Contrariando a sensação de imunidade para quem já foi infectado pelo novo coronavírus e passou pela Covid-19, autoridades em saúde confirmam os riscos de uma nova infecção. A pessoa que se reinfecta pode, inclusive, transmitir o vírus. Nesta semana, trouxemos a declaração de um médico atuante na linha de frente e o depoimento de quem já foi acometido duas vezes pelo vírus.
O aumento exponencial no número de infectados pela doença em todo país é consequência de falhas no enfrentamento à pandemia. Uma delas é a propagação da ideia de que as pessoas que já foram contaminadas pelo vírus adquirem a imunidade permanente. O avanço das pesquisas sobre essa crença demonstra que não ela não procede.
O termo imunidade de rebanho, que foi incorporado nos noticiários, representa um contexto em que grande parcela da população já teria desenvolvido anticorpos para o vírus e, com isso, não se infectaria novamente, Porém, os estudos mais recentes demonstram que a quantidade de anticorpos que o corpo produz logo após ser atacado pelo vírus, diminui com o passar do tempo. Assim, só a vacinação é capaz de estancar a pandemia. O biólogo e divulgador científico Atila Iamarino, doutor em Virologia, fez recentemente, em sua conta no Twitter, uma analogia com a pandemia da varíola, ocorrida no século XX. Após a contaminação pelo vírus da varíola, não era possível a reinfecção, diferente do que acontece com o novo coronavírus. Ainda assim, o desenvolvimento da vacina contra a varíola foi fundamental para erradicar a doença, não bastando que um percentual da população já tivesse sido infectada pelo vírus.
No caso do novo coronavírus, alguém que já foi infectado pode sofrer uma nova infecção pelo mesmo vírus. Não se pode confundir com casos em que o vírus já estava no organismo e o quadro se agrava. Também podem ocorrer infecções por cepas diferentes do vírus. Conforme a Agência Fiocruz de Notícias, “O caso de ser infectado pela mesma variante [reinfecção] acontece porque o paciente não teria criado uma memória imunológica. No caso de uma outra cepa, ela ‘escaparia’ da vigilância, não seria reconhecida pela memória gerada anteriormente por ser um pouco diferente”.
Eloisa da Silva Xavier, 26 anos, natural de Manaus, e atualmente residindo na capital gaúcha, teve dois testes confirmados de infecção pelo novo coronavírus em um intervalo de três meses. Ela afirma que a principal diferença entre a primeira e segunda vez foi que na segunda não teve qualquer sintoma. ‘’Eu só descobri pois estava viajando de férias e esperei dar o período de duas semanas após o meu retorno. Fui fazer o teste, onde constou que eu tinha tido contato com o vírus há três semanas’’. No entanto, a primeira vez em que ela se infectou foi em outubro de 2020, quando teve sintomas, e o último exame foi em janeiro de 2021, quando ficou assintomática. Na primeira vez, Eloísa sentiu muita dor no corpo, dor de cabeça, febre e dor atrás dos olhos, e perdeu o olfato e paladar por cerca de um mês.
O médico especialista em Doenças Infecciosas e chefe da Unidade de Pesquisa Clínica do Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM), Alexandre Schwarzbold, afirma que ‘’O que é importante para definir uma reinfecção, é que na nova infecção a gente tenha a identificação desse vírus do ponto de vista genético e compare com a identificação genética da primeira infecção, pois em muitas situações é o mesmo vírus, que ainda estava ativo no organismo e que, na verdade, voltou a se manifestar”, explica o médico.
O médico do HUSM explica que a apresentação clínica da segunda infecção é diferente, sendo ‘’variável em uma pessoa que tomou uma dose ou até duas da vacina, ou se ela não tomou nenhuma, e dependente da quantidade de vírus que na segunda infecção a pessoa adquiriu’’.
A imunidade trazida pela vacina
Os dados e estudos ainda não são conclusivos para uma resposta definitiva sobre quanto tempo duram os anticorpos contra o Sars-Cov-2 produzidos pela vacina. ‘’Vamos ter a clareza maior quando terminar os primeiros estudos da vacina, completando um ano. Com os estudos preliminares, como da vacina de Oxford, da qual participamos como pesquisadores, nós já temos dados de relevância de manutenção por pelo menos 6 meses dos anticorpos, então imaginamos que em torno de 9 meses a maioria das pessoas vai manter os anticorpos”, afirma Alexandre Schwarzbold.
É importante ressaltar que existe a imunidade celular a partir de células de defesa que não dependem somente dos anticorpos e que também as vacinas induzem a proteção. Essa imunidade celular é protetora por pelo menos 9 meses e é possível que até por mais tempo, porque também tem uma relação com infecções prévias ao coronavírus, pois é um vírus que sempre tivemos em nosso meio, diferente desse novo que causou uma pandemia, destaca o médico.
Outra dúvida comum é em relação à possibilidade de a vacina reduzir as chances de transmissão da covid-19. ‘’Quem tomou a vacina vai ter chances menores de adquirir a infecção, mas nós não temos uma comprovação ainda na população em geral, de que a vacina impeça a pessoa de adquirir o vírus e principalmente de transmitir.’’ Uma pessoa, principalmente após duas doses, vai ter uma proteção maior e dificuldade de adquirir o vírus. Se ela pegar o vírus, será em uma quantidade menor na sua via respiratória (carga viral menor), portanto as chances de transmitir são menores, pontua Alexandre.
O risco da reinfecção também está associado ao fato de a pessoa voltar a transmitir o vírus. Mesmo com sintomas leves e com menor possibilidade de transmissão, ela pode ainda ser transmissora do Sars-CoV-2. Por isso, outra vantagem da vacina é que, quanto mais pessoas forem vacinadas, menores as chances de o vírus continuar circulando, ressalta o médico. Nesse cenário, o rigor com as medidas preventivas contra Covid-19 se tornam imprescindíveis para preservar a saúde, tanto individual quanto coletiva.
Reportagem: Camila Amorim Fernanda Vasconcellos
Edição: Mirian Quadros e Luciana Carvalho