Parceria internacional entre a NASA (Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço), a ESA (Agência Espacial Europeia) e a CSA (Agência Espacial Canadense), o desenvolvimento do Telescópio Espacial James Webb (JWST) teve início em 1989. O principal objetivo do projeto é observar o Universo em comprimentos de onda mais longos do que a luz visível. Para isso, o telescópio conta com uma suíte de câmeras de última geração, espectrógrafos e cronógrafos – o primeiro capta a luz em diferentes comprimentos de onda e o segundo mede o tempo.
O Grupo de Astrofísica da UFSM, coordenado pelo professor Rogemar Riffel, liderou uma das propostas aprovadas para observação com o telescópio James Webb. No total, foram 250 projetos selecionados. Além do grupo da instituição, somente uma proposta liderada por instituições brasileiras foi aprovada. A seleção ocorreu através de uma chamada para o primeiro ano de operação.
Na maioria dos observatórios astronômicos terrestres, no entanto, somente pesquisadores de países e instituições que financiaram o desenvolvimento das operações conseguem concorrer nas chamadas. Porém, como o JWST ficará voltado ao espaço, uma parte pequena do tempo de observação estará disponível para outros cientistas no mundo.
“É um telescópio espacial com previsão de lançamento para 24 de dezembro de 2021. É um equipamento moderno capaz de captar a radiação emitida por objetos astronômicos na faixa do infravermelho do espectro eletromagnético. Ele possibilitará a observação das primeiras galáxias formadas no Universo, regiões de formação estelar e planetas em formação fora do sistema solar, com características semelhantes à Terra”, comenta o professor Rogemar Riffel. Ele será lançado através do foguete Ariane 5, no Espaçoporto europeu da Guiana Francesa.
Grupo observará buracos negros supermassivos
A ideia dos pesquisadores da UFSM é estudar o papel de ventos de gás molecular e da radiação, produzidos no disco de acreção (acumulação de matéria na superfície de um astro pela ação da gravidade) no entorno de buracos negros supermassivos no centro de galáxias próximas, na evolução de galáxias – o chamado feedback de núcleos ativos de galáxias.
Com o Telescópio Espacial James Webb será possível mapear a cinemática do gás molecular morno (com temperaturas de centenas de Kelvins), quente (aproximadamente 2.000 Kelvins) e ionizado, em detalhes sem precedentes. O projeto prevê observações de três galáxias próximas (NGC3884, CGCG012-070 e UGC08782 – localizadas de 300 a 600 milhões de anos-luz da Terra), nas quais os buracos negros centrais estão capturando matéria ativamente.
As galáxias foram selecionadas por apresentarem ventos de gás molecular potentes. “A compreensão da física associada aos buracos negros e seus efeitos na evolução de galáxias é fundamental para entender o Universo e, de certa forma, a nossa origem”, destacou Riffel. Foram programadas cerca de 16,2 horas de telescópio para as observações.
Mas afinal, o que é um buraco negro?
O espaço é um lugar extremamente escuro, de acordo com a Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço dos Estados Unidos (Nasa). Mesmo assim, há áreas mais escuras que outras. É o caso dos buracos negros: não existe nada mais escuro do que eles.
Um buraco negro é uma área de gravidade imensa, em que nada – nem mesmo a luz – pode escapar. Qualquer elemento que chegue perto de um, como uma estrela ou um planeta, por exemplo, é esticado e comprimido em um processo conhecido como “espaguetização”.
O professor Rogemar Andre Riffel, do Grupo de Astrofísica da UFSM, explica: “Buracos negros se formam naturalmente no universo, como resultado do processo de evolução de estrelas massivas ou no centro de galáxias. Em particular, os supermassivos, formados no centro de galáxias, parecem desempenhar um papel importante na evolução delas”.
Primeiro registro
A primeira imagem de um buraco negro foi capturada em 2017 e apresentada pelas agências espaciais da Europa e dos Estados Unidos em abril de 2019. O registro foi feito pelo Telescópio do Horizonte de Eventos (Event Horizon Telescope), do centro da galáxia de Messier 87 (ou M87), há cerca de 53 milhões de anos-luz de distância de nosso planeta – 1 ano-luz corresponde à distância que a luz percorre em um ano, equivalente a cerca de 9,5 trilhões de quilômetros.
No entanto, de acordo com o professor Rogemar Riffel, é errado pensar que os telescópios identificam o buraco negro em si. “Os telescópios detectam apenas a luz emitida pelo disco de gás que alimenta o buraco negro. Tais fenômenos são invisíveis não somente a olho nu, mas também com telescópios. O que nosso olho e o telescópio detectam é a luz”, ilustra. Ou seja, o que os telescópios detectam é a luz emitida pelo disco de gás que o buraco negro se alimenta e não o buraco negro – ele é invísivel.
Supermassivos e estelares
A alimentação de um buraco negro se dá através de um disco de acreção – estrutura formada por materiais difusos em movimento orbital ao redor de um corpo central –, o qual, além de nutri-lo, produz uma enorme quantidade de energia, emitida na forma de luz, ventos de gás e jatos de partículas. Essa energia liberada pode interagir com o gás galáctico e evitar que novas estrelas sejam formadas e, dessa forma, afetar a evolução da galáxia.
Entretanto, no geral, esse fenômeno não tem nenhum poder devastador. “No centro da nossa galáxia tem um buraco negro de quase 4 milhões de massas solares e nem sequer sentimos sua presença. Somente se está capturando matéria (tem alimento próximo a ele), pode ter algum poder destrutivo da formação de novas estrelas em galáxias”, argumenta Riffel.
Há dois tipos de buracos negros mais estudados: estelares e supermassivos. Os estelares se formam no final da vida das estrelas – na maioria das vezes ela infla, perde massa, esfria e o núcleo se reduz de tamanho – e a quantidade de massa pode ser 20 vezes maior do que a do Sol. Quando a massa colapsa em um ponto muito pequeno, forma-se um buraco negro.
A segunda espécie, por sua vez, tem massa maior que 1 milhão de sóis – podendo chegar a mais de 10 bilhões. Os cientistas encontraram provas de que toda grande galáxia contém um buraco negro supermassivo no centro. Segundo o professor Rogemar, o do centro da Via Láctea é chamado “Sagittarius A*” e possui massa equivalente a 4 milhões de sóis – um sol equivale a cerca de 335 mil vezes a massa da terra.
“Os buracos negros supermassivos se formaram quando o Universo era jovem, possivelmente junto com as primeiras estrelas e galáxias do Universo. Eles crescem a partir da captura da matéria que está em sua volta e evoluem juntamente com a galáxia que o hospeda”, acrescenta o pesquisador.
Expediente
Reportagem: Eloíze Moraes, acadêmica de Jornalismo e bolsista
Revisão: Gustavo Salin Nuh
Créditos das Imagens: National Aeronautics and Space Administration – NASA (Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço, em português)
Design e Tratamento de Imagem: Noam Wurzel, acadêmico de Desenho Industrial e bolsista
Mídia Social: Eloíze Moraes, acadêmica de Jornalismo e bolsista; Caroline de Souza, acadêmica de Jornalismo e voluntária; Alice Santos, acadêmica de Jornalismo e voluntária; Rebeca Kroll, acadêmica de Jornalismo e voluntária; e Martina Pozzebon, acadêmica de Jornalismo e estagiária
Edição de Produção: Samara Wobeto, acadêmica de Jornalismo e bolsista
Edição Geral: Luciane Treulieb e Maurício Dias, jornalistas