Plataformas digitais potencializam formas de pensar e de fazer mídia sonora
Com a globalização, o rádio tradicional, escutado apenas pelo dial, perdeu força. Os avanços provenientes das tecnologias digitais proporcionaram às rádios criarem suas versões online. Por meio de sites, aplicativos e formatos de “web rádio”, as quais realizam a transmissão via internet, em tempo real, ou ao disponibilizar os programas na nuvem, para serem ouvidos posteriormente. Diante disso, não apenas o formato radiofônico, mas também as demais formas de comunicação, precisaram se adaptar às novas lógicas de produção e de circulação. Entre as mídias que perceberam a importância do podcast está a Revista Arco, que lançará, nesta quinta (18), o Arco No Fone. Porém, antes de mais informações sobre os episódios, você sabe a importância do formato em áudio para produzir e divulgar conteúdos?
A história do rádio, como veículo de comunicação, no Brasil, é de longa data. Em 1923, ocorreu a inauguração da primeira emissora em solo brasileiro, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, criada por Edgar Roquette-Pinto e Henrique Morize. Ao longo das décadas, as ondas sonoras levaram a casa dos brasileiros conhecimentos sobre os novos avanços na área da ciência e da literatura. Consolidou-se como um meio popular de comunicação com os programas de entretenimento, além disso a linguagem do radiojornalismo influencia ainda no século XXI a maneira de apresentar notícias.
Assim, os conteúdos produzidos no formato podcast trazem consigo marcas do gênero radiofônico junto com as adaptações proporcionadas pelos novos aportes tecnológicos. O professor do curso de Jornalismo da UFSM, Maicon Elias Kroth, pós-doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade da Beira Interior de Portugal, explica que “as plataformas digitais potencializaram formas de pensar e fazer. É interessante notar que a construção de narrativas, por exemplo, leva em conta a ideia de que os ouvintes/internautas não são meros receptores do conteúdo. Se constituem, a partir de lógicas do ecossistema digital, como coprodutores”.
No Brasil, um dos primeiros podcasts surgiu em 2006, o NerdCast, apresentado por Alexandre Ottoni e Deive Pazos, focado na cultura nerd do Brasil. Os episódios trazem conhecimentos sobre tecnologia, jogos, empreendimento, ademais possuem programas dedicados à divulgação científica. Em 2020, o NerdCast foi o mais ouvido do Google Podcasts entre 1º de abril e 29 de novembro no país.
Mas, afinal, o que é o podcast?
O podcast é um arquivo digital de áudio que pode ser inserido em várias plataformas online, como Spotify, Soundcloud, Mixcloud e entre outras. Os conteúdos desse formato são diversos, existem tanto programas que abordam questões políticas nacionais, quanto os que desenvolvem temas voltados para a ciência, como, os processos de produção de uma vacina. Enfim, os podcasts abrangem um leque diversificado de opções para os ouvintes.
As publicações dos arquivos são feitas através de podcasting, um sistema que segue um padrão de feed RSS – é a abreviatura de Rich Site Summary ou Really Simple Syndication, uma maneira de distribuição de informações em tempo real pela internet, um programa agregador de conteúdo -, o que significa que permite aos internautas acessar as publicações de um blog, de um site ou episódios de um podcast, através de uma única plataforma. A palavra podcast é junção de Pod – “Personal On Demand” (pessoal sob demanda), retirada de iPod, com broadcast (emissão e transmissão de sons ou imagens por meio do rádio ou da televisão).
Ascensão do podcast durante a pandemia do coronavírus
A Associação Brasileira de Podcasters (ABPod), fundada em 13 de Maio de 2006, possui o objetivo de coordenar, orientar e representar locutores, produtores, comentaristas e divulgadores do Podcast brasileiro. A PodPesquisa de 2020, apontou, “aplicados o número de ouvintes em 2019 de 17,3 milhões, estamos falando de um total de ouvintes entre 20 milhões e 34,6 milhões no Brasil atualmente”, sendo assim percebe-se um crescimento do hábito de ouvir esse formato de conteúdo, devido ao momento de isolamento social, por conta da COVID-19.
Além do aumento de ouvintes, ocorreu um acréscimo na criação de conteúdos em podcast e a UFSM serve como um exemplo disso. O projeto Fura Bolha , iniciado em julho de 2020, das acadêmicas de Jornalismo, Samara Wobeto e Franciéli Barcellos, possui o intuito de abordar questões relacionadas com a comunicação junto a uma linguagem mais compreensível para o público de fora da área, como a desinformação e os processos de checagem de notícias falsas. Diante disso, o projeto começou com publicações de vídeos pela rede social, Instagram, sobre como identificar notícias fraudulentas. O modo de desenvolvimento do produto audiovisual para a adaptação do podcast surgiu devido a lógica das mídias digitais: a instantaneidade. “O podcast possibilita que as pessoas façam mais coisas ao mesmo tempo quando estão ouvindo”, afirma Wobeto.
As acadêmicas conversaram com outras pessoas para debaterem sobre o produto em formato de áudio, e a maioria comentou que escutam podcast quando fazem afazeres do dia a dia. “Por isso a escolha desse segundo formato para possibilitar que ele alcance mais pessoas, na medida que ele é um tipo diferente de produto comunicacional que poderia funcionar mais a partir dos assuntos que escolhemos abordar”, ressalta a estudante.
A Revista Ciência Rural, do Centro de Ciências Rurais, da UFSM, possui um projeto de divulgação científica em vídeos, em parceria com o Núcleo de Tecnologia Educacional (NTE) da própria Universidade, com o objetivo de apresentar pesquisas com uma linguagem de fácil entendimento para quem não é da área das ciências agrárias. Com a pandemia, foi preciso procurar novas formas para a continuação da divulgação. Além da utilização das redes sociais, Instagram, Facebook e Twitter, os artigos estão disponíveis na biblioteca digital, Scielo, e possui produções de matérias para o próprio Site da Revista, precisaram começar a buscar por uma outra maneira atrativa de continuar a divulgação científica. Nesse sentido, o podcast Ciência Rural começou a ser desenvolvido baseado em projetos de outras Universidades e de outros periódicos. A jornalista que atua no setor de comunicação da Revista, Maria Luiza Carvalho de Grandi, mestranda em Comunicação pela UFSM, aponta sobre as possibilidades do produto sonoro. “O podcast nos abriu um leque com pesquisadores do Brasil inteiro, do mundo inteiro. É uma alternativa que chegou no contexto da pandemia, mas chegou para ficar, por conta dessa possibilidade de abrir para pesquisadores de outros lugares, além de Santa Maria”.
As diferenças com as outras mídias, consideradas tradicionais
O podcast tem marcas do formato radiofônico, como as entrevistas pingue-pongue – perguntas e respostas -, os debates em formato de mesa-redonda, as reportagens, os documentários em áudios e os boletins. Contudo, não possui uma estrutura fixa, como os outros formatos, consideradas tradicionais. Cada episódio pode ser contado de diferentes maneiras. Vale ressaltar que outro benefício de produzir conteúdos em podcast é o aprofundamento da temática, como relata Kroth. “Temos visto iniciativas cada vez mais interessantes em termos de construção de narrativas, como por exemplo o uso da técnica do storytelling, com o objetivo de transportar o ouvinte para dentro das histórias por meio de estratégias discursivas que exploram de maneira cada vez mais imersiva a estética sonora”. Além disso, Kroth considera o podcast um produto híbrido, diferente do rádio e das demais mídias tradicionais e sobretudo, é flexível.
Nesse viés, Wobeto discorre sobre o aprofundamento de pautas, muitas vezes, diferente da lógica dos veículos comunicacionais de referência, como o rádio, o qual possui características de hard news – notícias diárias sobre, por exemplo, política, economia e segurança pública com linguagem objetiva e inseridas na grade de programas -. Ressalta a importância do formato radiofônico, mas o podcast difere-se nessas questões. “Abre possibilidade de nichos, uma vez que você consegue se aprofundar mais em determinados temas e contar histórias com uma determinada sequência. Discussões sobre gênero, acessibilidade, racismo, enfim discussões ‘nichadas’ muitas vezes, elas não têm espaço nesses veículos mais tradicionais”. Wobeto comenta que o podcast por abarcar um público mais específico abre essa possibilidade de dialogar sobre diversos assuntos.
Os meios midiáticos tradicionais, como o consórcio Globo e o grupo da Folha de São Paulo, desenvolveram produtos no formato podcast. Ao Ponto, podcast do jornal O Globo; O Assunto, do G1; Café da Manhã e Boletim Folha, da Folha de S. Paulo. São apenas alguns exemplos de produtos em áudio e cada vez mais vão surgir novos podcast dos veículos comunicacionais, com narrativas diferentes, mas com a mesma lógica crítica de apuração jornalístico.
Qual a importância do podcast para a ciência?
O conhecimento científico precisa ser disseminado para além dos ‘muros’ das Universidades e os meios de comunicação são aliados da divulgação científica. A lógica tanto na distribuição e produção de conteúdos em formato podcast é uma ferramenta que já é e está se tornando cada vez mais importante para a difusão do conhecimento científico.
De Grandi discorre sobre como a divulgação científica é necessária para a sociedade e com a pandemia do coronavírus, pode-se perceber a urgência do conhecimento científico para a população que não é da área. “No contexto da Covid-19, o quanto você divulgar a ciência, o quanto você divulgar as informações corretas, o que a ciência está produzindo, o que está sendo pesquisado de forma correta é importante para que não haja um caos na população”.
O podcast 37 Graus, criado em 2017, pela jornalista Bia Guimarães e pela bióloga Sarah Azoubel, é um bom exemplo de como o jornalismo e a ciência juntos, são válidos para o processo de disseminação do conhecimento científico para a população. Dialogam sobre assuntos curiosos envolvendo a ciência, como descobertas que impactaram a humanidade, epidemias, até assuntos sobre a mente humana, com um tom descontraído para mostrar como o conhecimento científico pode ser e deve ser acessível e compreendido por todas e por todos.
O conhecimento divulgado em mídia sonora no horário que você quiser
Qual o seu horário favorito do dia para ouvir podcast? O produto em áudio, possibilita essa flexibilização na rotina, um dos pontos mais levantados sobre seus benefícios de produção e de consumo. Outro ponto interessante são as temáticas diversas, o ouvinte pode escolher qual conteúdo consumir, no horário que preferir. O trajeto para o trabalho, escola, faculdade, também pode ser utilizado. Em grandes centros, com trânsito e percursos maiores, o podcast é uma ‘boa pedida’ para passar o tempo. A COVID-19, colocou muitos brasileiros em home office, contribuindo para a descoberta de novos horários da rotina para consumi-lo.
Sabe aquelas tarefas corriqueiras que servem como uma desopilação do dia atarefado, como lavar a louça, cozinhar, tomar café da manhã, ou até mesmo tomar banho? Podem ser os períodos do dia certo para consumir podcast.
Está preparado para ouvir os episódios do Arco No Fone?
Após toda essa explicação sobre a importância de produzir e divulgar conteúdos pelo formato podcast, você está preparado para ouvir os episódios do Arco No Fone?
O primeiro episódio do podcast da Revista Arco foi gravado no estilo ‘mesa cast’, ou seja no formato mesa redonda, sobre questões relacionadas a vacinação contra a COVID-19, como os tipos de vacinas, como funciona uma distribuição pública e algumas dúvidas a mais sobre o tema. Os entrevistados são a Professora da UFSM, Liane Righi que possui experiência na área de Saúde Coletiva e o Médico Infectologista, Alexandre Schwarzbold que é Chefe da Unidade de Pesquisa Clínica do Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM). Além disso, vale ressaltar que a gravação e a produção do podcast foram feitas de casa, em decorrência do isolamento social necessário, devido a pandemia do coronavírus.
O editor-chefe da Revista Arco, Maurício Dias, comenta que “o podcast pode ampliar o acesso sobre a ciência da UFSM para o país como um todo, já que quebra essa barreira física, a limitação do dial”. Dias ainda ressalta como uma das vantagens do formato em áudio é a praticidade da pessoa escutar em qualquer lugar e em qualquer momento, com uma linguagem mais acessível que o texto escrito. O primeiro episódio vai ser lançado nesta quinta-feira, dia 18 de fevereiro, no Spotify, no Deezer, no Google Podcast, no Anchor, no Pocket Podcasts, no Breaker e no RadioPublic. Então, já pensou em qual podcast vai ouvir hoje?
E seguem mais algumas dicas para você
Alô, Ciência – É um projeto voltado para a divulgação científica sobre temas pertinentes para a sociedade, com diálogos em uma linguagem informal para o fácil entendimento do ouvinte que não é da área científica.
Cirandeiras – Produzido pelas jornalistas Joana Suarez e Raquel Baster, possui o intuito de escutar mulheres e suas lutas que modificam vidas, padrões e territórios. A primeira série de episódios lançados foi sobre mulheres de diferentes locais do Brasil durante a pandemia da COVID-19.
Gritos no Cast – Produzido pela equipe do projeto de extensão vinculado ao curso de Jornalismo da UFSM, Gritos do Silêncio. Buscam dar visibilidade a pautas e fontes que não possuem tanto foco nas mídias de referência.
Pandemia na Boca do Monte – Relata a passagem do vírus pela cidade de Santa Maria, como as mudanças nas rotinas dos cidadãos, além de bastidores do trabalho jornalístico nesse período. É um projeto experimental, realizado para o trabalho de conclusão de curso pelo acadêmico em jornalismo da UFSM, Felipe Backes e orientado pela professora Viviane Borelli.
Podcast Todavia – É um projeto de extensão do Departamento de Filosofia da UFSM que tem como objetivo principal divulgar a produção científica de docentes e discentes da área da filosofia e humanidades.
Põe na Estante – Produzida pela B9 Company e pela Rádio Guarda-Chuva, é um espaço de debates sobre literatura brasileira e estrangeira de autoria da jornalista Gabriela Mayer.
Projeto Humanos – Dedicado ao registro e resgate de narrativas individuais, buscam por meio do storytelling contar histórias de pessoas reais. Apresentado por Ivan Mizanzuk, o Projeto Humanos já possui quatro temporadas e a sua última foi dedicada a desenvolver “O Caso Evandro”.
Rádio Escafandro – Produção da Rádio Guarda-Chuva e da B9 Company, cada episódio uma ‘investigação jornalística’ sobre os mais diferentes temas, como política, meio ambiente, evolução humana, censura e entre muitos outros. Feito por meio de entrevistas, gravações em campo e áudios de arquivos, conectados pela narração do jornalista Tomás Chiaverini.
Rumos do Jornalismo – Os episódios possuem a proposta de discutir mudanças no contexto do profissional a partir de entrevistas exclusivas com jornalistas, pesquisadores, programadores e outros profissionais envolvidos nos estudos e nas práticas jornalísticas contemporâneas. Produzido pelo Laboratório de Experimentação em Jornalismo (LEx) da UFSM.
Toco e Tackle – Dedicado às principais notícias semanais sobre o basquete (NBA) e o futebol americano (NFL). Produzido por Jonas Faria, Jonatan Mombach e Juan Grings.
Vida de Jornalista – Com o selo da Rádio Guarda-Chuva, é um podcast para conversar sobre jornalismo com quem faz jornalismo. Episódios narrativos com bastidores em reportagens e coberturas, além de reflexões sobre a profissão, produzido pelo jornalista Rodrigo Alves.
Vidas Negras – Original do Spotify, episódios novos toda quarta-feira. O jornalista Tiago Rogero entrelaça e analisa a obra e a trajetória de personalidades da história e da atualidade.
Vozes: Histórias e Reflexões – Podcast da Rádio CBN, já está na terceira temporada e possui o intuito de promover a reflexão e conectar as pessoas às experiências umas das outras. Diferentes pontos de vistas sobre assuntos polêmicos em discussão na sociedade.
Expediente
Reportagem: Eduarda Paz, acadêmica de Jornalismo e voluntária da revista Arco
Ilustração: Yasmin Faccin, acadêmica de Desenho Industrial e bolsista
Peça de divulgação do Arco no Fone: design: Amanda Pinho, acadêmica de Produção Editorial e bolsista, e identidade visual: Marcele Reis, acadêmica de Publicidade e Propaganda
Mídia Social: Nathália Pitol, acadêmica de Relações Públicas e bolsista
Edição: Luciane Treulieb e Maurício Dias, jornalistas