Com o aumento dos casos de dengue no Brasil, uma dúvida que surgiu entre a população é sobre o uso de medicamentos como aspirina e ácido acetilsalicílico (AAS) para o tratamento da doença. Segundo o Ministério da Saúde, em 2022 os casos de dengue no Brasil cresceram 43,9%. O Rio Grande do Sul já registra, neste ano, mais do que o dobro do número de casos autóctones confirmados em 2021 – quando a contaminação acontece dentro de um mesmo local. No ano passado, foram 3.906 casos e, neste ano, já são 10.536 casos.
O professor Eduardo Flores, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva (DMVP) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), afirma que esse aumento pode estar relacionado a dois fatores. O primeiro é que em 2020 e 2021 pode ter havido subnotificação e, portanto, o que se registra nesses anos não é um aumento de casos, mas sim das notificações. O segundo ponto é o favorecimento das condições climáticas para a proliferação e a reprodução dos mosquitos, o que pode ter beneficiado esse aumento.
De acordo com o professor, os aumentos de casos de dengue no Brasil estão relacionados a segunda variável. O calor e o clima úmido proporcionam maior proliferação do mosquito, enquanto na temporada de temperaturas mais frias a reprodução tende a diminuir. Por isso os picos de casos de dengue nas regiões sul e sudeste ocorrem no final do verão e no início do outono, entre fevereiro e março, que é quando há maior população de mosquito circulando e, consequentemente, mais atividade do vírus.
Eduardo Flores explica que o vírus da dengue é dividido em quatro grupos: DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4. Cada um dos tipos causa doenças parecidas, mas raramente circulam ao mesmo tempo e no mesmo local. De acordo com o pesquisador, por existirem quatro tipos de dengue, uma pessoa só poderá ser infectada pelo vírus um total de quatro vezes ao longo da vida. É importante ressaltar que, se contrair um tipo de dengue, após o período de infecção, o indivíduo se torna imune ao tipo contraído.
Os sintomas da doença são a febre alta acompanhada de dor de cabeça, dores no corpo e nas articulações, fraqueza, dor atrás dos olhos e erupções cutâneas – pequenas manchas vermelhas presentes em 20% ou 30% dos casos. A Revista Arco preparou um mitômetro para saber se, em caso de suspeita da doença, faz mal ingerir medicamentos como ácido acetilsalicílico (AAS) e aspirina.
O problema da automedicação
Por apresentar sintomas comuns, a dengue pode ser confundida com outras doenças, como a gripe. De acordo com Ana Paula Ferreira, farmacêutica da Farmácia Escola da UFSM, os medicamentos utilizados no tratamento de gripes e resfriados não são indicados em caso de suspeita de dengue. A farmacêutica alerta para prestar atenção em casos registrados na região, uma vez que os sintomas podem estar relacionados à dengue, além de evitar os medicamentos com salicilatos na composição, principalmente o ácido acetilsalicílico (AAS) e anti-inflamatórios em geral, como Diclofenaco, cetoprofeno, ibuprofeno e nimesulida.
A farmacêutica Melina Renz, também da Farmácia Escola, lembra que, embora não seja tão comentado, outro tipo de medicamento que deve ser evitado são os corticoides. Esse tipo de anti-inflamatório não é recomendado por não existirem estudos que comprovem a eficácia no tratamento da doença. Segundo a farmacêutica Claudia Silveira, também da Farmácia Escola, a automedicação para alguém que já tem uma doença pré-existente pode agravar o quadro, uma vez que muitas pessoas desconhecem seu organismo e não sabem se têm alergia a algum medicamento.
O Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) alertam sobre a importância de observar a composição do medicamento, para evitar aqueles contra indicados no caso de suspeita de dengue. Ana Paula ressalta que, em caso de dúvidas e na ausência de acesso a um médico ou posto de saúde, pode-se consultar um profissional farmacêutico, a fim de tirar dúvidas sobre os medicamentos que devem ser evitados em caso de suspeita da doença.
Reações e efeitos da Aspirina e Ácido acetilsalicílico (AAS)
Ana Paula Ferreira esclarece que o ácido acetilsalicílico (AAS), anti-inflamatório não esteróide, também conhecido como Aspirina, é uma droga usada para ‘afinar o sangue’: ela diminui a agregação plaquetária, o que minimiza a coagulação sanguínea. Uma das consequências da dengue, em sua forma mais grave, é a hemorragia. No momento que a pessoa ingere um medicamento que dificulta a coagulação, há mais chances de que a hemorragia aconteça.
Eduardo Flores informa que a dengue hemorrágica é a forma grave da doença: em geral, entre 95% e 99% das pessoas têm febre, ficam em repouso e se recuperam. No entanto, até 2% dos casos se agravam na chamada dengue hemorrágica. Esse tipo da doença ocorre principalmente quando o indivíduo foi infectado com um tipo de dengue e tem nova infecção com outro tipo entre dois e quatro anos depois da primeira vez. A imunidade prévia não protege contra o tipo diferente de dengue, e ainda pode agravar o caso.
De acordo com Ana Paula, a orientação geral é evitar os anti-inflamatórios, uma vez que eles mexem com a cascata da agregação plaquetária e podem causar sangramentos. Os derivados do Ácido Acetilsalicílico (Aas) são os que têm mais efeitos nesse sentido. A farmacêutica ressalta que não são somente medicamentos de uso oral que podem ter consequências no agravamento do caso. O Gelol – analgésico em forma de pomada utilizado para tratamento de contusões, reumatismos, dores musculares e torcicolos – tem Salicilato de metila na composição e inclui na bula a recomendação de não ser utilizado em caso de suspeita de dengue. Mesmo que pequena, o Gelol pode promover uma absorção de seus componentes, e não é possível saber de que forma o organismo infectado pela dengue vai reagir à substância.
Em caso de suspeita de dengue
Marila Marchiori, farmacêutica da Farmácia Escola UFSM, afirma que a principal recomendação ao ter febre alta, dor de cabeça, dor nos olhos e cansaço, é fazer tratamento não medicamentoso por meio da ingestão de bastante líquido e procurar atendimento médico.
Não existe um tratamento específico para a dengue, o que se faz é um tratamento sintomático, utilizando medicamentos que aliviam os sintomas da doença mas não agem sobre a causa. Claudia Silveira chama a atenção para a nomenclatura dos medicamentos, uma vez que muitos são conhecidos pelo nome comercial e não atentam para a composição, que pode ter contraindicação. Por isso, aconselha-se sempre a leitura da bula ou a busca por informações sobre o medicamento com o farmacêutico.
Veredito final: Comprovado!
Em caso de suspeita de dengue, não tome ácido acetilsalicílico (AAS) ou aspirina. Esse é um medicamento que dificulta a coagulação, o que facilita a ocorrência de hemorragia – uma das consequências da dengue em sua forma mais grave. A orientação geral é evitar anti-inflamatórios, porque todos são potenciais causadores de sangramentos. Os derivados do Ácido Acetilsalicílico são os mais propensos a esse efeito. Sempre procure um médico e, antes de ingerir um medicamento, leia a bula e/ou tire suas dúvidas sobre o medicamento com o farmacêutico.