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Arco Entrevista Alencar Zanon, um dos autores de estudo sobre produção de soja e redução de desmatamento no Brasil

Estudo publicado na Nature Sustainability alia aumento de produção agrícola à preservação ambiental



Maximizar o lucro do produtor rural com o mínimo impacto ambiental é um dos objetivos da Equipe FieldCrops e de seu coordenador, o professor Alencar Zanon, do Centro de Ciências Rurais (CCR) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Desde 2017, dada a sua experiência na área, o docente aliou-se a uma rede de pesquisa interuniversidades, o projeto Global Yield Gap and Water Productivity Atlas . Em 10 de outubro, a parceria resultou na publicação do artigo “Protecting the Amazon forest and reducing global warming via agricultural intensification” (Protegendo a floresta amazônica e reduzindo o aquecimento global por meio da intensificação agrícola, em português) na renomada revista Nature Sustainability


O feito é oriundo do trabalho de universidades e instituições de pesquisa brasileiras (UFSM, Universidade de São Paulo, Universidade Federal de Goiás, Embrapa Arroz e Feijão), argentinas (Universidad de Buenos Aires e Conicet) e norte-americana (University of Nebraska).

Descrição da imagem: Fotografia horizontal e colorida em tons de verde. No centro, um homem de pele branca está agachado em meio a uma plantação de soja. Ele usa boné branco com aba verde, veste camiseta verde clara e calça jeans azul escura. As plantas de soja estão em tamanho médio, e tem cor verde claro. A plantação se estende até o horizonte, onde encontra algumas árvores verde escuras e o céu azul claro.

O estudo aponta uma alternativa para a questão, outrora antagônica, entre produção agrícola e preservação ambiental: a intensificação. Isto é, por meio de pesquisas e políticas públicas, pode-se aumentar a produtividade de uma lavoura, sem precisar avançar em novos territórios. Assim, os pesquisadores detém-se à soja, principal nome da exportação brasileira, e ao bioma Cerrado. Com isso, o Brasil poderia aumentar a produção anual do grão em 36% até 2035 e, ainda, reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 58%. 

 

Além disso, o artigo lembra que a expansão da soja na Amazônia equivale a um terço das terras convertidas para tal finalidade no Brasil entre 2015 e 2019. Dessa forma, os autores das universidades e institutos em pesquisa presentes na publicação querem evitar que se cumpra a previsão de que o Brasil usará 57 milhões de hectares para a produção de soja nos próximos 15 anos, com um quarto da produção em terras ambientalmente frágeis. A Revista Arco conversou com o professor Alencar Zanon para entender mais sobre o assunto:

ARCO: O estudo afirma que o Brasil fez progressos notáveis no fomento da produção agrícola nos últimos 50 anos, tornando-se um grande país exportador de soja, milho e carne bovina. No entanto, grande parte do aumento da produção agrícola ocorreu devido à expansão das terras agrícolas e não à produtividade delas. O que fez com que esta última não fosse realizada?  

Alencar: O que acontece no Brasil, como um país em desenvolvimento, é que temos muitas áreas que são aptas para a agricultura. Por conta  dessa aptidão agrícola do nosso país, é natural que os produtores busquem expandir novas fronteiras. Em virtude do espírito empreendedor, da coragem que o produtor tem em semear em novas áreas, e também pela aptidão do nosso solo e clima, é que nós tivemos essa expansão, transformando o Brasil de um produtor incipiente de soja ao maior produtor mundial. Então, eu resumo em: solos aptos para a agricultura e um bom clima, os quais permitem que cultivemos hoje mais de 40 milhões de hectares de soja com sustentabilidade.  

 

ARCO: Nesses 50 anos de avanços, não foi investido em produtividade de terras? 

Alencar: Na verdade, foi. Nós tivemos grandes revoluções que permitiram o aumento de produtividade nas áreas, só que a área cultivada era pequena. Sendo assim, quando comparamos o aumento de produtividade com o aumento da área cultivada, isso faz com que os maiores aumentos na produção total venham de novas áreas. Se formos analisar, quando a soja ganhou um espaço grande como cultura agrícola no Brasil, a produtividade era de 1,5 mil quilos de soja por hectare. Hoje, a produtividade é de 3 mil quilos de soja por hectare. A produtividade aumentou em 100%. Mas, se olharmos no cenário geral, como houve expansão de 20 milhões de hectares, nos anos 2000, para 42,5 milhões de hectares em 2022, a maior parte da produção vem dessas áreas novas. 

ARCO: O que o artigo sugere, então, é que, mesmo com a grande produtividade que temos até agora, é preciso aumentá-la nas terras já existentes, em vez de avançar para novas áreas?
Alencar: No artigo, dissemos que há uma oportunidade de aumentar a produtividade na atual área agricultável sem precisar adentrar novas áreas. Em outras palavras, comparando o Brasil com outros dos maiores produtores de soja no mundo – Estados Unidos e Argentina – somos o país que mais pode aumentar sua produtividade por hectare. Esse é o grande lance do Brasil, diferente dos países mencionados, que têm uma margem muito pequena para aumentar a produtividade, nós temos uma margem considerável para produzir mais na mesma área, sem a necessidade de expandir para novos espaços. Por mais que nossa produtividade seja boa, podemos melhorar.
É isso que o artigo cita como Rendimento Explorável. Nos biomas Pampa e Mata Atlântica, essa oportunidade é pequena. Já no Cerrado, há uma margem grande. Para aumentar a produtividade da soja no Brasil, com sustentabilidade, devemos focar no Cerrado.

 

ARCO: Como é possível analisar o cenário da produção agrícola no Brasil?

Alencar: Chamamos de BAU ou business-as-usual, (tendência atual, em português) o cenário do que aconteceu nos últimos 15 anos e projeta para o futuro a mesma tendência. É como se continuássemos fazendo o que estamos fazendo agora. Isto é, produtividade e expansão de áreas. Então, ele é muito perigoso, porque vai acarretar em um desmatamento muito grande. Não queremos esse cenário. Já no cenário no cropland expansion (sem expansão de terras agrícolas, em português) ou NCE somente o mesmo ganho de produtividade é mantido, porém, não há expansão às novas áreas. Nesta perspectiva, há pouco ganho econômico, comparado com a tendência de produção atual de soja.
Por fim, nós propomos o terceiro, o cenário intensification , INT, (intensificação, em português) de melhores práticas de manejo nas lavouras de soja. Nele, reduz-se o impacto negativo da conversão de novas áreas para a produção desse grão. Assim, assume-se que os produtores aumentarão sua produtividade, ficando próximos de produzir os valores da máxima lucratividade. Esse cenário seria o ideal. Mas, para isso acontecer, precisa haver um investimento muito grande em pesquisa, desenvolvimento e políticas públicas. Isso seria espetacular se ocorresse, porque continuaríamos a produzir grandes quantidades de soja, cuja produção cresceria até 2035, porém, reduzindo drasticamente o impacto ambiental. Ou seja, produziríamos com sustentabilidade. Para que isso seja possível, dependemos de investimentos altos oriundos dos setores público e privado em pesquisa e desenvolvimento, principalmente a nível de lavouras de produtores. 

ARCO: Você afirma que, para ser eficaz, a intensificação exigiria políticas e fiscalização adequadas. Quais políticas e práticas são essas?

Alencar: Seriam editais em que haveria um investimento muito grande de recursos financeiros. Também deve ser onde nós, universidades, e os demais institutos de pesquisa, pudéssemos aplicar e usar esses recursos para mostrar para os produtores como aumentar a produtividade da soja por meio da intensificação diretamente em suas lavouras.  É isso que precisamos: focar recursos para que instituições públicas e privadas se habilitem a ir nas lavouras mostrar ao produtor como ele deve proceder para produzir na mesma área, sendo sustentável. 

 

ARCO: Aplicando as práticas que são propostas pelo artigo, em quanto tempo os resultados poderão ser vistos?

Alencar: Em 15 anos, os resultados serão fantásticos, se conseguirmos aplicar as práticas. Isso significa que produziremos 162 milhões de toneladas de soja, sem desflorestar e reduzindo o aquecimento global em 58%.

ARCO: É possível citar exemplos de ações que já ocorrem nesta perspectiva?

Alencar: Devemos intensificar as ações que são feitas em lavouras de produtores. Aqui na UFSM, há a Equipe FieldCrops, que faz justamente isso, pesquisa On Farm e On Demand. Isto é, fazemos pesquisas de acordo com a necessidade do produtor dentro de sua própria lavoura. Logo, isso é um exemplo prático de como podemos aumentar a produção de forma sustentável. Além disso, são práticas muito simples de serem implementadas, inclusive por quem já tem um negócio consolidado, pois estamos falando da melhoria da época de semeadura, colocar a quantidade correta de adubação, colocar a cultivar certa. Então são práticas relativamente simples e que podem ser utilizadas em todos os tipos de lavouras. Temos trabalhos em lavouras desde Nova Palma, onde o produtor tem 15 hectares, até produtores grandes de 8 mil hectares no Maranhão.  

ARCO: O artigo destaca a preocupação com a preservação ambiental ao mesmo tempo em que aponta para a necessidade de utilizar os commodities como respaldo econômico. De que forma é possível equilibrar essas duas perspectivas?

Alencar: É preciso intensificar a quantidade de pesquisas realizadas dentro da lavoura e permitir que os produtores tomem decisões de práticas de manejo com base nos dados gerados dentro de suas lavouras.
Há um outro estudo que demonstra isso, o artigo “
Field validation of a farmer supplied data approach to close soybean yield gaps in the US North Central region (Validação em lavouras com base em uma abordagem de dados de produtores para diminuir a lacuna de produtividade na região Centro-Norte dos Estados Unidos, em português), realizado nos Estados Unidos. Foi usada a mesma metodologia do nosso trabalho e provou-se que, fazendo pesquisa On Farm e gerando dados, em 80% das vezes foi possível aumentar a produtividade e a lucratividade das lavouras. Essa é a forma como conseguimos conciliar o aumento da produtividade, do ganho econômico, com a redução do impacto ambiental. 

 

ARCO: Como funciona a rede de pesquisadores que está envolvida na pesquisa e como se chegou à proposta do artigo e seu olhar ao Brasil?

Alencar:  Fazemos parte de um projeto global que já está presente em 75 países. É o Global Yield Gap Atlas (Gyga). Trata-se do maior projeto da atualidade de segurança alimentar a nível global. Ele engloba 15 culturas agrícolas. É um projeto liderado pela Universidade de Wageningen, na Holanda, e a Universidade de Nebraska, nos EUA, com a participação de diferentes universidades no mundo inteiro, como a UFSM. Nós já tínhamos essa hipótese, de que o Brasil consegue manter o desenvolvimento econômico preservando os recursos naturais. Com a pesquisa, pudemos demonstrar isso através do estudo publicado. Isso se pode fazer através da intensificação dos cultivos.

Expediente:

Entrevista: Gabrielle Pillon, acadêmica de Jornalismo e bolsista da Agência de Notícias;

Design gráfico: Cristielle Luise, acadêmica de Desenho Industrial e bolsista;

Mídia social: Eloíze Moraes, acadêmica de Jornalismo e bolsista; Nathália Brum, acadêmica de Jornalismo e estagiária; e Gabriel Escobar, acadêmico de Jornalismo e bolsista;

Edição de Produção: Samara Wobeto, acadêmica de Jornalismo e bolsista;

Edição geral: Luciane Treulieb e Mariana Henriques, jornalistas.

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