À medida que o novo coronavírus avança, a ciência busca formas de tratamento e protocolos capazes de frear a proliferação do vírus. Além disso, os dados de pacientes da covid-19 também revelam alguns padrões de infecção, como a proporção de homens e mulheres doentes. Embora os indicadores oficiais apontem para a maior incidência da doença em pessoas do sexo
masculino, ainda não há um consenso sobre os motivos sobre esse número.
De acordo com o governo do estado do Paraná, que se destaca pela transparência em relação à pandemia, até do dia 27/05 a proporção de contaminados do sexo masculino era de 48% e do sexo feminino de 52%. Entretanto, quando comparado os óbitos, 67% das mortes registradas pelo novo coronavírus foram de homens – 108 das 162 -, uma taxa de letalidade aproximada de 6,1%, contra 2,8% em mulheres.
Mesmo que esses dados sejam preliminares – uma vez que os casos da covid-19 estejam em expansão -, outros estudos apontam para números semelhantes. Uma pesquisa realizada na China estudou mais de 44 mil casos confirmados em três províncias. Ao analisar os dados, os cientistas concluíram que a taxa de contaminação entre os sexos é semelhante: 51,4% dos casos
em homens e 48,6% em mulheres. Entretanto, a taxa de óbitos era bem mais desproporcional: 36,2% das mortes foram de pessoas do sexo feminino e 63,8% do sexo masculino. A taxa de letalidade do doença no país foi de 2,8% em homens e de 1,7% em mulheres.
Mortalidade de homens é maior em pandemias
E não é dessa pandemia que o sexo frágil para doenças respiratórias é o masculino. Durante a Gripe Espanhola, em 1918, a taxa de mortalidade de homens foi superior a de mulheres nos Estados Unidos, conforme destaca um estudo realizado no ano 2000.
Na epidemia da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), causada por um agente da família do coronavírus, ocorrida entre 2002 e 2003, 53,2% dos homens que contraíram a doença vieram a óbito. Em contraposição, a taxa de mortalidade no sexo feminino foi de 42,3%, de acordo com uma pesquisa publicada na Revista Frontiers in Public Health. Ainda durante a
epidemia, um estudo conduzido em Hong Kong, demonstrou que a taxa de mortalidade em homens era superior do que em mulheres na região, 21,9% contra 13,2%.
Durante o surto da Síndrome Respiratória do Médio Oriente (MERS), outra epidemia causada por coronavírus, 63% dos indivíduos contaminados pela doença eram do sexo masculino, conforme aponta uma pesquisa publicada no periódico Emerging Microbes and Infections.
Fatores biológicos e culturais contribuem para letalidade
Apesar de os estudos destacarem a diferença do número de infectados, ainda não há um consenso sobre os motivos que geram essa disparidade. Pesquisadores apontam para algumas características biológicas e outras culturais como fatores para compreensão desse cenário. Práticas sociais como o tabagismo, que é um fator de risco para a doença, é duas vezes maior
entre os homens do que entre as mulheres no Brasil. Na China, essa proporção é ainda maior, 52,1% da população masculina fuma e apenas 2,7% têm esse hábito. Outras comorbidades, como a diabetes, a hipertensão e problemas cardíacos, também são mais detectáveis em homens, o que pode ser um fator de explicação para os números. Além disso, pesquisas também ressaltam
algumas questões biológicas.
Um estudo brasileiro conduzido por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e publicado na plataforma bioRxiv, destaca que pessoas do sexo masculino acima de 60 anos apresentam uma redução da expressão de um gene chamado TRIB3 nas células do pulmão – órgão mais afetado pelo novo coronavírus. Os pesquisadores acreditam que esse pode ser um
dos motivos porque homens desenvolvem casos mais graves da covid-19 e o que o resultado pode auxiliar na busca por possíveis alternativas de cura.
Pesquisadores europeus relacionam a severidade da doença em homens com a concentração de ACE-2, uma enzima que atua como receptora do Sars-CoV-2. Ao analisar mais de 2 mil pacientes, os cientistas concluíram que a concentração da ACE-2 é mais alta em homens, o que pode ser um fator de vulnerabilidade para o doença. Outro estudo, este realizado no país por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), destaca que a grande concentração de ACE-2 eleva o risco de contaminação pelo novo coronavírus.
Embora esses estudos possam fornecer algumas respostas para o elevado índice de contaminação e de letalidade da covid-19 em homens, as pesquisas ainda não respondem a pergunta de maneira efetiva. O sexo biológico não é o único fator determinante para explicar os números do novo coronavírus. Os hábitos culturais, os papéis sociais desempenhados pelos atores e a presença de outras comorbidades também devem ser analisadas para entender a contaminação e o comportamento do vírus. A medida que a pandemia avança e se modifica no mundo, é preciso estar atento às novas pesquisas e as transformações nos estudos científicos,
para que seja possível pensar estratégias de combate e enfrentamento à doença de acordo com as características de cada sociedade..
Mitômetro Coronavírus é um projeto de checagem de fatos da revista Arco voltado para a temática da pandemia com o objetivo de combater a desinformação.
O projeto é desenvolvido pela equipe da revista e tem a colaboração de egressos do curso de Jornalismo da UFSM e de estudantes da disciplina de Checagem de Dados e Eleições, do curso de Jornalismo da Universidade Franciscana.
Compreenda os selos:
Comprovado – fato com evidências científicas e que pode ser explicado a partir de relatórios, documentos e pesquisas confiáveis e com metodologias factíveis.
É possível – selo para uma checagem com elementos reais. Não há comprovação 100% em função de determinados indícios, detalhes ou situações.
Depende – é o meio termo entre o que é mito e a verdade. Não existe um consenso entre as fontes e os especialistas. Também usado para quando faltam evidências ou para destacar que o fato pode ocorrer em uma determinada situação.
Improvável – refere-se a uma situação com pouquíssima possibilidade de ser real.
Mito – não existe possibilidade alguma de ser verdade. Existem evidências que provam o contrário. Enquadram-se aqui as teorias da conspiração, as lendas da internet e as noticias falsas.