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O adeus ao Campus



Eles estão indo embora da UFSM. Mas não são formandos

Reportagem: Leonardo Catto – Fotografia: Beatriz Couto;

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UMA PORTA SE FECHOU

Dos 43 anos de vida de Roberta*, seis ela passou na UFSM. Esse tempo, por vezes, é a duração de uma graduação. No entanto, Roberta não é estudante. Os seis anos que ficou na Universidade foi o tempo de trabalho como funcionária terceirizada nas portarias de três diferentes prédios. Hoje, ela já deixou a UFSM, assim como outros 185 funcionários, nos meses de abril e maio de 2017, que receberam aviso prévio da empresa Sulclean e Sulclean Segurança, no caso dos vigilantes.

Apesar de o desemprego ser uma realidade, ela lida com isso de forma tranquila e compreende a situação das demissões. “Justo não é porque quantas famílias dependem só de uma renda? Mas também não tem o que fazer. Eu compreendo, por um lado, se o governo não repassa, como vão segurar um monte de gente que não tem como pagar? Chega uma hora que a firma vai falir”, conclui.

Roberta aponta que um dos fatores que a mantém tranquila é o fato de seu marido não ter sido demitido. Ela ainda trabalha como terceirizado na UFSM e isso garante a renda da família, composta pelo casal e uma filha de três anos. Mas ela destaca que depender apenas de um salário é mais complicado, por isso acredita que sustentar a casa também depende dela. Além disso, a tranquilidade não é capaz de apagar a tristeza: “A gente se dedica, né? Põe a camiseta, como dizem. Nunca faltei por bobagem, sempre trabalhei tudo direitinho, mas aí chegou o aviso”.

Quando questionada se teria reclamações sobre seu emprego, afirma que era um “trabalho bom, satisfatório, bem tranquilo”. Inclusive fala, em tom orgulhoso, que cumpria seu turno de 12 horas dia sim, dia não. Confessa, todavia, que “era puxado e bem estressante” trabalhar todo esse tempo, chegar em casa, dar atenção à filha pequena e ainda lidar com a vida social. No momento em que cumpria o aviso prévio, sua filha já ia à escolinha, o que tornava a sua rotina mais fácil, segundo Roberta.

Ainda sem planos imediatos, a sua certeza é que precisa procurar outro emprego. Com ensino médio completo, reconhece que a situação não é fácil por haver também muitas outras pessoas na mesma situação que ela. “Vai ser muita gente despedida”, pondera, inclusive, que o número de terceirizados demitidos se juntará ao número de pessoas já desempregadas.

Por enquanto, terá um tempo para descanso e reflexão sobre seu futuro profissional, além de exercer um dos passatempos que a acompanhava no tempo livre do serviço: a leitura. Com apreço por romances, livros sobre espiritualidade e autores como Augusto Cury, Roberta afirma que pretende manter o hábito, ainda mais enquanto procura um novo trabalho. “E dar atenção para minha filha”, complementa.

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UM FUTURO SEM SEGURANÇA

“Trabalho porque preciso e gosto. Se vier sem ter amor à profissão, nem vem, né?”, é o que diz Danilo*, 51 anos, sobre seu emprego como vigilante na UFSM. Era um dos funcionários mais antigos na empresa. Além disso, por ter o pai que também trabalhou na Universidade, tinha o Campus quase como uma segunda casa. Receber o aviso prévio foi como se recebesse um aviso que o obrigava a deixar seu lar.

No entanto, seu Danilo não vai desesperadamente se lançar às páginas de classificados dos jornais para procurar um novo emprego. Na sua fala mansa, diz que não descarta mudar totalmente em relação ao antigo emprego, “Vou esperar um tempo. Se aparecer um serviço de imediato, vou trabalhar na mesma área. Se não aparecer na minha área, eu vou procurar outro tipo de emprego”.  E é enfático ao explicar que não ficará apenas descansando. “Não é que eu pretenda tirar um tempo, eu vou esperar mesmo”. Conta também que já costumava fazer “bicos” de pintor e pedreiro quando surgia uma oportunidade, o que acabava por complementar a renda.

A família, composta pela esposa e duas filhas, não depende exclusivamente do dinheiro ganho por seu Danilo. Contudo, é consenso entre eles que ficará mais complicado enquanto o patriarca estiver desempregado. “Minha filha mais velha tem emprego, a caçula está no ensino médio, e a esposa também trabalha. Só que apenas com os salários delas, a gente não consegue bater as despesas da casa”, lamenta Danilo. Quando questionado sobre a disponibilidade de tempo para ficar com a família mesmo com tantas tarefas, Danilo responde com naturalidade: “hoje em dia não existe mais isso”. Ainda fala que se acostumou a ver menos a família.

A serenidade de Danilo, diferentemente de Roberta, não se mantém ao falar sobre a onda de avisos prévios e demissões dos terceirizados. Para ele, quem errou foi a UFSM. “Eu acho que é falta de administração da Universidade, porque eles poderiam cortar em outras áreas. Tem muitas obras em andamento que nem estão sendo usadas e nem vão ser agora. Poderiam fazer diferente”, afirma de modo efusivo, contudo, sem levantar o tom manso da voz.

O novo sistema de segurança – que, além do limite orçamentário, foi um dos motivos do cancelamento de mais de 66 postos de vigilância por parte da UFSM – é outra mudança que também deixa seu Danilo insatisfeito. Com a propriedade de quem trabalhou quase uma década no ramo, ele critica. “Sem a nossa vigilância, vai ficar difícil aqui dentro. A Universidade é muito grande, então vários pontos vão ficar sem vigilância física. Ampliaram o número de câmeras, mas não tem como ser só o monitoramento. Não é como uma pessoa que está presente”.

Seu Danilo aparenta acreditar que o trabalho dignifica. Não deixa de destacar, todavia, o outro lado do seu serviço. “Conhecemos muita gente, criamos amizades. Estudantes, inclusive. Muitos não gostam, mas muitos gostam, porque se sentem protegidos às vezes, né?”. Entretanto, após seu aviso prévio, essas amizades ficarão para trás.

*Os nomes foram alterados para preservar a identidade dos funcionários

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PRA explica relação da Universidade com terceirizados

Para entender como funciona o serviço terceirizado na UFSM, qual o papel da Universidade nas demissões e como ficaram os serviços a partir de agora, conversamos com o pró-reitor de administração José Carlos Segalla.


.txt – Qual é o papel da UFSM no caso das demissões dos terceirizados?

 Pró-Reitoria de Administração A UFSM tem licitações para contratar postos de trabalho, postos de segurança, portaria, manutenção, recepcionistas, limpeza por metro quadrado. O governo já não contrata mais esses serviços, através do Decreto nº2.271 de 1997*, que permite, então, que sejam contratados funcionários terceirizados na forma de postos de trabalho ou na forma de serviço.

A Universidade faz uma revisão e racionalização desses contratos no sentido de viabilizar o seu funcionamento diante das restrições orçamentárias. Estamos trabalhando no ajuste dos postos de trabalho. Reduzimos postos, mas não trabalhamos com demissões de pessoas. Nós fizemos licitações para contratar os postos. Obviamente que, havendo uma redução desses serviços, implicará que o fornecedor terá que fazer um ajuste na sua empresa também. Então provavelmente, ocorram demissões.


.txt – Como funcionará os serviços de limpeza, portaria e vigilância a partir de agora?

PRA – Estamos fazendo os ajustes nas metragens quadradas de limpeza e de frequência. Uma otimização da necessidade de limpeza por metro quadrado, já que tem áreas específicas que requerem mais limpeza e outras que requerem menos. Uma redução de postos, adequada ao tamanho da Universidade, que vem crescendo. Mas tendo em mente o orçamento restrito. É um trabalho em conjunto com todas as unidades de ensino, tem sido amplamente discutido.

Quanto às portarias, houve uma diminuição. Nós reduzimos mais de 10 portarias, tivemos que ajustar; e aumentamos mais algumas, mas ficou em média uma redução de 10 do total que se tinha. Conjuntos que tinham uma portaria em cada prédio passaram a ter uma portaria única. Se pegava chave de sala em cada portaria, agora pega só em uma.

O monitoramento ocorre em conjunto com a vigilância física, o que reduz os custos, já que reduz os postos de vigilância. Há uma sala de monitoramento, onde tudo é configurado de acordo com as necessidades relatadas por cada unidade de ensino: horário de acesso; qual a restrição de circulação na área; quais são os pontos fracos do prédio para que as câmeras façam o monitoramento permanentemente e indiquem os problemas para a transmissão a um posto que atenda a situação mais rápido possível. As câmeras verificam o número de pessoas que estão circulando nos lugares de passeio público e transmitem a informação para o setor de monitoramento.


.txt – A empresa de monitoramento é a mesma que já fornece postos de segurança para a UFSM?

PRA – Não. A empresa de monitoramento é a Vigillare Segurança. E a empresa de posto de trabalho físico é a Sulclean Segurança. São empresas distintas, mas que trabalham em conjunto.


.txt – A terceirização da cozinha do RU II é diferente da terceirização dos outros funcionários dos Restaurantes Universitários?

PRA – Sim, tem o fornecimento externo. Vem a refeição pronta. Nós contratamos a refeição. Servir é pelo RU, mas o fazer não. Está sendo feita uma cozinha, ampliada, o que vai levar um tempo, e depois será visto como ficará essa situação.


.txt – Já houve ou haverá mais cancelamentos de serviços, no Restaurante Universitário, por exemplo?

PRA – Tratando-se do Restaurante Universitário, nós fizemos alguns ajustes. Até porque o RU II está com fornecimento de refeições que é contratado externamente pela falta de capacidade da cozinha devido ao volume de refeições que estão sendo servidas. A cozinha esgotou sua capacidade. Então terceirizamos e contratamos externamente, o que diminui postos de trabalho terceirizados do RU (copeiros, cozinheiros, lavadores).


.txt – Já existiram serviços de vigilância, limpeza e portaria não terceirizados na UFSM? Eles seriam viáveis hoje?

PRA – São serviços que deixaram de ser ofertadas pelo Governo Federal a partir da Lei 8.112**, então não se faz mais concursos para essas categorias. O governo vem extinguindo essas categorias, e ficam os remanescentes. Por exemplo, nós ainda temos alguns vigilantes do quadro, mas – conforme se aposentam – não é mais permitido concurso para vigilância.

Nós não temos um estudo concreto disso. Existe um plano de cargos e salários, que é do Governo Federal. E existe uma licitação, por parte do governo, uma regulação dos preços dos postos, em que eles são divididos em “montante A” e “montante B”, sendo o primeiro relativo a questões sindicais (salário base e obrigações trabalhistas) e o segundo, administração e tudo mais. A partir disso, se dá a diferença de preço um fornecedor [serviço federal] para outro [serviço terceirizado]. Mas nós não temos um estudo apurado de quanto representaria se fosse [apenas] do quadro, e qual seria a implicação em relação a diferença para mais ou para menos quanto aos contratos existentes.


*O Decreto 2.271 de 7 de Julho de 1997 permite sobre a contratação de serviços terceirizados pela Administração Pública, desde que não sejam a função fim do órgão público: “[…] poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.” (Art. 1º).

**A Lei 8.112 institui o Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União e afirma como servidor a pessoa legalmente investida em cargo público. “Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor.” (Art. 3º).

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