A pandemia da Covid-19 foi declarada pela Organização Mundial da Saúde em meados do mês de março. Desde então, intensificou-se a luta contra o tempo em busca de um tratamento eficaz para a doença.
A Sociedade Brasileira de Infectologia informou que os medicamentos que estão sendo utilizados ainda não possuem comprovação científica mas que as opções de tratamento seguem em análise, e que o uso desses medicamentos devem estar sob decisão individual dos médicos.
Mas se faltam soluções, sobram dúvidas para a população. Para entender melhor como são tratados os pacientes que se curaram da Covid-19, a Equipe da Agência da Hora conversou com pessoas que enfrentaram o vírus e com profissionais da saúde que atuam no combate à pandemia.
Ela venceu a Covid-19, mas teve que se despedir do marido
Lúcia Helena Gomes, 67 anos, mora em São Gabriel, na região da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. O marido dela morreu contaminado com o novo coronavírus em maio. Ela conta que quando foi internado, ele ficou um tempo no hospital e após dois dias ele precisou de respirador. Ele chegou a se recuperar de uma parada cardíaca, mas na segunda, não aguentou. Lúcia Helena lembra com tristeza do tratamento destinado ao marido após a morte. “Me chamaram no hospital, por volta de oito horas da noite e disseram que fizeram de tudo, mas ele não resistiu. Falaram que colocariam ele em um plástico preto e o levariam direto ao cemitério”, relata ela.
Um dia após a morte do marido, Lúcia recebeu a confirmação de que também estava com covid-19. Ela conta que após fazer três testes rápidos negativos realizados no “Gripão”, posto de triagem improvisado para coleta de exames da covid-19, ela continuava sentindo falta de ar. Foi então que ela fez um exame no pulmão e obteve a confirmação. “Estava cheio de bicho”, diz Lúcia sobre o resultado do exame. Ela lembra que além dos sintomas físicos como dor no corpo, “do dedo do pé até os cabelos”,como relata, ela viveu momentos de muita tensão após o diagnóstico, pois teve medo de também não resistir à doença. Após ficar internada no hospital para tratamento, por cerca de uma semana, Lúcia se curou da Covid-19.
Uma família com o novo coronavírus
A vendedora, Evaniza Nunes, 35 anos, o marido Marcio Gorosito, 41 anos e o filho Isaque Gorosito, de 4 anos, testaram positivo para o novo coronavírus.
– Comecei a sentir dor de cabeça e calafrios no corpo, mas achei que era gripe. Meu esposo estava em casa com problemas de pressão e não desconfiávamos que poderia ser Covid, conta Evaniza.
Ela foi diagnosticada no ambulatório improvisado montado em um ginásio em São Gabriel para atender os casos de pacientes com Covid-19 na cidade. Por lá, a tenda é conhecida como “Gripão”. Nesse espaço são feitas as coletas de amostras de sangue dos pacientes que apresentam sintomas do novo coronavírus. Essas amostras são enviadas para laboratórios que realizam o teste chamado de RT-PCR, utilizado para detectar a Covid-19.
Evaniza conta que ela e a família trataram da doença em casa, eles receberam vários tipos de medicamentos após o diagnóstico positivo, entre eles o Tamiflu, usado para tratamento da gripe H1N1. Ela também recebeu doses de ibuprofeno, para controlar a febre. Ela diz que sentiu efeitos colaterais ao ingerir o Tamiflu, e que, ao parar de tomá-lo, apresentou melhoras. “Nossa recuperação se deu em 16 dias. Passei todo esse tempo isolada”, conclui a vendedora.
Evaniza conta que outras pessoas da família também testaram positivo para o novo coronavírus. A cunhada, o irmão, o sobrinho e os pais dela. Marcélia Gorosito, 34 anos, cunhada de Evaniza, conta que antes de receber o diagnóstico da doença sentia dores insuportáveis de cabeça, mas achou que poderia ser resultado do estresse no trabalho. Marcélia conta que perdeu o olfato e o paladar por duas semanas e também se sentia fraca e debilitada.
O marido dela Fábio Ricardo Pinto, 43 anos, teve sintomas parecidos, não precisou de respirador, mas precisou de fisioterapia para melhorar a capacidade respiratória dos pulmões após receber alta. O filho de três anos se recuperou bem e os seus pais, de 67 e 62 anos, ainda estão em tratamento domiciliar com medicação.
Os membros da família Gorosito, que conversaram com a nossa equipe, contaram que os sintomas surgiram entre cinco e 10 dias após elas terem sido infectadas com o vírus, porém, elas não sabem onde podem ter contraído a doença.
Quanto antes diagnosticado, mais efetivo o tratamento
Por ser se tratar de um vírus novo, cujo o comportamento ainda não é bem compreendido pela sociedade médica e científica, o estudante do último período de medicina Diego Oscar Hibner, 25 , alerta que é muito importante que os pacientes que apresentarem sintomas da Covid-19 procurem postos de saúde, ou postos de triagem. Hibner realiza atualmente seu estágio obrigatório do curso de medicina no Hospital Regional de Ciudad del Este, no Paraguai, fazendo a triagem dos pacientes com Covid. Segundo ele, o quanto antes for realizado o teste que diagnostica a doença, menores serão as chances de que o vírus seja disseminado, antes mesmo que o paciente tenha consciência de que está contaminado.
– Após o paciente com suspeita de coronavírus se apresentar em um hospital ou posto de saúde e encontrar-se com os sintomas, ele é testado e colocado em isolamento em sua residência, dependendo da gravidade dos sintomas, afirma Diego Hibner. O médico explica que após a confirmação do resultado, o paciente é reavaliado e, caso necessário, ficará em observação com acompanhamento hospitalar.
Diego ressalta que ainda não há um tratamento 100% eficaz contra o novo coronavírus e os médicos seguem protocolos de tratamento que orientam a utilização de alguns tipos de medicação. “É o caso de antibióticos e outros medicamentos que estão sendo ministrados por profissionais”.
Além disso, o médico ressalta que também não se pode observar ainda um padrão de recuperação nos casos, ele afirma que o tratamento varia de pessoa para pessoa, “depende muito da idade, se o paciente tem ou não comorbidades e outros fatores de risco”, afirma.
Nos casos mais graves da doença o paciente precisa receber atendimento intensivo em um leito de UTI. Luana Ataide, 28 anos, é enfermeira na cidade de Castanhal no Pará. Ela é uma das milhares de pessoas que trabalham na linha de frente contra a Covid-19. Ela conta que o paciente precisa ser submetido a sedação e intubação quando a saturação, nível de oxigênio presente nos pulmões, está abaixo de 90% “Quando o paciente precisa de um leito de UTI e precisa ser entubado, é quando fica com uma saturação abaixo de 90%, uma vez que o correto para evitar a entubação é entre 90 e 100%. A partir desta queda, o paciente fica destinado a sedação e entubação. É a partir daí que são ministrados maiores cuidados com o paciente”, conta a enfermeira sobre quando um paciente é encaminhado a Unidade de Tratamento Intensivo.
Luana conta que vários medicamentos estão sendo testados para tentar curar os pacientes com Covid-19, mas ela afirma que Depois da liberação da cloroquina, muitos pacientes apresentaram piora nos sintomas da Covid-19, pois como cada organismo se diverge um do outro, os efeitos colaterais são inevitáveis.
Embora não haja ainda um consenso mundial dos tratamentos que são eficazes no tratamento da Covid-19 tanto o estudante de medicina, Diego, quanto a enfermeira Luana concordam que as pessoas não devem se automedicar. Diego ainda faz um apelo, “siga os conselhos de um profissional qualificado, que estudou para isso e sabe sobre as qualidades e os riscos de cada medicação”. conclui.
Quais tratamentos estão dando certo? O que se sabe até agora.
Ainda não existem medicamentos ou tratamentos comprovados para a prevenção ou cura da infecção pelo Sars-cov-2, vírus que causa a Covid-19. Entretanto, a comunidade científica busca diariamente alternativas para combater o vírus, por este motivo, os protocolos de atendimento para as pessoas que foram infectadas precisam ser modificados de acordo com a situação de cada região. Esses protocolos servem para nortear a atuação dos profissionais da saúde. Eles fornecem orientações específicas sobre quais medicamentos podem ser ministrados para a redução dos sintomas nas pessoas contaminadas.
Como a Covid-19 é uma doença nova, ainda não se tem certeza de qual tratamento é o melhor para combater os sintomas causados pelo vírus, que em alguns casos pode levar à morte. Para informar a população sobre os principais medicamentos que estão sendo utilizados no tratamento da doença, a Sociedade Brasileira de Infectologia publicou, no final de junho, informações sobre o uso dos principais medicamentos no tratamento de casos de Covid-19.
No documento são apresentadas as informações que se tem até o momento sobre cada tratamento com base nas pesquisas científicas já realizadas, ou em andamento, coordenadas pela Universidade de Oxford, Reino Unido, que está responsável por avaliar as terapias com potencial de cura e prevenção à Covid-19.
Confira abaixo os principais tratamentos que têm apresentado resultados positivos no tratamento de pacientes com Covid-19 e os que não tem eficácia comprovada.
Dexametasona: da família dos corticoides, normalmente utilizada para o tratamento de doenças crônicas, como asma, artrite e sinusite. É considerada pela Sociedade Brasileira de Infectologia o primeiro tratamento com impacto em reduzir a mortalidade contra o novo coronavírus. Os infectologistas orientam a utilização da medicação nos casos graves da doença, mas destacam que a prescrição do medicamento deve ser realizada exclusivamente pelos médicos.
O estudo da Universidade de Oxford reforça a descoberta de que a dexametasona aumenta a sobrevida nos pacientes em casos graves, que necessitam de oxigênio suplementar ou do auxílio de respiradores.
Cloroquina/hidroxicloroquina: o medicamento ganhou grande notoriedade quando se fala no tratamento da Covid-19, desde o início da pandemia. Entretanto não existem evidências de que a cloroquina traga benefícios no tratamento de pacientes hospitalizados em estado grave, nem como preventivo à doença.
O uso desse medicamento em casos leves está sendo avaliado e também não possui resultados conclusivos. Além disso, a Sociedade de Infectologia destaca que o uso da cloroquina pode ter efeitos colaterais, principalmente associado com o medicamento azitromicina e não recomenda a utilização da cloroquina, mesma orientação passada pela Organização Mundial da Saúde.
A ineficácia da cloroquina no tratamento à Covid-19 foi comprovada em diversos estudos, entre eles um realizado na Universidade de Oxford, na Inglaterra. Mesmo assim, no Brasil, o Ministério da Saúde autoriza a utilização do remédio para casos graves, desde que o paciente assine um termo se responsabilizando pelos efeitos resultantes do remédio. No mês de junho, a utilização da cloroquina foi autorizada, pelo Ministério em gestantes e crianças diagnosticadas com Covid-19.
Vitaminas e suplementos alimentares: de acordo com a Sociedade Brasileira de Infectologia esse tratamento é recomendado apenas para pessoas que apresentam carência de minerais ou de vitaminas. Sendo assim, podem ser utilizados para aumentar a imunidade e a qualidade de vida dos indivíduos, mas não existe nenhuma comprovação de que ajudem no tratamento e na redução dos sintomas do novo coronavírus.
Imunomodulador tocilizumabe: segundo a Associação Médica Brasileira a utilização do medicamento não apresentou dados que comprovem a eficácia em pacientes que testaram positivo para a Covid-19. Desenvolvido para tratar artrite reumatoide grave, ativa e progressiva o medicamento segue em teste pelos pesquisadores da Universidade de Oxford, na Inglaterra.
Antiparasitários, ivermectina e nitazoxanida: fazem parte de tratamentos experimentais e de estudos clínicos que têm o objetivo de definir quais são os efeitos do uso contra o novo coronavírus. Conforme a Associação Médica Brasileira e o Ministério da Saúde eles demonstram ter atividade “in vitro” contra o Sars-cov-2, ou seja, os testes foram positivos dentro dos laboratórios, mas ainda não existem evidências clínicas suficientes que permitam a utilização em pacientes com Covid-19.
Anticoagulantes: a Associação Médica Brasileira explica que os anticoagulantes como a heparina e seus derivados, são ministrados somente quando os pacientes hospitalizados com Covid-19 apresentam risco de desenvolver trombose. A Sociedade de Infectologia afirma que não há indicação para a utilização do medicamento, mesmo que em doses terapêuticas, nas vítimas hospitalizadas pelo novo coronavírus. Segundo o Ministério da Saúde um ensaio clínico do tratamento combinado de anticoagulantes com antivirais deverá ser realizado no Japão, a fim de comprovar seus benefícios.
Remdesivir: um antiviral utilizado originalmente paratratar a Ebola, segundo a Sociedade de Infectologia, tem apresentado resultados significativos no tratamento da Covid-19, como redução no tempo de recuperação dos pacientes que apresentam quadros moderados e graves da Covid-19. No Brasil, o medicamento foi liberado pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) apenas para estudos clínicos, ainda não para ser utilizado em pacientes.
lopinavir e ritonavir: a combinação do dois antivirais é utilizada para o tratamento de HIV e segundo a Sociedade de Infectologia não possui resultado efetivo para combater o coronavírus, por isso não recomenda o uso.
O que é o “plasma convalescente”?
Quando uma pessoa contrai a Covid-19, seu sistema imunológico cria anticorpos para combater o vírus, essa é uma defesa natural do corpo humano. Esses anticorpos ficam localizados no plasma, que é aparte líquida do sangue. O plasma com esses anticorpos de combate à infecção é chamado de “plasma convalescente”. Por meio de um processo de doação de sangue, esse plasma rico em anticorpos poderia ser coletado de uma pessoa recuperada da doença e depois transferido para um paciente doente que ainda luta contra o vírus.
Porém, nos primeiros testes realizado como a transfusão de plasma convalescente para 66 pacientes que estavam com a Covid-19 não foram obtidos resultados satisfatórios. Segundo o Ministério da Saúde, não foram observadas diferenças nos índices de mortalidade, no tempo de permanência hospitalar ou na gravidade da doença em comparação com outras pessoas que receberam tratamentos diversos. Por isso o estudo foi interrompido, conforme documento publicado pela pasta no dia 7 de julho. Uma nova etapa do estudo, agora com testagem em 86 pacientes, deve ser realizado para que se possa buscar novos resultados.
Diante de todos os estudos que estão em andamento para encontrar medicamentos que possam curar ou prevenir o contágio pelo novo coronavírus nenhum deles teve 100% de eficiência comprovada. Assim a Associação Médica Brasileira, a Sociedade Brasileira de Infectologia, bem como a Organização Mundial da Saúde concordam que a orientação para as pessoas que apresentarem sintomas de Covid-19 é procurar atendimento médico e seguindo todas as orientações e protocolos de tratamento disponibilizados pelo sistema de saúde e nunca tomar remédios por conta própria.
Apuração: Alice Rodrigues, Igor Mussolin
Texto: Francelen Soares, Taiane Borges
Edição: Alice Pavanello