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Sobre a censura no apartheid

Em livro, o nobel sul-africano John Coetzee analisa os relatórios de seus censores



Na década de 1940 surge na África do Sul o Partido Nacional, grupo político autoritário e conservador que presidiu um período de ditadura no país, entre 1948 e 1994, responsável pelo apartheid, o regime de segregação racial que dividiu a população e marcou a história mundial. Na mesma década, entretanto, a África do Sul viu nascer um dos expoentes intelectuais de seu tempo, o escritor John Maxweel Coetzee – premiado com o Nobel de Literatura, em 2003.

 

Coetzee fez um curioso trânsito na sua formação intelectual: diplomado em Inglês e Matemática pela Universidade da Cidade do Cabo, trabalhou com programação em Londres e defendeu sua tese de doutoramento discutindo a obra de Samuel Beckett. Durante o período em que lecionou Literatura Inglesa na cidade de Buffallo, estado de Nova Iorque (EUA), foi indiciado criminalmente por ocupar, com outros professores, uma sala da universidade em protesto contra a Guerra do Vietnã. Depois de voltar por um breve período à África do Sul, Coetzee acaba se mudando para a Austrália, onde passou a viver e trabalhar.

 

É nesse período que o autor sul-africano começa o projeto que dará forma ao livro “Sobre a Censura”, realizado a partir de palestras ministradas por Coetzee em Porto Alegre e em Curitiba no ano de 2013 e publicado pela Editora UFSM. Com apoio financeiro do governo australiano, Coetzee teve acesso a documentos e pareceres de censores sobre os livros “No Coração do País”, “Vida e Época de Michael K” e “À Espera dos Bárbaros” – primeiras obras da sua bibliografia, escritos nos anos 1970, quando a África do Sul ainda vivia sob o regime do apartheid.

 

John Coetzee

 

“Na África do Sul, o governo jamais apoiou artistas. Na África do Sul, a única intervenção que o Estado fez na vida dos escritores foi impedi-los de escrever, e não os auxiliar”, relembra.  Após a eleição de Nelson Mandela, em 1994, os arquivos estatais passaram a ser abertos aos poucos. Nesse processo de redescoberta de sua própria trajetória, o autor tenta avaliar o trabalho dos censores, tentando descobrir a razão que levou a ditadura a perseguir as suas obras, traçando paralelos com a política de censura em outros regimes autoritários.

 

Coetzee tem 24 publicações, entre novelas, ficções e autobiografias ficcionais, seis delas publicadas durante o governo do Partido Nacional. Por ter vivido os anos em que a censura era intrínseca a sua condição de escritor, Coetzee desenvolveu “um interesse profissional pela censura, não apenas pelo sistema sul-africano, mas também pela censura como fenômeno histórico geral.”

 

O que instiga o autor é o fato de seus livros, mesmo com a sua linguagem combativa, terem sido liberados nos pareceres da censura. Coetzee aponta que, ao contrário do estereótipo de “meros burocratas”, os censores do Partido Nacional eram sensíveis e letrados, interessados em temáticas voltadas à literatura. Eles reconheciam o potencial literário rebuscado de Coetzee, mas imaginavam que por forma de escrita seus ideias teriam dificuldade de alcançar a população geral. Assim, Coetzee chega a três conclusões sobre a sua passagem ilesa pela censura oficial: o fato de que os seus textos não faziam alusão direta à violência do regime, que os censores admiraram o estilo do seu texto e que os eles também acreditavam que poucas pessoas o leriam.

 

A única exigência de Coetzee para a publicação de “Sobre a Censura” pela Editora UFSM foi a distribuição gratuita da obra. E assim o foi, com uma tiragem de 500 exemplares. Nas palavras do tradutor Lawrence Pereira, professor do Departamento de Letras Estrangeiras da UFSM, “o autor procura explorar aquilo que serve de fundamento para a instituição da censura em vários níveis da vida social, não apenas incluindo a censura de Estado, mas principalmente de Estados totalitários e autoritários”. Essencial para se entender a censura na África do Sul, e mesmo no Brasil e no mundo.

 

Reportagem: Mateus Martins de Albuquerque e Willian Boessio
Fotografias: Divulgação

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