É por meio de videoconferências que o teatro se apresenta hoje. Com a pandemia, o que era um lugar de encontro, de calor humano, de presença e de vibração do público, tornou-se corpos em uma tela de computador. Embora já houvesse adaptações dessa arte em vídeo, agora se tornou indispensável o uso da ferramenta para dar continuidade à profissão.
“Aos trancos e barrancos, o teatro está se adaptando à situação, sendo com apresentações por lives ou outros artifícios”, destaca o ex- aluno de Artes Cênicas da UFSM e integrante da Cia de Palhaços Clowncando de Santa Maria, Otavio Muxfeldt Arns. Ele aponta que essa adaptação às tecnologias já vinha sendo requerida há tempos pelo teatro e acabou sendo um desafio para os artistas que tiveram que buscar essa alternativa rapidamente. “Agora não é mais uma questão de expandir os horizontes e quem sabe crescer seu negócio, é uma questão de sobrevivência, de se adaptar ou desistir e ir para outra forma de ganhar a vida”, completa.
O professor de Artes Cênicas da UFSM, Ze Mangaio, explica que artistas teatrais que trabalham em grupos com equipes de cenografia, figurinos, técnicos de luz e de som, são os mais afetados desse momento atípico. “Algumas linhas de teatro pressupõem um treinamento específico, uma sala de ensaio que, de repente, passa a ser a sala da casa do artista. O Teatro envolve muitos aspectos em sua complexa produção, meses de treino e de ensaio, que agora tiveram que ser transpostos para uma outra linguagem”, argumenta Mangaio.
Nas aulas lecionadas pelo docente na UFSM, especificamente as de expressão corporal, as explicações são apontadas como as mais difíceis, pois não é possível ver todo o corpo dos participantes e a atenção às telas precisa ser redobrada. Mas, aos poucos, a experiência foi sendo aprimorada. “As aulas foram encontrando sentido, mas é um outro sentido, se referem a esse teatro possível hoje, não ao teatro de muitas tradições anteriores à pandemia. Precisamos deixar as bases dos alunos estruturadas o máximo possível, para que eles possam continuar aprendendo com os fundamentos bem estruturados”, argumenta.
Já a aluna de Artes Cênicas da UFSM, Pietra Keltika, que está produzindo o seu Trabalho de Conclusão de Curso com uma peça totalmente online, aponta como principal desafio o medo de se arriscar no desconhecido. “Como tudo ainda é muito recente, não existe muito material para estudar, não tem com o que se basear, porque as pesquisas estão acontecendo agora. Mas por mais que o medo seja grande, a vontade de não ficar parado é maior”, ressalta.
Aproximação com o audiovisual
O uso de outras mídias e tecnologias não é algo novo no teatro, no entanto, nunca foi tão necessário utilizá-las como mediadoras como agora. Os encontros por telas aproximam a experiência teatral das experiências do audiovisual e do cinema. Antes, artistas que tinham toda uma sala de ensaio para explorar, agora precisam limitar o olhar para um quadro na tela do computador, além de afetar a atuação dos atores que precisam sempre se preocupar com os enquadramentos.
Pietra destaca que, neste momento, os artistas não estão preocupados em nomear exatamente o que está sendo feito ou responder questões sobre isso ser realmente teatro ou não, mas sim em utilizar a experiência como algo que possa ampliar as discussões sobre os espaços que o teatro é capaz de se apropriar, e explorar teatralidades possíveis nesse novo formato. Além disso, aponta como uma oportunidade de “gerar plateia” e alcançar o público que nunca teve interesse ou oportunidade de ir a uma sala de teatro.
O professor Mangaio salienta que, mesmo o teatro ocupando um espaço diferente do habitual, não é possível essa arte se findar, pois não se findou quando chegou o cinema, a televisão e a internet. Por outro lado, ele explica que o teatro não deixará de ocupar as tecnologias, pois elas estão possibilitando muitas oportunidades. Um exemplo é o seu trabalho de doutorado, “O Desconcertante Flautista”, com um elenco dirigido a distância e com um caráter narrativo e crítico inspirado nas peças didáticas do dramaturgo alemão Bertolt Brecht.
“As cadeiras”
Milena Puchalski e Victor Lavarda e Milena Puchalski, atores em cena de “As cadeiras”.
A problemática do teatro na pandemia é retratada no Trabalho de Conclusão de Curso da aluna Pietra Keltika. Com uma pesquisa teórico-prática, o projeto engloba o processo de criação e encenação do texto “As cadeiras”, do dramaturgo parisiense Eugène Ionesco, e busca refletir um processo de criação artística em quarentena, e todas as possibilidades e dificuldades que serão encontradas e descobertas nesse período atípico.
Na pesquisa, Pietra aborda todas as etapas desse processo de criação, desde seu início com o surgimento da pandemia em que precisou aceitar a realidade remota e começar a utilizar as mídias digitais com o elenco. “Todas nossas práticas eram pensadas e contavam com a volta do presencial no início de 2021, pois a ideia era apresentar um espetáculo teatral ao público presencialmente. Entretanto, com a continuação das aulas remotas neste ano, a pesquisa precisou tomar outro rumo e agora ela é toda pensada e trabalhada para a apresentação de um projeto artístico totalmente inserido no meio digital”, comenta.
Após essas adaptações, Pietra está reestruturando todo o projeto, trabalhando e reformulando os objetivos da pesquisa para uma criação 100% digital. A discente segue com seu elenco a distância e deve finalizar e apresentar o seu trabalho no fim do semestre da UFSM, ao encerrar de agosto ou início de setembro.
Expediente
Repórter: Eloíze Moraes, acadêmica de Jornalismo e bolsista
Ilustradora: Renata Costa, acadêmica de Produção Editorial e bolsista
Mídia Social: Nathalia Pitol, acadêmica de Relações Públicas e bolsista
Edição de Produção: Esther Klein, acadêmica de Jornalismo e bolsista
Edição Geral: Luciane Treulieb e Maurício Dias, jornalistas