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Frederico em choque



Com o fluxo de pessoas que chegam e saem, vem acontecendo uma estranheza entre a cidade e os novos moradores. Essa estranheza é também conhecida como choque cultural.

Texto: Amanda Busnello, Beatriz Vieira e Gabrieli Ferla Guenzer


Centro da cidade de Frederico Westphalen. Foto: Gabrieli Ferla Guenzer

Choque, no dicionário, significa encontro violento. Já cultural é aquilo que é característico da cultura. Choque cultural, nada mais é do que uma colisão violenta entre culturas. A antropóloga e professora da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Maria Catarina Chitolina Zanini, afirma que o choque cultural pode ser traumatizante, incomodativo e profundo. E também é o momento em que os indivíduos e grupos se reconhecem e são reconhecidos como diferentes. A antropóloga também argumenta que cada cultura possui suas especificidades, o que implica que aquilo que pode ser considerado bom e positivo num grupo, possa causar muita estranheza em outro. Afinal, cada cultura possui suas formas específicas de compreender o mundo e de nele agir.

Frederico Westphalen, cidade do noroeste do Rio Grande do Sul com 31.675 habitantes, tem atraído novos moradores em busca de oportunidades de trabalho e estudos universitários. Vindos de outras cidades, estados e até mesmo de outros países, os novos moradores encontram aqui uma cidade pequena e com poucos habitantes, mas com sua cultura bem enraizada.

Deyanauris González, de 41 anos, e Javier Márquez, de 36, um casal vindo da cidade de Bolívar, na Venezuela, relatam ter sentido de início dificuldades com o idioma, já que na Venezuela falavam espanhol. O chimarrão também foi um costume que gerou uma certa estranheza para os dois, pois, tanto na Venezuela quanto em Manaus, onde eles moraram antes de vir a Frederico Westphalen, ninguém conhece ou consome a bebida. Eles complementam ainda que a capital do Amazonas, Manaus, possui algumas colisões culturais com Frederico e que a mais forte é em relação ao clima. “Aqui é muito frio”, exclamam.

Além do fator climático, Deyanauris também vê diferenças na forma de festejo de datas comemorativas. No Natal venezuelano, por exemplo, existe o costume de fazer uma grande festa, com danças e queima de fogos, como tradicionalmente é feito na virada do ano no Brasil. Já na Páscoa, não há comemoração da data, embora se tenha conhecimento do seu significado. Ela diz que os eventos de Natal e Páscoa que ocorrem na praça de Frederico“são algo muito impactante para nós, porque é algo novo, muito bonito”.

Deyanauris González na praça da cidade durante o evento Frederico em Luz no ano de 2023. Foto: Beatriz Vieira.

Segundo o psicólogo do CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) do município, Mathiel da Rosa, o maior desafio de integração das pessoas à sociedade frederiquense são as diferenças culturais e linguísticas, tanto para pessoas que vêm de outras partes do Brasil, pelo fato de a cidade possuir outra cultura, como para os estrangeiros que vêm de fora do país,e que enfrentam as dificuldades da nova língua. “O fato de essas pessoas saírem de seu lugar de origem, onde tinham família e amigos, para começar a construir novas relações sociais também é um desafio para elas”.

O psicólogo acrescenta que a questão linguística era contornada com a ajuda de um dos recepcionistas do CRAS, que era a única pessoa com espanhol fluente na instituição. Um dos papéis do CRAS é orientar as pessoas recém-chegadas quanto aos benefícios sociais e demais políticas públicas na cidade, explica.

Petterson Amorim, de 44 anos, mudou-se para a cidade em 2019 para acompanhar sua esposa, professora do curso de Medicina Veterinária no Instituto Federal Farroupilha (IFFar) de Frederico Westphalen. Ele diz que sua adaptação à cidade foi tranquila e, em sua opinião, seria mais complicado para alguém sair daqui e ir morar em um lugar agitado, como o Rio de Janeiro, estado onde ele nasceu. Ele explica que seu estado é um lugar muito diversificado, por conta da mistura de culturas que existem lá. Mas apesar de ter convivido com essas diferenças culturais, Amorim respeita muito a cultura gaúcha, que, em sua opinião, é bem enraizada, mais que em seu estado. O que o empresário sente mais falta do Rio de Janeiro são os estádios de futebol e a praia.

Petterson Amorim em seu ambiente de trabalho, localizado no centro da cidade.Foto: Enviada pelo entrevistado Petterson Amorim.

Marilisa Baggio, de 60 anos, moradora e natural de Frederico, compara a cidade atual com a do passado. “Há 60 anos atrás nós não tínhamos esgoto, água encanada, calçamento, hoje a gente tem calçamento na rua. Frederico foi se desenvolvendo com a chegada das pessoas.” Apesar de haver um crescimento positivo, a frederiquense acredita que Frederico pode crescer ainda mais, porém, em sua opinião, existe um medo da cidade crescer e avançar, por isso fica no limite para expandir. Sobre as pessoas vindas de fora, Marilisa explica que, na sua visão, elas não ligam muito para o que os outros pensam e expressam quem são verdadeiramente, além de terem culturas diferentes para oferecer. Ela enfatiza dizendo que foi muito emocionante ver pessoas negras e asiáticas chegando na cidade.

Marlisa Baggio em sua casa na cidade de Frederico Westphalen Foto: Beatriz Vieira

Para Mathiel da Rosa, ainda existe um caminho a ser percorrido para a cidade estar completamente preparada para acolher os imigrantes. Ele argumenta que o CRAS já realiza um trabalho de suporte emocional e social para os venezuelanos que residem em Frederico e que o apoio oferecido facilita a vida deles. Ao final, ele complementa que o trabalho com grupos de encontros voltado a emigrantes irá crescer e assim ajudar mais pessoas.

A antropóloga diz que devem haver mais diálogos interculturais nas políticas públicas, especialmente nas sociedades que recebem um fluxo maior de pessoas. Segundo ela, não se deve aceitar diante dessa colisão violenta de culturas que as diferenças culturais sejam motivo para diminuir a dignidade do outro ou para gerar violência. Estranhezas e incômodos fazem parte das mobilidades humanas e compreender as características do outro é o melhor caminho para o bom convívio intercultural, exclama.

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