Fé na vida
O cotidiano de jovens cristãos na universidade.
Texto e Fotografia: Emilly Rodrigues
Quando um cristão vai para a faculdade, o momento que ele mais espera é quando sua fé será confrontada. E eu esperava por ele com o coração firme, com a confiança de que teria as respostas certas para qualquer pergunta. Porque eu sabia que um ambiente não podia mudar a minha fé, e, se podia, é porque minha fé era fraca. Porém, ao chegar no campus, percebi que não teria essa preocupação, pois acabei encontrando um grupo de acolhida. Com esse apoio, pude seguir no curso dos meus sonhos.
O Farol é um projeto de extensão do Grupo Cristão Universitário, que existe há 18 anos e, há 13, no Campus de Frederico Westphalen consiste na realização de encontros semanais, numa dinâmica com oração, leitura e música.
Porém o temido momento do confronto chegou para uma estudante do grupo, Caroline Silva, que cursa Agronomia. Na aula em que o professor se distanciou do conteúdo para atacar o cristianismo, ela sentiu seu coração acelerar e seu rosto ficar quente. Tudo o que ela mais acreditava começou a ser criticado, seu corpo em combustão e sua cabeça cheia de argumentos que não puderam ser usados, pois ela só podia ouvir. No entanto, disse que não teve sua fé abalada, mas desprezada. Durante a aula, Caroline percebeu que seria arriscado demais expôr-se naquele momento.
No grupo Farol, Caroline notou que podem existir opiniões opostas no mesmo local e que, ainda assim, serão ouvidas. Na terceira aula, novamente a religião foi criticada, mas dessa vez Caroline tomou coragem para argumentar contra o docente: “Meu Deus, ou eu sou cristã ou eu sou uma farsa”, conta ter pensado. O professor permaneceu em sua autoridade de docente e ela permaneceu em seu respeito como aluna.
Depois do ocorrido, quando Carol compartilhou sua experiência com o grupo, tentou apresentar aos colegas o argumento de que não poderiam abandonar suas crenças ao enfrentar desafios, mas tomá-los como aprendizado. Em minha experiência, tive medo de não fazer amizades na universidade, comecei a esconder partes minhas para ser aceita. Essas questões podem gerar dois caminhos. De um lado, os jovens que abandonam a fé. Do outro, os que se sentem mais fortes em sua escolha. “Você não desiste pelo amor e pelo temor”, declara Caroline.
Por mais que os estudantes tenham medo desse confronto, ele é, particularmente, necessário independentemente da crença. É o que afirma o professor de Ciências da Religião Noeli Dutra Rossato, da UFSM: “Grandes personagens bíblicos, como Abraão, Moisés ou Jó, frequentemente foram testados em sua fé para que ela se fortalecesse”, reflete.
Outro caso ocorreu com o estudante de Engenharia Florestal Alec Duwe, em situação semelhante à de Caroline. “É uma caminhada de fé, não é? Ao longo dela, nós vamos ganhando confiança. O que me leva a continuar firme é já ter tido muitas perguntas respondidas”, declara o estudante.
Para a professora Adriana Pereira, coordenadora do Farol, o projeto não é um simples momento de descontração. Segundo ela, é um espaço em que os jovens encontram respostas para suas dúvidas, consolo para suas maiores lutas e acolhimento.
O Projeto Farol foi objeto de reclamações sobre o uso do espaço universitário para os encontros presenciais: “Mesmo que sempre a gente cuidasse para não fazer o encontro no horário das aulas, tivemos todos os nossos cartazes de divulgação do projeto rasgados e recebemos também uma denúncia anônima”, recorda Adriana.
No Brasil, o cristianismo não possui bons exemplos midiáticos e, muitas vezes, quem sofre com isso são os fieis que procuram viver de acordo com sua fé. Isso faz com que muitos jovens não se sintam seguros de falar abertamente sobre sua crença.
“Sempre me disseram para tomar cuidado porque o ambiente da faculdade vai muito contra os princípios cristãos, então basicamente me diziam para me fortalecer na fé”, relata Lizian Santos, caloura de Jornalismo. Mas o verdadeiro desconforto, afirma a estudante, é o medo de não fazer amigos. Quando Lizian se deparou com um ambiente que a aceita, sentiu-se mais confortável: “Eu pensava que a minha turma ia me odiar, mas eles são muito mente aberta, foi uma coisa que me acalmou, posso me sentir parte do grupo, mesmo que a gente não tenha princípios iguais”, comenta.
Entretanto, para Larissa Costa, também caloura de Jornalismo, foi um pouco diferente: “Na comunidade de onde eu vim, eles olham as universidades como um lugar de doutrinação, um lugar ruim, que vai afastar o jovem daqueles princípios. Na verdade, quando você segue verdadeiramente aquele princípio, não é assim. Eu sei porque eu vivi isso na prática”, argumenta Larissa.
O ingresso na faculdade seria mais tranquilo se a igreja também participasse do processo. Assim explica o professor Noeli: “Normalmente, são pessoas que não tiveram acesso à universidade ou a boas universidades; ou são pessoas adversas ao conhecimento crítico e à ciência por causarem algum tipo de ameaça.”
Sob outra perspectiva, o pastor Evanir Thurow, da Igreja Batista de Frederico Westphalen, tem uma experiência de sete anos com jovens de outras cidades que cursam alguma graduação no município. Ele afirma que há um padrão: os que abdicam de sua fé já vieram sem aprofundamento espiritual, enquanto os jovens que permanecem com ela, é por que tiveram uma boa influência familiar desde o começo.
Esse fenômeno pode ser observado no exemplo de Emilly Oliveira, aluna de Sistemas de Informação. Sendo filha de pastor, e membro da Assembleia de Deus, Emilly diz que nunca duvidou da sua fé, mas do caráter exigido pela igreja. “Se você quer ser inserido dentro dessa comunidade, você tem que seguir essas doutrinas, e isso é perfeitamente normal”. Emilly concorda que um jovem cristão pode cursar a faculdade sem se desviar da fé que professa.
Pâmela Nascimento de Sousa, hoje graduada em Jornalismo pela UFSM, conta como foi sua jornada acadêmica. Ela diz que não perdeu sua crença, pelo contrário, sentiu sua fé intensificada. “Se engaje numa igreja local; entenda o que pode fazer; ame seus irmãos e sua comunidade que vai te acolher; tenha uma identidade bem firmada, o mundo vai trazer diversas provocações; tenha conhecimento da palavra; aproveite e seja um jovem engajado”, aconselha Pâmela.
O pensamento da jovem é confirmado pelo pastor Evanir: “Há uma questão familiar, […] se tem uma família estruturada por trás desse jovem, tem uma tendência a permanecer em sua igreja. Um outro aspecto é quando a pessoa já tem um equilíbrio. Você tem que ter um foco na faculdade, mas você não pode esquecer, que tem que ter um tempo com Cristo”, defende.
Todos têm o direito de escolher sua crença. O problema está na motivação. Se as escolhas e os argumentos estão relacionadas à discriminação, eles precisam ser repensadas: “A teoria, propriamente dita, é um dos caminhos, talvez o principal, para alcançar o conhecimento divino”, comenta o professor Noeli Rossato. Etimologicamente o termo “Teoria” vem do grego theos, que significa “deus”. Portanto, até o conhecimento que adquirimos na universidade pode nos aproximar do divino, se assim quisermos.
FREDERICO WESTPHALEN, RS