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Sonhos subsidiados



Auxílios e benefícios nas universidades públicas garantem acesso e permanência a estudantes de baixa renda

Texto e foto: Júlia Pattoli

 

“Se não fossem os auxílios, talvez eu não estaria aqui estudando”. A frase é de Kellin Andriguetto, 21 anos, estudante de Engenharia Florestal na UFSM (Universidade Federal de Santa Maria) campus Frederico Westphalen. Kellin, assim como 70% dos universitários do país, possui uma renda mensal abaixo de um salário mínimo e meio per capita, fator econômico que, além de lhe garantir vagas dentro do sistema de cotas, também lhe garante acesso a uma série de benefícios e subsídios oferecidos pelas universidades públicas. Werik Furtado, 23 anos, estudante de Sistemas de Informação na UFSM campus Frederico Westphalen, é um dos demais jovens representados pelas estatísticas. Apesar de terem histórias de vida e origens diferentes, ambos escolheram seguir o caminho dos estudos para que possam vislumbrar um futuro na profissão que almejam seguir.

 

Início dos Estudos

 

Kellin é natural de Santo Augusto, cidade gaúcha a aproximadamente 90 km da universidade. Apesar da considerável proximidade com o município natal, ela só obteve conhecimento sobre o campus quando começou a pesquisar sobre instituições que ofereciam graduação em Engenharia Florestal, curso que sempre foi seu sonho. Após aplicar sua nota no SISU, sistema responsável por agrupar e distribuir vagas em mais de 125 instituições públicas do país, e ser aprovada, Kellin se deparou com uma questão que fugia de seu controle. “O que pesava era a questão do dinheiro. Eu ia ter como me manter aqui?”. Esse receio foi diminuído ainda durante o processo de matrícula, quando ela e a família tiveram conhecimento sobre os benefícios e subsídios que a universidade oferece aos alunos de baixa renda: “Porque na minha cabeça eu ia ter que estudar e trabalhar para conseguir me sustentar, mas como eu descobri que tinham todos esses auxílios, já fiquei mais tranquila com essa questão.”

Werick Furtado, nascido e criado em Lorena, cidade do interior de São Paulo, possui um ponto de partida similar ao de Kellin: “Eu escolhi aqui por achar que o custo de vida era um pouco mais barato por ser uma cidade pequena.” Para muitos estudantes brasileiros, as inseguranças quanto às questões econômicas surgem quase que em sintonia com a sensação de felicidade de serem classificados no vestibular. A trajetória de Werick começou ainda em Lorena, quando passou a vender paçocas a fim de arrecadar dinheiro para se deslocar até o campus de Frederico Westphalen e poder dar continuidade à graduação.

Esses pensamentos espelham o que mais de 40% dos universitários brasileiros vivem. Dividir a rotina entre estudos e trabalho muitas vezes se torna cansativo ou até mesmo inviável, como em casos em que a graduação demanda tempo integral. Por isso, a existência de bolsas de ensino e auxílios não só garantem que grande parte da sociedade possa ter acesso à educação de qualidade, mas também funcionam como uma forma de possibilitar que essas pessoas possam se dedicar exclusivamente aos estudos.

Desafios e Auxílios

Durante o ano de caloura, em 2019, Kellin Andriguetto morou em uma pensão, tipo de moradia que oferece quartos privados e áreas comuns, como cozinha e banheiro, compartilhadas e por um preço acessível. Esse custo de aluguel era inteirado pela universidade por meio do Auxílio-Moradia, que oferece aos alunos com BSE (Benefício Socioeconômico) ativo a quantia de 400 reais mensais. Para ter direito a esse benefício, Kellin teve que apresentar uma série de documentos que comprovaram que a renda mensal de sua família não passava de um salário mínimo e meio per capita. Essa comprovação deu a ela o direito de acesso a uma série de outros auxílios, como o Alimentação, que lhe dá o direito de se alimentar de maneira gratuita no RU (Restaurante Universitário), e Material Pedagógico, que custeia aos estudantes uma série de materiais a serem utilizados para fins acadêmicos.

Esses auxílios foram responsáveis por garantir a Kellin uma certa sensação de concretude durante o primeiro ano de faculdade. E fizeram com que ela pudesse se sentir segura para continuar os estudos. No início do ano seguinte, em 2020, ela se deparou com uma situação que fugia de seu controle e que poderia afetar sua permanência na universidade: a pandemia de COVID-19, na época ainda considerada uma epidemia, foi o fator responsável por fazer com que ela passasse a dividir seu tempo entre idas e vindas da casa de seus pais para a universidade. Em seus períodos longe de Santo Augusto, Kellin dedicava o tempo para produzir ciência, já que, assim como em muitas outras universidades públicas, a UFSM também manteve algumas pesquisas ativas durante a pandemia.

Essa adesão de Kellin à produção científica é um dos fatores que refletem na estimativa de que mais de 95% das pesquisas feitas no Brasil passam pelas mãos de jovens, que, assim como Kellin, não teriam condições de concluir seus estudos se não fossem assistidos pelos Núcleos de Assistência Estudantil de suas universidades. O engajamento científico também deu a ela a oportunidade de se tornar bolsista no PET (Programa de Educação Tutorial). Inicialmente, o valor estipulado para a bolsa era de R$ 400,00, mas com um novo orçamento em vigência, esse valor passou a ser de R$ 700,00 mensais, o que garantiu a Kellin um certo conforto após o período pandêmico.

Mesmo podendo contar com o valor dessa bolsa, Kellin não se sentia 100% segura quanto à manutenção do auxílio-moradia. “O governo estava querendo cortar gastos, então eu achei que ia perder o auxílio moradia. Aí eu decidi me candidatar para morar na CEU, porque aí pelo menos não preciso do auxílio, né?”. Essa insegurança não era infundada, pois em 2021 o orçamento destinado ao Ministério da Educação sofreu uma redução de cerca de 30%​, o que poderia causar uma série de carências nos repasses destinados às políticas de permanência. 

Evasão e Permanência

A evasão no ensino superior brasileiro é um desafio contínuo. Segundo o Semesp (Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior), a taxa de evasão no ensino superior alcançou 57% em 2023​​. Essa alta taxa reflete a precariedade de muitas instituições e a dificuldade que muitos estudantes enfrentam para conciliar estudos e trabalho. Entre os fatores que mais contribuem para a evasão estão a necessidade de trabalhar para sustentar a família e a falta de apoio financeiro adequado durante o período acadêmico. 

Um estudo realizado pela UFSM em 2023 mostra que a evasão está diretamente relacionada a fatores econômicos. Por isso, estudantes com renda familiar baixa ou sem apoio financeiro têm maior probabilidade de abandonar os estudos. Aqueles com renda individual ou familiar abaixo de um salário mínimo e meio per capita, como os beneficiários do BSE (Benefício Socioeconômico), são os mais vulneráveis a essa realidade e os que se apresentam em maior número quando analisamos as características socioeconômicas por trás das evasões.    

Porém, para além apenas de evitar a evasão e visar a permanência dos estudantes nas universidades, algumas iniciativas funcionam de maneira a encorajar os acadêmicos a buscarem conhecimentos para além da sala de aula. Na UFSM existem diversas possibilidades que funcionam como meios de manter os alunos interessados e envolvidos com seus cursos e futuras profissões. A mobilidade acadêmica internacional é uma dessas possibilidades que encorajam os alunos a buscarem qualificações e por consequência se manterem ativos durante a graduação, evitando assim que eles se desinteressem ou que desistam dos cursos por falta de perspectiva na área.

Kellin faz parte do grupo de estudantes que buscam ampliar seus conhecimentos por meio de intercâmbios. No primeiro semestre de 2023, ela embarcou rumo à Argentina, com o auxílio de mil reais recebido da UFSM e com a garantia de que a universidade destino iria custear sua estada lá, oferecendo-lhe moradia e comida. “Todo mundo foi muito prestativo, se eu precisasse de alguma coisa, eles estavam lá dispostos a me ajudar para o que fosse, por isso que consegui ir”.

As histórias de Kellin e Werick se entrelaçam com as de milhares de brasileiros que buscam, através dos estudos, uma vida mais digna e próspera. A presença dos auxílios e subsídios nas universidades federais são capazes de garantir a permanência de diversas pessoas no ensino superior, e para além disso, também permitir que eles se dediquem exclusivamente aos estudos, para que assim apresentem um bom rendimento acadêmico e um maior engajamento com as pesquisas realizadas pela universidade.

Os cortes no orçamento da educação pública, especialmente os de 2021, colocaram em risco a permanência de muitos estudantes de baixa renda nas universidades. A redução de verbas afetou significativamente a oferta de auxílios, como o auxílio-moradia e bolsas de pesquisa. Essa situação gerou um clima de incerteza e preocupação entre os alunos que dependem desses benefícios para continuarem seus estudos. Se não fossem pelos auxílios, a história de Kellin seria muito diferente. Quando seu pai a trouxe para a universidade, conversou com o dono da pensão onde ela ficaria, mencionando que se ela não conseguisse um emprego ou uma bolsas em dois meses, ela teria que voltar para Santo Augusto, pois a família não teria condições de mantê-la ali.

Essa conversa entre o dono da pensão e seu pai só veio a tona na reta final da graduação de Kellin, por isso ela nos conta essa história com certo tom de dever comprido e gratidão a todas as possibilidades encontradas dentro do ensino superior. “Quando eu consegui os auxílios, e deu tudo certo, o dono da pensão veio falar comigo. Ele disse que se eu tivesse ido embora nos dois meses que meu pai falou eu teria perdendo uma grande oportunidade. Mas eu entendo que por mais que pai quisesse  que eu fizesse a graduação, ele não tinha condições de me bancar aqui.”

As trajetórias de Kellin e Werick são exemplos vivos da importância dos auxílios e subsídios nas universidades públicas brasileiras. Eles demonstram como essas políticas de assistência estudantil são essenciais para garantir o acesso e a permanência de jovens de baixa renda no ensino superior. Além de proporcionar condições para que esses estudantes possam se dedicar integralmente aos estudos, os auxílios contribuem para a formação de profissionais qualificados e para o avanço da pesquisa científica no país. A história de Kellin, em particular, ressalta o impacto transformador que esses auxílios podem ter na vida dos estudantes, permitindo que sonhos sejam realizados e futuros sejam construídos.

FREDERICO WESTPHALEN, RS

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