Com o avanço nas pesquisas e o desenvolvimento de tecnologias de saúde, muitas doenças já podem ser diagnosticadas e prevenidas por meio de exames simples. Ainda que pareça estranho, um dos exames mais eficazes no reconhecimento de enfermidades é a análise das fezes. O trato gastrointestinal dos seres humanos é composto por um conjunto de micro-organismos que, acumulados, caracterizam o que cientificamente conhecemos por microbiota humana.
Na análise dos resíduos intestinais, uma das preocupações dos pesquisadores têm sido o mapeamento das bactéricas presentes na microbiota, que permite pré diagnosticar muitas doenças. O professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da Universidade Federal de Santa Maria, Elgiom Loreto, explica que esse mapeamento é feito a partir de análises computadorizadas das amostras de DNA encontradas nas fezes, que são sequenciadas para compor o estudo metagenômico do paciente.
Elgiom explica que os estudos metagenômicos já permitiram a construção de um banco de dados mundial – o chamado “banco de dados HPMC” (em inglês), com o mapeamento das diferentes comunidades de micro-organismos encontradas no corpo humano.
O banco de dados HPMC fornece a classificação de mais de 1.800 amostras metagenômicas do sistema gastrointestinal humano. A análise foi feita por meio de uma seleção manual de genomas bacterianos vindos de amostras de fezes humanas, com mais de 21.000 genomas de referência adicionais, que representaram bactérias, vírus, fungos, entre outros. Ainda é um território novo, mas já se sabe que algumas doenças são causadas por um único micróbio e, outras, por um conjunto.
Os estudos de genoma e as análises de sequenciamento metagenômico estão revolucionando muitos aspectos da biologia, já que permitem descobrir uma diversidade microbiana presente em quase todos os ambientes e até então não desvendadas. No passado, essas pesquisas eram caras e demoradas, mas com o desenvolvimento de novas técnicas e tecnologias, hoje eles podem ser feitos em apenas um dia e com preços bem mais acessíveis. Isso representa um avanço para a biologia, por permitir a descoberta de formas de vidas antes inimagináveis.
O pesquisador em saúde pública da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Luis Caetano Martha Antunes, explica que a flora intestinal bacteriana se adapta muito ao nosso tipo de alimentação, mas pode ser reduzida quando praticamos uma alimentação inadequada – rica em industrializados e açúcares, por exemplo, e pobre em nutrientes. Ou seja, a microbiota está em constante mudança.
Imunidade intestinal
A microbiose intestinal é a que mais influencia na saúde humana. Segundo o Conselho Europeu de Informação Alimentar (em inglês, EUFIC), existem evidências de que os indivíduos que sofrem de determinadas doenças (como doença intestinal inflamatória ou alergias) apresentam um microbiota diferente daqueles indivíduos saudáveis. Ainda não é possível aos pesquisadores afirmar se a microbiota alterada é causa ou consequência da doença. A composição do microbiota intestinal é altamente variável mesmo entre indivíduos saudáveis. Os investigadores demonstraram que apesar de a composição variar entre indivíduos, diferentes composições podem apresentar funções similares (ou seja, a forma como certos microrganismos degradam determinados componentes da dieta ou a forma como afetam o sistema imunológico é semelhante em qualquer pessoa.
Ainda segundo o EUFIC, os microrganismos presentes no intestino desempenham um papel crucial na saúde digestiva, mas influenciam igualmente o sistema imunológico. Os tecidos imunes, presentes no tracto gastrointestinal, constituem a maior e mais complexa parte do sistema imunológico humano. A mucosa intestinal é uma grande superfície que delimita o intestino e que está exposta a antigénios ambientais (substâncias que despoletam a produção de anticorpos pelo sistema imunológico) patogénicos (que causam doenças) e não patogénicos.
Reportagem: Jéssica Loss e Luíza Tavares
Infográficos: Laura Storch