No início do mês de setembro, às margens da BR-386, em Frederico Westphalen, uma cadelinha vira-lata chamada Bolinha foi encontrada em uma situação delicada: cercada por cães e com as patas traseiras fraturadas. Resgatada por um morador da comunidade, Bolinha foi levada para o Castramóvel, onde recebeu cuidados da veterinária e responsável técnica Magali Inês Piaia. O projeto, recém-implantado na cidade, oferece castrações e atendimentos acessíveis. Agora, Bolinha segue em recuperação, enfrentando o caminho para restabelecer sua saúde física e superar os traumas vividos.
Muitos animais se encontram na mesma situação de Bolinha. O índice de abandono de animais no Brasil, atualmente, é de cerca de 30 milhões de cães e gatos, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Isso causa problemas de controle populacional de animais e de saúde pública nas cidades, com a proliferação de zoonoses (doenças transmitidas por animais), devido à superpopulação de pets abandonados.
A cidade de Frederico Westphalen agora conta com um serviço voltado ao bem-estar animal e ao controle populacional de cães e gatos. No dia 17 de julho de 2024, o Castramóvel começou suas atividades, em resposta aos pedidos da comunidade frederiquense. A iniciativa foi viabilizada pela equipe da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Semma), que atendeu às demandas dos moradores por um serviço acessível de castração.
A HISTÓRIA QUE ANTECEDE A INICIATIVA
Foi assinado em 2011, no município de Frederico Westphalen, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), o qual estabelecia que deveriam ser feitas, pelo menos, 20 castrações semanais com recursos municipais. Em uma pequena sala de castração localizada no prédio da antiga prefeitura municipal, eram castrados animais abandonados.
Com o decorrer do tempo e devido ao aumento de pedidos da população, no final de 2023, o município recebeu recursos da emenda parlamentar do deputado Giovani Cherini, para a construção de um Castramóvel, uma sala de cirurgia sobre rodas. Apesar do nome, o Castramóvel tem endereço fixo na Rua José Cañellas, 184, centro. O serviço é oferecido para cães e gatos, com o objetivo de atender principalmente famílias que não têm condições de acessar clínicas veterinárias particulares.
COMO FUNCIONA
Em julho de 2024, o projeto iniciou, castrando, em média, 68 animais por mês. O Castramóvel em conjunto com o Consultório Veterinário Municipal segue as leis responsáveis pelas unidades móveis de castração no Rio Grande do Sul. Segundo a lei 15.4515 de 2019, as castrações devem ser gratuitas e oferecidas à comunidade de tutores com renda até três salários mínimos, a partir de cadastro. Tutores que atendem esses requisitos podem levar seu animal resgatado ou adotado para a castração. Animais comprados não têm direito ao procedimento de castração gratuito.
A lei também inclui o atendimento de animais de ONGs e de protetores independentes (termo usado para criadores de animais resgatados que disponibilizam um lar provisório para que possam ser adotados) cadastrados junto à prefeitura, bem como de animais abandonados na rua. Para atendimento e castrações, a prefeitura convocou as veterinárias Luciane Dal Piva e a própria Magali. As cirurgias ocorrem de segunda a sexta, das 8h às 12h e das 13h30min às 17h30min.
O Castramóvel conta com o apoio da equipe da Semma, coordenada pelo Secretário Municipal do Meio Ambiente, Ricardo Giovenardi, e parcerias com protetores independentes. Desde o início da unidade de castração, são castrados cinco animais por dia. Magali salienta que, caso o animal precise de acompanhamento pós-cirúrgico, basta fazer agendamento prévio, a não ser em casos urgentes, nos quais são feitas consultas ou cirurgias de emergência.
O ABANDONO
A questão crítica do abandono de animais traz consequências graves para a saúde pública e para o bem-estar animal. Quando duas gatas são deixadas sem controle de natalidade, por exemplo, e cada uma tem oito filhotes por ano, em apenas sete anos elas podem ser progenitoras de até 174.764 felinos. Se essa reprodução descontrolada continuar, com cada fêmea gerando oito filhotes anualmente, a população poderá atingir impressionantes 781.250 gatos vivendo nas ruas, conforme estudos publicados na revista Em Extensão da Universidade Rural do Rio de Janeiro, em 2013. Esse crescimento exponencial seria um possível resultado da falta de políticas efetivas de controle populacional animal, como programas de castração acessíveis e conscientização sobre a guarda responsável.
O aumento descontrolado de animais abandonados gera inúmeros problemas, desde o sofrimento dos próprios animais, que enfrentam fome, doenças e maus-tratos, até questões de saúde pública, como a disseminação de zoonoses e acidentes de trânsito. Além disso, abrigos e protetores de animais acabam sobrecarregados, sem recursos suficientes para acolher e cuidar de todos os animais necessitados.
Investir em castramóveis é uma solução para lidar com o abandono de animais e os problemas decorrentes disso. Sobre a importância da iniciativa na cidade, Magali lembra: “São 32 anos que eu trabalho no município, e o que mais impactou na minha vida mesmo foi a maldade do ser humano. Desse abandono, desses maus-tratos, de todas essas coisas. Mas a gente está aqui pra fazer o melhor que a gente pode. E agora o Castramóvel está ajudando todos os bichinhos”.
Texto escrito por Marina Lima e Marina Ramos