Desde a suspensão do método presencial, a UFSM e as instituições privadas de ensino superior da cidade de Santa Maria se readaptam em meio à pandemia do COVID-19. Normativas, lives e publicações em redes sociais têm sido o canal de comunicação com os discentes. O futuro do semestre segue incerto e orientações garantem que ninguém será prejudicado, por outro lado, instituições privadas negociam com seus alunos o valor das próximas mensalidades.
Entre os dias 25 e 28 de maio, a equipe da .TXT realizou uma pesquisa, através do Google Docs, com estudantes das instituições de ensino superior da cidade. Participaram da pesquisa 63 alunos da Universidade Federal de Santa Maria (48,1%), 45 da Universidade Franciscana (34,4%) e outros 22 de demais instituições. Do total de 130 alunos, 93,1% são a favor do isolamento social como medida para evitar o contágio do coronavírus. Além disso, os dados apontam que 22,7% estão no grupo de risco da doença e 23,7% alunos conhecem alguém que teve COVID-19.
Com a pandemia do coronavírus, as instituições de ensino superior suspenderam suas atividades presenciais a partir do dia 16 de março, medida que já foi prorrogada novamente por conta do aumento de casos da doença no estado. No Rio Grande do Sul, o governo criou bandeiras para controlar o nível de risco das cidades, que partem da cor amarela (risco baixo) até a preta (risco altíssimo). No dia 13 de junho Santa Maria passou para a vermelha e voltou para a bandeira laranja três dias depois devido à disponibilidade de sete leitos. Até o dia 30 de junho, a cidade permanecia em bandeira laranja, que indica distanciamento controlado.
Por ser a maior Universidade da cidade, com cerca de 27 mil alunos matriculados na instituição, a aglomeração com a volta das aulas presenciais pode comprometer a segurança de todos, por outro lado, há dificuldade em realizar aulas via internet, pela questão de acesso e de aprendizagem dos alunos. Mesmo com os impasses, a UFSM tenta dar continuidade à suas atividades de pesquisa e extensão através de plataformas digitais. Diversos projetos e palestras fazem parte dessa tentativa, além de novas pesquisas e estudos feitos por grande parte das áreas e departamentos da Universidade sobre COVID-19. Entre eles: a Série online “Reflexões em tempos de pandemia”, do PPG Letras e a 1ª Jornada Multidisciplinar Online sobre o Enfrentamento do COVID-19.
Já em relação ao ensino, há divergências entre as práticas dos professores: há docentes que, desde o início da pandemia, não ofereceram a devida orientação dos conteúdos de maneira a distância; Entretanto, há professores que adotaram o REDE (Regime de Exercícios Domiciliares Especiais) e seguem as aulas via aplicativos de serviço de comunicação por vídeo, áudio e com uso de outras plataformas. O estudante de Ciências Biológicas, Franco Júnior, acredita que nem os alunos e nem os professores estão preparados para o método não presencial. “Não generalizo, mas a grande maioria não sabe e tem muita dificuldade, seja técnica, seja emocional”, destaca.
Os alunos em meio à pandemia
Além da problemática com os professores, os alunos também relatam problemas com a própria motivação de participar das aulas. É o caso de alguns alunos de Ciências Biológicas, como Franco Júnior, que não se sente motivado a estudar por acreditar que não recebe a devida qualificação do conteúdo. Ele explica que o entendimento da matéria de Botânica torna-se ainda mais difícil sem aulas práticas laboratoriais. Franco conta que optou por deixar “de molho” essa disciplina e recuperar depois. Já alunos de Química Industrial relatam que por fazerem um curso que em sua grande parte é prático, há dificuldade na continuação de disciplinas pela falta dos laboratórios, o que desmotiva o estudo da teoria.
Na pós-graduação, não é diferente. A doutoranda em Engenharia de Produção, Iliane Colpo explica que como o foco é a pesquisa, passaram a demorar mais por conta da falta de interação pessoal. “O número de alunos é bem reduzido para nós, o que faz com que tenhamos mais interação através de redes sociais, mas o que percebemos é que, a partir da experiência de semestres passados, o andamento está bem lento”.
Já em outros casos, há alunos que não têm acesso a uma boa internet. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua, um em cada quatro brasileiros não tinha acesso à internet em 2018. A UFSM, pública e diversificada, representa a divergência de renda do país a partir de seus alunos, além da vivência de alguns em diversos locais sem conexão. É importante destacar também alunos que mesmo na pandemia trabalham ou cuidam de problemas pessoais, como é o caso da caloura do curso de Desenho Industrial, Gabriela Pereira, que não consegue acompanhar as atividades do curso. “Meus pais estão com problemas pessoais, e eu acabo por ajudá-los com as demandas de casa e cuido da minha irmã. Como meu curso tem muita prática, estão sendo enviados trabalhos para continuarmos com o vínculo”, relata Gabriela.
Em nota oficial publicada no dia 5 de maio, o reitor da Universidade Federal de Santa Maria, Paulo Burmann, explicou: “Quando retomarmos a realidade, o semestre vai ser reorganizado, reestruturado e recuperado, não vamos deixar ninguém pelo caminho”. Mesmo com as justificativas, Franco Júnior acredita que o melhor meio é o cancelamento do semestre: “É a forma mais justa para aqueles que não conseguem acompanhar as aulas virtuais e que, a UFSM, por excelência, como sempre foi, deve priorizar o ensino de qualidade”.
O medo da volta às aulas
Com a dificuldade enfrentada durante a tentativa de seguimento das aulas, o futuro do semestre também preocupa os alunos. A estudante de Terapia Ocupacional, Eduarda Flores é do grupo de risco do COVID-19 e acredita que com a volta das aulas, os casos da doença aumentariam na cidade: “Como o HUSM está muito próximo, há grandes chances de contaminação dos alunos e perderíamos o controle da situação.”
A UFSM realiza alguns estudos para viabilizar o retorno, ainda sem data prevista. Segundo um destes estudos, a volta será gradual, com 30% dos alunos na primeira semana de previsão de retorno, 60% na segunda e volta geral na terceira semana após estabilidade. Analisa-se, ainda, como será os preparos de limpeza, atendimento ampliado do Restaurante Universitário, limite de capacidade da Biblioteca Central e Setorial, além do fluxo e periodicidade do acesso de transportes coletivos ao campus limitado. Mesmo com os comunicados, Eduarda desacredita que tais ações tenham grande efetivação. “Acho que mesmo assim, a UFSM não conseguiria reduzir as aglomerações”, explica a estudante.
A UFSM na linha de frente do combate do COVID-19
Embora o futuro das atividades acadêmicas e administrativas seja incerto, a Universidade promove ações na luta contra o novo coronavírus. A UFSM campus de Santa Maria e Palmeira das Missões, no dia 3 de junho, assinou o Termo de Cooperação com o Estado do Rio Grande do Sul para firmar parceria já existente, segundo informações postadas pelo Gabinete do Reitor. Apenas no primeiro mês de atuação, a UFSM e o HUSM (Hospital Universitário de Santa Maria) realizaram mais de 1500 testes para diagnósticos da doença.
A UFSM também disponibiliza em seu site o “Observatório de Informações em Saúde” , uma base de dados atualizada diariamente sobre a situação da COVID-19. Nele, estão contidas informações sobre o número de casos confirmados, número de óbitos, além de gráficos e projeções referente a faixa etária, sexo, distribuição por bairros, entre outras.
A situação da Universidade Franciscana
A volta das aulas presenciais e a segurança dos acadêmicos também são questões recorrentes da segunda maior universidade de Santa Maria, a UFN. “As áreas comuns como a área externa e a cantina que os alunos costumam se aglomerar”, comenta a estudante da Universidade, Larissa Teixeira Weber. Através de um comunicado oficial realizado em 30/05, a UFN instruiu os alunos sobre a continuidade do semestre. Segundo a Pró-reitora Acadêmica, Vanilde Bisognin, as atividades teóricas tendem a continuar remotamente, enquanto as práticas devem ser organizadas pela coordenação de cada curso e efetivadas de volta gradual. “Vamos nos preparar para esse retorno prioritariamente dos formandos de todos os cursos, e posteriormente vamos analisar como está sendo esse retorno”, comenta.
A estudante de Odontologia, Gabriela de Araújo, conta que os atendimentos práticos no seu curso iriam voltar gradualmente no dia 15 de junho, mas foram cancelados devido ao aumento no número de casos e de óbitos pela doença. Para os alunos da instituição, as aulas teóricas e avaliações seguem normalmente por internet. Porém, uma preocupação que atinge os alunos e administradores da Universidade é a questão da mensalidade. Na semana do dia 26 de maio, alunos de diversos cursos da UFN se mobilizaram pedindo esclarecimento da Universidade sobre a mensalidade, através do Instagram. A manifestação ocorreu por uma publicação do perfil do Conselho dos Diretórios Acadêmicos da Universidade Franciscana, no qual, foram feitas diversas marcações da conta oficial da UFN.
Como respostas obtidas, algumas observações feitas pelo relatório da reunião entre o Conselho de Diretórios e a Reitora, Pró-reitorias e Setor Jurídico da UFN, foram que não serão cobradas aulas que utilizarão de dois ou mais meses para recuperação das práticas e será dado desconto de 10% no mês de julho para quem realizar o pagamento em dia, explicações não satisfatórias para os universitários.
Há reconhecimento em relação ao esforço, dedicação e assistência aos alunos por parte dos professores que realizam as aulas remotas. Por outro lado, há grande aborrecimento perante a instituição enquanto meio comercial, como relata a estudante Thaíse Saldanha Migotto: “Os meus professores se esforçam para oferecer o melhor, mesmo assim a instituição não oferece esse preparo”. Outros alunos reclamaram que a instituição teve redução de gastos como água e luz, mas não repassaram esse desconto na mensalidade, além disso, muitos relatos afirmaram que a UFN, enquanto meio comercial, não se importa com os alunos.
Demais faculdades de Santa Maria
A situação das demais instituições de ensino superior de Santa Maria não difere das comunicadas pela Universidade Federal de Santa Maria e Universidade Franciscana. A FADISMA (Faculdade de Direito de Santa Maria) publicou em seus comunicados oficiais informações que seguem as mesmas linhas dispostas pelas recomendações da OMS e das Portarias do MEC. A Faculdade continua todas as suas atividades através do ambiente virtual de ensino e aprendizagem próprio, “o calendário acadêmico segue sem sofrer quaisquer alterações, bem como a carga horária das disciplinas e respectivos horários de aulas”.
Na última nota oficial, Walter Chalegre dos Santos, diretora da FMC (Faculdade Metodista Centenário), reconheceu a cooperação da comunidade acadêmica que se adapta ao novo método, e complementa: “Neste momento, não temos como estimar a data para o retorno total das atividades presenciais da Faculdade Metodista Centenário. As análises sobre o impacto da pandemia nas operações acadêmicas são realizadas a cada nova semana”. Outras faculdades privadas da cidade como a ULBRA (Universidade Luterana do Brasil), FAPAS (Faculdade Palotina) e FISMA (Faculdade Integrada de Santa Maria), seguem com as atividades presenciais sendo prorrogadas, conforme recomendações da OMS e situação do estado do Rio Grande do Sul e da cidade de Santa Maria.
Reportagem: Paula Appolinario e Vitor Zuccolo