Ao chegar ao restaurante, você se acomoda à espera de alguém que lhe atenda. O garçom chega com o cardápio, e então você faz o pedido. No entanto, em vez de esperar pela entrega do prato pronto, você é convidado a ir à cozinha para auxiliar os chefs na escolha e no preparo dos alimentos. A experiência, ainda que cause estranhamento, faz com que você saia da zona de conforto. No âmbito das salas de aula, essa é a proposta das metodologias ativas: incentivar o envolvimento dos alunos no processo de ensino, tornando-o mais horizontal e efetivo.
O termo engloba as técnicas que quebram rotinas tradicionais de sala de aula, como estudos de caso, simulações e debates – conhecidas há anos pelos alunos brasileiros. No entanto, foi a partir de 2010 que o conceito de metodologias ativas ficou conhecido no país, adaptado pela incorporação das tecnologias da informação e comunicação (TICs) como ferramentas de aprendizagem.
Em qualquer dos formatos, o processo de ensino deixa de ser atribuído apenas ao professor, tornando-se um trabalho coletivo, que demanda a multiprofissionalidade. “O professor não é mais professor. Ele passa a ser um curador, um orientador, que guia e instiga o aluno. Nesse sentido, é fundamental contar com as orientações pedagógica e tecnológica”, explica Gisele Santiago, doutora em Agronomia pela UFSM e pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática na Universidade Franciscana (UFN), onde pesquisa sobre o ensino de genética mediado por metodologias ativas, empregando uma de suas ramificações, o ensino híbrido – o qual, por sua vez, compreende técnicas como a sala de aula invertida e a rotação por estações.
Alunos ativos
Os discentes desempenham papel fundamental no processo de ensino-aprendizagem: “O professor pode propor, mas tudo depende de o aluno querer, se não vai voltar a ser uma sala de aula tradicional. O aprendizado é algo muito particular e depende do indivíduo”, explica Gisele, que elucida: as metodologias ativas pressupõem a maturidade e o compromisso do aluno em aprender.
Essa mudança fez com que a turma de Bernardo Moro, acadêmico de Enfermagem da UFSM, reagisse com estranhamento aos debates, leitura e produção de cartazes propostos pelo professor de uma disciplina. “Foi difícil aceitar que uma dinâmica poderia ensinar mais do que algo copiado do quadro. A gente pensa que o jeito que aprendeu a vida toda é o certo”, relata o aluno.
Segundo o técnico-administrativo da UFSM Alberto Pedro Antonello Neto, que estudou sobre o ensino híbrido em seu mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional e Tecnológica, defendido em 2017, o desconforto inicial com as novas técnicas faz parte do processo. “No sistema tradicional de ensino, o aluno aguarda passivamente a transmissão do conteúdo pelo professor”, pontua o servidor, ressaltando a importância da capacitação docente para melhorar a aceitação e o aproveitamento por parte da turma. Neste sentido, Alberto Pedro ressalta que o Núcleo de Tecnologia Educacional (NTE) é um dos setores que oferece cursos de aperfeiçoamento para os professores, com foco no emprego de tecnologias nas salas de aula.
Mudanças na base
O professor do Departamento de Matemática do Centro de Ciências Naturais e Exatas (CCNE) Ricardo Fajardo, que há 20 anos coordena um projeto de extensão que usa técnicas lúdicas para explicar matemática às séries finais do ensino fundamental, defende: “Para a escola básica mudar, é preciso que a universidade mude, porque a formação dos professores acontece aqui”.
Para expandir a aplicação de metodologias ativas na UFSM, Gisele argumenta que são necessárias adequações pontuais no Projeto Pedagógico Institucional (PPI) da Universidade. A Técnica em Assuntos Educacionais da Pró-Reitoria de Graduação da UFSM Juliane Paprosqui Marchi da Silva ressalta que o PPI vigente, aprovado em 2016, dá abertura para que os professores inovem em sala de aula. Ela explica que a UFSM, por ser relativamente antiga, trabalha com base em disciplinas e departamentos, enquanto novas universidades estão organizadas de maneira a possibilitar maior contato dos alunos com projetos e problemas reais. “Uma mudança estrutural na UFSM seria complexa, e dependeria da alteração da Estatuinte, nosso maior documento”, explica Juliane, que esteve envolvida na construção do PPI.
Os resultados obtidos pelo professor em conjunto com a turma, ao final do semestre, foram positivos – como apresentados nos gráficos abaixo, feitos com base nos números levantados por Thayse:
A pesquisa da acadêmica vai ao encontro da opinião de Bernardo, aluno da Enfermagem: “Não importa se o professor tem apenas um quadro negro e um giz. Se ele tiver criatividade para passar o conteúdo, e o aluno estiver disposto a aprender, o ensino vai ser efetivo”. Diante disso, o senso comum de que as salas de aula brasileiras e os professores estão atrasados, enquanto alunos se atualizam, é colocado em xeque.
Reportagem: Andressa Motter, acadêmica de Jornalismo
Diagramação: Lidiane Castagna, acadêmica de Desenho Industrial
Ilustração: Pollyana Santoro, acadêmica de Desenho Industrial
Lettering: Deirdre Holanda, acadêmica de Desenho Industrial
Fotografia de capa: Thomás Dalcol Townsend