Uma linha. Uma ponte. E, em apenas alguns passos, é possível deparar-se com outra língua, com diferentes hábitos, com uma nova cultura. No meio de tudo isso, estão pessoas que, cotidiana ou esporadicamente, compartilham da fronteira como lugar onde essas diferentes línguas, hábitos e culturas convivem em uma tumultuada harmonia.
Foi na intenção de entender como as pessoas se apropriam desse território de fronteira que Francieli Rebelatto, orientada pela professora Luciana Hartmann, redigiu sua dissertação no mestrado em Ciências Sociais em 2011: Atravessando a ponte, vivendo na linha: marcos e marcas de uma cultura de fronteira à luz da fotoetnografia. Para tanto, durante o curso, Francieli viajou diversas vezes ao encontro de seu objeto de pesquisa: as fronteiras das cidades de Santana do Livramento (Brasil) e Rivera (Uruguai) e de Uruguaiana (Brasil) e Paso de los Libres (Argentina).
Ainda na graduação em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo na UFSM, Francieli teve o primeiro contato com o que viria a se tornar seu objeto de estudo. Em 2006, como estudante do curso de Jornalismo, Francieli participou do Projeto Rondon, uma iniciativa do governo brasileiro na qual universitários vão às mais distantes comunidades carentes, contribuindo para o desenvolvimento do lugar através de projetos de extensão. Foi na expedição que levou o grupo até a cidade de Tabatinga, no Amazonas, que Francieli conheceu as fronteiras do Brasil com a Colômbia e o Peru.
De lá, Francieli voltou fascinada com a troca cultural presente nas fronteiras. A nova paixão virou objeto de estudo e resultou na sua monografia e, mais tarde, na dissertação. Francieli constatou, ainda em seus estudos iniciais, que as regiões de fronteira não eram retratadas na grande mídia como lugares de riqueza cultural, e buscou as Ciências Sociais para dar uma abordagem antropológica à sua pesquisa.
Já no mestrado, Francieli fundamentou sua pesquisa com os conceitos do antropólogo francês Marc Augé, lugar antropológico e não-lugar. Segundo o autor francês, por lugares antropológicos podemos compreender aqueles lugares com os quais criamos vínculos, por exemplo, onde moramos ou onde trabalhamos. Já não-lugares são os locais de passagem, de consumo, com os quais não criamos relações.
A esses conceitos Francieli aliou a metodologia de fotoetnografia. Assim como a etnografia, que vai a campo buscar o contato direto com o objeto, a fotoetnografia exigiu que Francieli estivesse em pleno contato com a fronteira. Mas em vez de lápis e papéis à mão, foi com uma câmera fotográfica e suas lentes que a pesquisadora fez seu diário de campo.
Através de sua inserção no campo, entrevistas, observações e, claro, das fotos, Francieli buscou retratar o sentimento de pertencimento e o oposto, a falta de vínculos das pessoas com essas regiões de fronteira. Os não-lugares são representados pelas fotos em movimento, poluídas visualmente, trazendo o olhar do viajante. Já os lugares antropológicos trazem as características próprias daquele lugar, as pessoas e a cultura.
Em vez de lápis e papéis à mão, foi com uma câmera fotográfica e suas lentes que a pesquisadora fez seu diário de campo
Os dias nas fronteiras Brasil–Argentina e Brasil–Uruguai renderam a Francieli um ensaio fotográfico em que buscou representar a cultura própria desses lugares. A dissertação trouxe à pesquisadora o questionamento: Fronteira, limite ou passagem? Se o que responde a pergunta é o olhar do sujeito sobre o local, seguem algumas das muitas fotos feitas por Francieli Rebelatto em seu diário de campo.
Repórter: Natascha Carvalho
Fotografias: Francieli Rebelatto