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‘Noia’: Divulgação científica em linguagem de quadrinhos

Projeto da UFSM que une as áreas de Farmácia e Desenho Industrial aborda conceitos de toxicologia por meio de HQ’s



No centro de São Paulo, José da Silva acorda de um sonho ruim em crise de abstinência e sai em busca de drogas.

Descrição da imagem: Página de HQ vertical e em preto e branco. No primeiro quadro, há vários homens em diferentes posições.No segundo, há um homem e uma mulher deitados em uma cama. O homem acorda, desnorteado. No quinto quadro, detalhes do rosto do homem com a onomatopeia "ronc ronc". A mulher acorda. Os dois sentam na cama. Diálogo: Mulher: "Tá tudo bem contigo, amor?". Homem: "Tá tudo bem, vida. Foi só um sonho ruim". No quadro seguinte, a mulher está deitada e ele, sentado na cama. Há a frase "Crise de abstinência" ao lado dele. E um balão de fala com o texto: "Será que eu não tenho uma aqui?".
Início da primeira HQ do projeto de ensino 'Noia'. Reprodução.

Assim começa o primeiro número da história em quadrinhos (HQ) ‘Noia’, que faz parte de um projeto de ensino desenvolvido por alunos e professores dos cursos de Farmácia e Desenho Industrial da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). A primeira e a segunda edição já foram lançadas, enquanto a terceira parte da história está em processo de produção. “Eu queria que fosse algo que juntasse meu lado geek e fantasioso, relacionado a animes, com o lado mais nerd e hard science da toxicologia”, conta André Valle de Bairros, docente do curso de Farmácia e idealizador do projeto.

 

A proposta é unir os elementos ficcionais de construção de roteiro  das HQ’s ao conhecimento científico da área da toxicologia, com o intuito de ser uma ferramenta de divulgação científica e de ensino para alunos da área da saúde. O anti-herói José da Silva – também chamado de ‘Noia’ na HQ – é uma pessoa viciada em drogas. André Valle de Bairros explica como a vinculação entre os conceitos da ciência e a ficção acontece na HQ: “Quando o personagem faz uso de uma substância de forma intencional, os efeitos são exacerbados. Por exemplo, no momento em que ele usa  esteróides anabólicos androgênicos, vai ter uma super força, muito além da compreensão humana. Entretanto, o corpo dele sente as consequências do uso no organismo”, explica. Além do ‘Noia’, outros personagens fazem parte da história, como jornalistas, médicos, advogados e um padre. André comenta que a construção desses personagens é feita a partir de pessoas reais, que ele conhece e com quem já conviveu.

Sonho que se transforma em ciência

O projeto ‘Noia’ começou a ser posto em prática em julho de 2021. No entanto, a ideia surgiu em 2000, quando André Bairros tinha 17 anos. “Um ponto chave foi quando fui assistir X-Men no cinema. Eu fui o primeiro da fila e, ao sair, pensei em desenvolver um personagem com esta temática herói/fantasia, mas com uma pegada científica muito forte. Só que, na época, eu era adolescente e tinha limitações científicas”, relembra. Foi depois de cursar a graduação em Farmácia e o mestrado e doutorado em toxicologia, que, ao assistir outras produções cinematográficas, ele considerou que tinha a bagagem científica para transformar a ideia em projeto. A trilogia “Corpo Fechado” e o filme Power foram o ‘pontapé final’, de acordo com André. 

 

O docente, que cresceu assistindo a desenhos animados na televisão e é fã da temática da mitologia e dos super-heróis, conta que ver a primeira HQ finalizada foi emocionante. “Tu ficar mais de vinte anos com uma ideia plantada na cabeça e finalmente ver a materialização da história é difícil de descrever. Juntar coisas que você gosta em um único produto e ver que ninguém pensou nisso antes, que tem uma proposta de ensino, um lado fantasioso, um lado de entretenimento, é muito bom. Indescritível. Acho que a palavra seria magistral”, destaca.

Do roteiro ao desenho

O processo de produção da ‘Noia’ começa no prédio 26 da UFSM, no Centro de Ciências da Saúde (CCS) e é finalizado no prédio 40, no Centro de Artes e Letras (CAL). Entre o roteiro e a ilustração, a ideia vem e volta por meio de conversas, apontamentos e necessidade de ajustes. A construção da história é feita por alunos do curso de Farmácia, que também são bolsistas de iniciação científica. Marcelo Nascimento é um desses estudantes. “Partimos do pressuposto de que temos que passar informações científicas no trabalho que, no caso da HQ, são os mecanismos de ação das drogas”, informa. Ele destaca que a base científica está em como funcionam as drogas, quais ações ela tem no corpo, os efeitos adversos que causa e como aquilo afeta o personagem. André Bairros destaca que, além desses, outros conceitos da toxicologia e do processo de produção científica são abordados na história, a depender do caminho que ela segue no roteiro. Exemplos são a qualidade do ar, incêndios que ocorrem em locais fechados, o conceito de dependência, o funcionamento de clínicas de reabilitação, como se faz pesquisa no Brasil e a função e importância de comitês de ética.

 

Construir a história que vai ser desenhada vai além de escrever o roteiro, uma vez que este também tem elementos como a visualização da cena, busca de referências e apontamentos de sentidos que se quer passar por meio da linguagem. “E aí, com o roteiro já definido, de como a história vai se decorrer, passa para a ilustração”, explica Marcelo. Quem ilustra é Afonso Montagner Maia, estudante de Desenho Industrial. Ele conta que esta é a primeira experiência profissional com história em quadrinhos. “Eles mandam o roteiro e eu começo a desenhar em papel, com caneta normal. Aí passa para o computador e faço lá”, descreve.

Descrição da imagem: Fotografia horizontal e em tons de preto e branco, de vários desenhos, em preto e branco, espalhados uns por cima dos outros. O desenho em destaque, na parte inferior esquerda da imagem, tem vários olhos desenhados.

Afonso é orientado por André Dalmazzo, docente do curso de Desenho Industrial nas disciplinas de Quadrinhos e Ilustração. “Cada projeto requer um tipo de linguagem. No caso do Afonso, ele tem uma linguagem que tem uma força gráfica muito adequada para o tipo de desenho da HQ. Não é uma questão só de desenho, é uma questão de narrativa, de combinar o verbal com o visual”, enfatiza. Para Dalmazzo, o visual deve ampliar e complementar o verbal: “O importante é achar a linguagem certa e saber usá-la a favor da narrativa”, ressalta. 

“O desafio é traduzir o que o roteiro manda e ajudar visualmente a equilibrar, para que alguém leigo possa ler e entender”, evidencia Afonso. Dalmazzo aponta que a criação com base em um contexto científico torna o processo de produção da HQ mais desafiador. “Nesse sentido, é até mais difícil: tivemos que falar de um assunto sério, que tinha muito conteúdo e até é um tanto abstrato, e explicar visualmente. Teve que ter todo um cuidado ético”, enfoca. Marcelo se sentiu feliz quando viu o resultado final: “Noventa por cento do que está desenhado passou pela minha cabeça quando eu estava escrevendo. E isso foi surreal”, relata.

Divulgação científica

A divulgação das HQs acontece por meio de redes sociais, como o Facebook, e grupos de WhatsApp, a exemplo dos que reúnem professores e membros da Sociedade Brasileira de Toxicologia (SBTOX), da qual André faz parte. “Quando o produto final é lançado, é incrível a recepção. É muito efervescente a emoção da galera, todo mundo gosta”, menciona. O projeto, que foi apresentado no Congresso Brasileiro de Toxicologia, gerou retornos positivos. “A perita criminal da história é uma amiga minha e eu falei que ela está na HQ. Ela falou: ‘Nossa, adorei, tenho casos para dar pra vocês’”, conta. 

Para André, a resposta mais emocionante foi de seu filho, que tem dez anos. “Ele disse: ‘foi tu que criou, da tua cabeça, pai?’ Eu disse ‘sim, fui eu’. E ele respondeu: ‘Ah, então eu também posso’. Ou seja, ao mesmo tempo, também estimulei o meu filho a pensar em personagens para ele, no mundo dele’, complementa.

Expediente:

Reportagem: Samara Wobeto, acadêmica de Jornalismo e bolsista;

Design gráfico: Noam Wurzel, acadêmico de Desenho Industrial e bolsista;

Mídia social: Eloíze Moraes, acadêmica de Jornalismo e bolsista; Rebeca Kroll, acadêmica de Jornalismo e voluntária; e Gustavo Salin Nuh, acadêmico de Jornalismo e voluntário;

Edição de Produção: Samara Wobeto, acadêmica de Jornalismo e bolsista;

Edição geral: Luciane Treulieb e Maurício Dias, jornalistas.

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