Com o aumento iminente de casos do coronavírus, a UFSM está com suas aulas presenciais suspensas desde o dia 16 de março. A partir dessa suspensão, aulas na modalidade de ensino remoto foram inseridas no dia a dia dos mais de 26 mil alunos da Universidade. Uma parte considerável desses estudantes possuem dificuldade de se adaptar a este novo método de ensino que chegou tão repentinamente. Porém, a universidade afirma que nenhum aluno será prejudicado se não participar destas aulas remotas, com a possibilidade de recuperação dessas ausências quando as aulas presenciais retornarem.
A suspensão das atividades presenciais e a implementação das aulas à distância acabaram por evidenciar pontos desafiadores de uma aprendizagem sem conversas diretas e sem a interação “olho no olho”. Desespero por não conseguir se concentrar ou adquirir interesse no conteúdo passado são preocupações que afetam os alunos nesse novo sistema. Contudo, o ensino à distância não é algo inovador e desafiador só para os alunos, mas também para os docentes da Universidade. Os professores são desafiados a cada dia a adaptar seus métodos de ensino presenciais para diferentes ferramentas digitais. Eles se viram obrigados a se aventurar e pensar em novas possibilidades para conseguir realizar suas aulas nessa modalidade. Assim como os estudantes, muitos educadores dependem de infraestrutura e suporte para esse novo meio de aprendizagem.
Para esclarecer estas questões, entrevistamos duas especialistas no ensino à distância: Susana Cristina dos Reis e Andrea Reginatto. Susana é professora no curso de Letras-Inglês, coordenadora substituta do Programa de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Tecnologias Educacionais em Rede (PPGTER), pesquisadora e docente no PPGTER. Andrea Reginatto é coordenadora do curso de letras EAD e docente no PPGTER. No mestrado em Educação e Tecnologias em Rede, há disciplinas que abordam o ensino à distância, com estudos voltados para modelos de aprendizagem e a utilização de jogos na educação. Além disso, pesquisas estrangeiras sobre EAD são estudadas para compartilhar conhecimentos sobre estas metodologias.
A importância das aulas e as dificuldades
A respeito da implementação das aulas à distância em meio a pandemia, Susana afirma que é importante a universidade se fazer presente na vida dos alunos tanto do ponto de vista educacional quanto do vínculo social. “Eu acho que esse uso é fundamental, esse contato com os alunos, para que a gente consiga manter um pouco mais de sanidade, verificando como eles estão passando por esse período todo. Claro que nossa preocupação também é com a aprendizagem, mas precisamos acima de tudo, considerar o lado humano”, ressalta. A professora ainda complementa que nesse momento é importante se manter ocupado a partir do estudo, para que se possa suportar as adversidades.
Apesar da necessidade do ensino virtual, há vários impasses que podem afastar o aluno deste método de ensino. A falta de infraestrutura, como não ter um computador com boa conexão de internet, cria uma dificuldade para o estudante acessar o conteúdo, o que pode causar desinteresse e frustração. De acordo com Susana, o papel do professor para que isso não aconteça é essencial.
O docente precisa buscar conhecer a situação de seus alunos, fazer um mapeamento inicial, para então poder identificar os problemas e ajudar os estudantes durante este período. O contato educador e educando é fundamental para o melhor andamento das aulas à distância, por isso é importante que o professor receba o feedback dos alunos – tanto em relação às atividades propostas quanto à situações específicas e de ordem pessoal.
O docente deve elaborar tarefas que coloquem o aluno no centro do processo de aprendizagem. “Para o professor, não é possível ensinar da forma tradicional, é necessária uma mudança tanto de abordagem quanto de paradigma”, diz Susana. A adaptação do material didático é outra estratégia que não pode ser deixada de lado: “Um texto no formato papel precisa passar por uma modificação para ser lido no formato de tela”, enfatiza Susana. Ela ainda reforça a importância do estudante se organizar dentro de sua própria casa para criar uma rotina de estudos. O interesse e a motivação do aluno em estar atento a estas aulas podem ser abalados por diversos fatores, como distrações por estar em casa, a falta de um local de estudo e dificuldade em criar um cronograma.
Para Andrea Reginatto, o professor possui um papel de conhecer potencialidades e as fragilidades de um ensino mediado pelas tecnologias e ir em busca de desafios, conhecer as plataformas digitais para conseguir o melhor resultado possível na aprendizagem remota. A respeito de diferença em questões de aprendizagem em aulas presenciais e à distância, Andrea acredita que alunos que possuam um bom acesso à internet e equipamentos com boas condições estão dispostos a enfrentar uma experiência nova. “O aluno poderá ter um bom desempenho, desde que seus professores também tenham tais condições”, afirma.
Ferramentas para o ensino
Ferramentas como o Moodle dão suporte para o professor avaliar e acompanhar o andamento do aluno em cada tarefa. O Moodle consegue dar um feedback para o educador, com relatórios de acessos, atividades realizadas e o tempo que o aluno ficou em determinada atividade, o que facilita o acompanhamento individual dos acadêmicos.
No espaço dos fóruns, há uma troca entre os alunos e os professores. Nessa ferramenta, o educando pode responder o questionamento do conteúdo passado pelo professor e também trocar as experiências com seus colegas. A resposta fica salva para quem quiser ver, assim como as observações feitas pelo docente.
Em relação a recursos multimídia, o professor pode utilizar vídeos e áudios para reforçar o método de aprendizagem e diversificar a metodologia de ensino.
Uma estratégia citada por Susana que pode tornar o ensino a distância mais atrativo é o de implementação de estratégias de “Gamification”, que nada mais é do que o uso de jogos para contextos não relacionados a jogos. A implantação dessa metodologia pode tornar o ensino virtual um pouco mais motivador e engajador para o aluno. Um material de gamification faz com que o estudante trabalhe de forma mais colaborativa e favorece seu engajamento na aula.
Atualmente, há várias ferramentas que podem auxiliar o professor na interação com seu aluno, recursos como Whatsapp e Google Meet, por exemplo, podem tentar ‘’suprir’’ essa falta de contato face a face entre o profissional e o aluno. Aplicativos como Google Hangouts, Meet, Zoom e Jitsi, são opções para conseguir dialogar com o maior número de alunos ao mesmo tempo ou individualmente e, também, para receber o feedback necessário para o desenvolvimento do trabalho adaptado.
As aulas remotas podem servir como solução diante de um contexto de pandemia para alunos que possuem as condições necessárias para acompanharem esses materiais online. Porém, elas dependem também de grandes esforços por parte dos profissionais e dos alunos, que foram pegos de surpresa por esse método de ensinar à distância e se vêem diante de um novo desafio de ensino e aprendizagem.
Aulas remotas, solução ou problema?
A UFSM possui estudantes de várias regiões do país, que no meio da pandemia se viram obrigados a retornar à suas respectivas cidades. Com isso, muitos não possuem condições de acompanharem estas aulas à distância, acessando o Moodle e E-mail.
O Diretório Central dos Estudantes (DCE) realizou um abaixo-assinado que conta com a assinatura de 5.583 pessoas até a escrita da reportagem, com a proposta do cancelamento do semestre, por conta de que ‘’boa parte dos professores nunca haviam utilizado esse tipo de dinâmica e nem mesmo foram capacitados para tal” Em uma publicação realizada na página do DCE, a maioria dos estudantes responderam que estão ‘’sofrendo um impacto emocional/psicológico negativo devido a pandemia, e muitos não estão conseguindo realizar as atividades do REDE por conta disso’’.
Apesar da garantia de recuperação para quem não participou destas aulas à distância, muitos alunos ficam com um “pé atrás”’ sobre como será realizada essa recuperação. Desde junho, coordenações de curso, departamentos, centros de ensino e reitorias têm realizado reuniões para discutir alternativas para o prosseguimento das aulas. No próximo dia 17 de julho, haverá reunião do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE), instância superior formada por representantes de todas unidades de ensino – docentes, discentes e técnicos administrativos e que deverá deliberar sobre a situação do REDE e encaminhamentos para o calendário acadêmico.
Reportagem: Bruno Lorenzi