam impactar positivamente na educação e na terapia de crianças com TEA
O Transtorno do Espectro Autista é uma condição que afeta significativamente um número crescente de indivíduos globalmente, com estatísticas do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) indicando uma prevalência de 1 em cada 36 crianças. Esta revisão das estatísticas reflete uma realidade ainda mais ampla do que os dados anteriormente reportados pelo IBGE, que sugerem que cerca de 2 milhões de brasileiros estão no espectro autista. Nesse contexto, a Organização das Nações Unidas (ONU) e outras pesquisas regionais, como as conduzidas pela Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para PcD e PcAH no Rio Grande do Sul (Faders), reforçam a importância de aumentar a conscientização e melhorar o acesso a serviços especializados. Em resposta a essa demanda, o projeto da Qiron Robotics surge como uma iniciativa promissora, buscando utilizar a tecnologia robótica e de inteligência artificial para melhorar o aprendizado e comportamento de crianças com TEA.
Sobre o projeto
O projeto Robô autônomo para saúde mental, aprovado no edital, é resultado de uma parceria de cerca de dois anos com a Universidade Federal do Tocantins. Através dela, eles utilizam um robô apelidado de Nico para trabalhar as formas de interagir, criando atividades e jogos para ajudar no desenvolvimento das crianças com autismo. O modelo de robô usado é o Beo, desenvolvido pela própria Qiron e usado também em outras finalidades como em eventos e ambientes de engajamento com o público. “O Beo se destaca em salas de aula e clínicas como um parceiro expressivo do professor e um facilitador para terapeutas, ajudando na interação e no engajamento de crianças, incluindo aquelas com Transtorno do Espectro Autista. Ele combina inteligência artificial com conteúdo personalizável, tornando a aprendizagem mais inclusiva e a terapia mais eficaz. Essa abordagem mais empírica é o que nos embasou para buscar a profundidade científica junto à UFT”, comenta Rafael Miranda, CEO da Qiron Robotics.
Na pesquisa com a UFT, o robô auxilia no desenvolvimento de crianças autistas, trabalhando as habilidades sociais e comportamentais. A pesquisadora do projeto, Héllen Souza Luz, ressalta que a dificuldade de interação social é uma das características centrais das crianças com TEA. “Ele consegue estimular, por exemplo, a fala e outras habilidades sociais nas crianças com TEA, desenvolvendo micro-comportamentos fundamentais para o processo escolar dessas crianças – como a troca de turnos, atenção conjunta, entre outros. Em indivíduos neurotípicos, esses comportamentos são desenvolvidos naturalmente, a partir da observação; já na criança com TEA, não: ela precisa ser treinada para isso e, quanto antes ocorrer, melhor, para que tenha um processo acadêmico com menos prejuízo”, comenta ela em entrevista ao Sexta com Ciência, da UFT.
Segundo Rafael, apesar de a pesquisa ser desenvolvida há um tempo, ela necessitava de recursos para o aprofundamento e melhora da tecnologia. “ Estamos agora em uma posição única para não apenas aprofundar nossa pesquisa, mas também tornar nossa tecnologia mais acessível e adaptável às necessidades dessas crianças. Este investimento é um testemunho do potencial do nosso projeto em fazer uma diferença real na vida das pessoas e serve como um catalisador para futuras inovações”, ressalta ele. A aprovação no edital vai permitir que a Qiron acelere o seu desenvolvimento, tanto na parte científica (pesquisas sobre o TEA junto à UFT) quanto na parte tecnológica (ampliação do potencial do robô Beo).
Além disso, Rafael destaca que o edital da Finep traz celeridade e notoriedade para o projeto. “É um cartão de visita. Várias portas se abrem com esse aporte, podemos tornar o Beo mais acessível e adaptável, e também podemos explorar novas oportunidades de parcerias, que podem beneficiar não apenas crianças com TEA, mas também outros grupos”, pontua. Para o futuro, a Qiron pretende expandir suas parcerias e soluções. Dentre seus planos, está a possibilidade de trabalhar com idosos, adultos com TEA e outras neurodivergências. Além de ampliar as parcerias já existentes, a exemplo da com o Sebrae e no Descubra da UFSM, em que o robô foi hostess.
A tecnologia no auxílio do TEA
A tecnologia tem desempenhado um papel significativo no auxílio ao autismo, oferecendo aplicativos e programas específicos que proporcionam atividades interativas para estimular o raciocínio, a criatividade e a autonomia das crianças autistas. Além disso, a tecnologia assistiva, definida pela Lei Brasileira de Inclusão, visa melhorar a funcionalidade e a participação ativa na vida, promovendo a autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.
Conforme a rede Genialcare, no contexto do autismo, a tecnologia assistiva, incluindo computadores, tablets e celulares, tem sido fundamental para a inclusão educacional, promovendo a interação, o desenvolvimento da comunicação, socialização e comportamento dos estudantes. Os benefícios da tecnologia no autismo incluem o acesso facilitado a recursos educacionais e terapêuticos, a personalização do processo de ensino e a adaptação às necessidades individuais, como no caso do robô utilizado no projeto da Qiron.
A tecnologia também desempenha um papel crucial no desenvolvimento de habilidades das pessoas com TEA, como afirma a pesquisadora do projeto, Simone Irigon, em entrevista ao Sexta com Ciência, ao destacar como o robô Nico tem sido eficiente no processo de aprendizagem dos estudantes com TEA. “Suas especificações permitem programação e seus estímulos são observados por meio de movimentos corporais, roteiros verbais gravados, orientação da cabeça, movimentos do olhar e coordenadas de braços e mãos, controlados por iPad, que se comporta como um controle em tempo real, sendo assim uma ferramenta com profundidade de ensino e pesquisa capaz de despertar a empatia com o participante”, ressalta a pesquisadora.
No entanto, é importante ressaltar que a tecnologia deve ser utilizada de forma complementar, com o suporte humano e a orientação de profissionais especializados, uma vez que a interação pessoal continua sendo fundamental no processo de desenvolvimento de qualquer criança.
Texto: Fabrício Dias, bolsista de jornalismo no InovaTec UFSM Parque Tecnológico;
Revisão e edição: Luana Giazzon, bolsista da assessoria de Comunicação do InovaTec UFSM Parque Tecnológico;
Fotos: Qiron Robotics.