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Sobre duas rodas



A história de três ciclistas do interior do Rio Grande do Sul que fizeram do esporte um estilo de vida.

Texto e foto: Melissa Cristina Cardoso dos Santos

Seja em estradas pavimentadas ou em trilhas desafiadoras, sob o brilho intenso do sol ou entre as gotas de chuva, o único elemento essencial para a prática de um dos principais esportes do mundo é a bicicleta. Muito mais que um meio de transporte, é o coração dos amantes do ciclismo, um esporte que engloba pessoas de todas as idades e culturas, une comunidades e promove um estilo de vida saudável.

Quanto uma pessoa precisa doar de si mesma para transformar sua saúde? Começar a praticar exercícios físicos não é uma tarefa fácil, exige muita determinação e é essencial a criação de um hábito. Zulmir Pegoraro, gerente financeiro, 40 anos, já chegou a pesar 149 quilos. Quando enfrentava problemas de saúde, por indicação de um amigo, aceitou um desafio de exercícios. Foi então que decidiu pedalar. Começou a ter mais cuidado com a saúde, treinou, evoluiu e decidiu participar de competições: “O meu principal objetivo é me manter com saúde. Isso me despertou o amor, a paixão pela bicicleta”, conta.

Um estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento e Ministério do Desenvolvimento Regional sobre mobilidade urbana mostrou que 26% dos entrevistados pedalam por preocupação com a saúde, assim como Zulmir, que sobre duas rodas, conseguiu mudar sua vida. 

O cicloturismo representa o início da jornada de muitos ciclistas, onde o objetivo principal é explorar novos lugares utilizando uma bicicleta como meio de transporte. Assim foi o início de Zulmir em competições, já no ano seguinte. “Todo mundo passa por aí. Primeiro se faz o cicloturismo, um passeio. Lá tem seus pontos com água, Coca-Cola, paçoquinha, enfim. É uma modalidade sem competir, você começa por aí e depois vai melhorando”.

Determinado a conseguir um bom desempenho nas competições, Zulmir desenvolveu sua preparação. “Eu falho geralmente dois dias: segunda e sexta. Treino terça, quarta, quinta, sábado e domingo. A gente também tem a questão da suplementação, da alimentação. Na semana pré-provas, ingerir mais carboidratos, se hidratar bem. Tem a parte da musculação também, mas é mais para fortalecimento de alguns músculos”, conta.

A paixão pelo esporte

Desde pequena, a professora Marceli Pazini Milani, 40 anos, do curso de medicina veterinária do Instituto Federal Farroupilha (IFFar) de Frederico Westphalen, sempre foi apaixonada por esportes. Sua primeira bicicleta veio ainda na infância, aos sete anos de idade. Foi em Rodeio Bonito, uma pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul. Lá ela nasceu, cresceu e começou a pedalar. Usava a bicicleta para lazer e como meio de transporte. Aos 18 anos, quando ingressou na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) para estudar, deixou a bicicleta de lado.

Mas afinal, o que é necessário para praticar o ciclismo? A resposta pode parecer simples: uma bicicleta. Mas não é só isso. Marceli viu-se temporariamente afastada do esporte. “Fiquei um tempo da minha vida sem pedalar. A gente fica muito focado em estudar, tem aquela pressão, então praticamente parei com o esporte e fez muita falta, se eu pudesse ter continuado a praticar teria sido bom”, diz.

Mesmo sem ter muito tempo livre, Marceli percebeu que poderia pedalar. Passou no concurso e com seu primeiro salário, comprou uma bicicleta. Ela descobriu um grupo de ciclistas da cidade e viu que aquilo poderia ser mais que uma atividade de lazer. “Lá comecei a pedalar já como um esporte mesmo. Pensando em melhorar, performar, no tipo de bicicleta, em cuidar da alimentação, treinar”, comenta Marceli.

Marceli destaca a importância que a UFSM tem em sua trajetória. Mais que um lugar de estudos, a UFSM foi o local onde ela participou de sua primeira experiência em uma competição de ciclismo. A largada ocorreu em frente ao prédio de Educação Física, dando início ao circuito formado no campus universitário. Ainda inexperiente, Marceli descobriu um truque do esporte. “Eu não tinha tática nenhuma. Chegou uma certa altura, perto da chegada, que eu tava alcançando as gurias mais velhas e uma chegou para conversar comigo, foi aí que me liguei que ela deveria estar tentando se recuperar e não me deixar ir, ela descansou, me largou e chegou na minha frente. Depois dessa prova eu me liguei que tem tática e não dá pra ficar conversando”.

Apaixonada pelo esporte, lutou para manter o ciclismo em sua vida. Apesar das exigências intensas da pós-graduação, mestrado e doutorado, ela encontrou tempo para pedalar. Além dos compromissos acadêmicos, Marceli também assumiu o desafio da maternidade duas vezes, mas determinada, nunca abandonou a bicicleta.

O ciclismo também é importante na vida da professora de taekwondo Ruti dos Reis Pereira, XX anos, que sempre amou praticar esportes. Começou pedalando duas, três vezes na semana. Então, decidiu que queria evoluir. Participou de provas de 200km e 300km, no interior do Rio Grande do Sul, e descobriu que havia professores, treinos e orientações que permitiriam um crescimento pessoal. Os treinos aumentaram, outras competições surgiram e ela decidiu comprar uma bicicleta. Na loja, foi convidada pelo dono a fazer parte de uma equipe do Rio Grande do Sul e em 2023 competiu em todas as provas como estreante.

Em 2024, foi convidada a participar de uma equipe de Santa Catarina, a Ciclismo Rio do Sul, e competir em provas catarinenses: “Está sendo uma experiência muito única, porque a competição tem atletas de alto nível. Então, estou tendo várias experiências muito bacanas que acredito que vão contribuir muito para minha vida nesse esporte”, relata. 

Ruti introduziu o ciclismo em sua vida aproveitando momentos oportunos, com uma abordagem flexível que permitiu que ela desfrutasse do esporte sem interferir nas demandas de sua vida cotidiana. “Eu comecei pedalando no Mountain Bike, ia com as amigas aqui na região e depois eu participava das provas que tinha aqui na nossa cidade ou em cidades vizinhas, mas eu não participava certinho do circuito, participava quando realmente dava oportunidade”.

O empenho e o comprometimento de Ruti geraram resultados positivos que marcaram sua trajetória. Ruti treina diariamente e segue a planilha estipulada por seu professor. “Tem semanas que são bem volumosas, que dá vinte, vinte e duas horas da semana. Tem semanas que são menos horas, dá catorze, quinze, mas a intensidade aumenta”.

Em 2023, ela se desafiou a participar de uma prova em Bento Gonçalves/RS. “Eu consegui completar aquela prova, consegui chegar também com as meninas da frente e isso me marcou bastante porque eu vi que todo o meu esforço, toda a minha dedicação realmente estava tendo resultado”, conta. 

Ao falar sobre seus objetivos no ciclismo, Ruti ressalta a importância do esporte para a saúde: “Eu só pratico ciclismo porque faz bem para o meu corpo e para a minha mente. Acho que quanto mais eu me sinto bem, mais eu quero praticar. Com isso eu consigo me desenvolver para ir bem nas provas. Acho que se torna um ciclo”, reflete.

A comunidade

Pedalada após pedalada, o ciclismo não apenas apresenta destinos variados, mas também ensina importantes lições. É mais do que um esporte ou um estilo de vida, é também uma forma de unir as pessoas. “O ciclismo tá na minha rotina pela qualidade de vida, pelo bem que ele me faz, pelas amizades que ele me traz. Nossa, conheci muita gente!”, compartilha Marceli.

Orgulhoso, Zulmir falou sobre o grupo que participa. “Nós iniciamos o grupo em 2021. Surgiu de amigos que saíam pra treinar, se encontravam de manhã cedo nos treinos. Hoje o grupo conta com setenta integrantes e o principal do grupo são as ações sociais. A gente não busca valores para ter caixa no grupo. A gente busca valores para poder ajudar”.

E o esporte está cada vez mais presente no país. A pesquisa “Ciclismo ao Redor do Mundo”, realizada em 2021 pelo Autotempo, revela que 28% dos brasileiros utilizam a bicicleta pelo menos uma vez por semana. Há também aplicativos que promovem a união dos praticantes por meio de desafios e compartilhamentos de fotos e de pedaladas. O Strava, por exemplo, conta com 120 milhões de usuários no mundo. Em seu mais recente relatório, mostra que o ciclismo foi o esporte mais praticado no Brasil em 2023.

FREDERICO WESTPHALEN, RS

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