Você já ouviu falar em afasia? O termo, pouco conhecido, dá nome à forma limitada com que pessoas acometidas por lesão no cérebro se comunicam. Trauma encefálico, acidente vascular cerebral (AVC) e tumores cerebrais estão entre as causas que afetam a linguagem, o entendimento, a percepção e a fala em si.
A afasia é o tema do mestrado do psicólogo Gabriel Barros, no Programa de Pós-Graduação em Distúrbios da Comunicação Humana da UFSM. O interesse dele em pesquisar o tema surgiu durante o estágio hospitalar em Psicologia no Hospital Universitário de Santa Maria. “No dia a dia, eu encontrava com estas pessoas, que não conseguiam falar e nem se expressar. Era um problema confundido com demência e perda de memória. Eu via que faltava suporte e formas de instrumentalizar essa dificuldade”, relata Gabriel.
A partir disso, começou a estudar as manifestações dos sujeitos afásicos e suas subjetividades no convívio social – especialmente nas atividades coletivas realizadas pelo Grupo Interdisciplinar de Convivência (GIC), coordenado pela professora Elenir Fedosse, do Departamento de Fonoaudiologia do Centro de Ciências da Saúde da UFSM, e orientadora de Gabriel. O GIC tem como objetivo colocar os sujeitos afásicos em interação com diversas áreas, como Terapia Ocupacional, Fonoaudiologia e Psicologia.
O mestrando explica que a comunicação com pessoas afásicas se dá por meio de gestos e sinais. “Na verdade, isso ocorre com qualquer sujeito não-afásico quando faltam as palavras. É uma problemática que envolve todos no contato e no exercício diários da linguagem”, comenta Gabriel, que buscou recursos alternativos para se comunicar com as pessoas afásicos. “Elaborei pranchas de comunicação e ali fui me instigando entender a temática da afasia, de fazer com que ela fosse vista como um problema a ser solucionado”, relata.
Embora seja estudada na neurologia e exista bibliografia desde o início do século 19, a questão ficou escanteada – “parece que a ausência da capacidade de falar virou uma característica inerente à pessoa”, critica o psicólogo. Isso tem como consequência agravante o esquecimento de quem é o sujeito – e é justamente nisso que a pesquisa de Gabriel está centrada: Como considerar essa pessoa como alguém que tem desejos e vontades, embora não tenha fala?
Um dos primeiros passos é o tratamento, que consiste na reabilitação física do paciente. A técnica varia de acordo com a gravidade do caso e com a abordagem de cada terapeuta. A perspectiva utilizada pela orientadora de Gabriel é denominada enunciativo-discursiva, e consiste em trabalhar com a linguagem em convivência, na formulação e na enunciação do discurso. “Com isso, o sujeito cria caminhos próprios para lidar com a afasia”, pontua o psicólogo.
O acompanhamento leva em conta, ainda, o tipo de dificuldade – sensorial ou motora. Nessa última, o problema é basicamente na articulação, ou seja: a pessoa tem a noção do que quer falar, mas o movimento não ocorre. Já a sensorial envolve a dificuldade na compreensão do que é falado, mas ainda assim a pessoa se expressa. Como o sujeito afásico depende muito mais do outro, o trabalho está voltado a dar autonomia ao paciente, de maneira que consiga falar por si de alguma forma. O objetivo, segundo Gabriel, não é alcançar a normalidade pré-estabelecida: “É fazer com que o sujeito esteja confortável com a própria situação”.
Neste sentido, Gabriel lamenta que as pessoas – e, até mesmo, os profissionais da saúde – não conheçam a problemática, já que, normalmente, não é possível perceber o sofrimento do sujeito afásico. “A partir da problematização do tema eu encontrei vias de trazer um cuidado humanizado”, pondera o pesquisador.
Grupo Interdisciplinar de Convivência
O GIC realiza tarefas e exercícios terapêuticos, sempre respeitando os limites de cada um. Além das atividades coletivas, também há terapias individuais. Para participar do projeto é necessário preencher a lista de espera do Serviço de Atendimento Fonoaudiológico. Lá, o candidato passa por triagem para comprovar o diagnóstico de afasia e ingressa conforme a existência de vagas.
Reportagem: Martina Irigoyen, acadêmica de Jornalismo
Colaboração: Andressa Motter, acadêmica de Jornalismo
Ilustração: Marcele Reis, acadêmica de Publicidade e Propaganda