O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) nasceu em 1960 e, desde então, desempenha papel substancial para a ciência brasileira. Na Universidade Federal Santa Maria, sua criação como Centro Regional Sul se deu há 22 anos, através de uma parceria entre a Universidade, que cedeu o espaço físico do campus em um contrato de 50 anos, e o Inpe, que teve o compromisso de construir o prédio e de abrigar nele colaborações científicas de natureza inovadora.
Isto de fato foi feito. É o que prova as já conhecidas pesquisas do Inpe na Antártica e Oceano Atlântico Sul; a operação do nanosatélite NanosatC-Br1; além das contribuições a respeito de clima e tempo. Neste percurso, porém, houve alguns contratempos: a divisão pouco específica dos espaços do prédio entre UFSM e Instituto, e as próprias questões financeiras foram determinantes para a grande mudança que ocorre nesta semana. Com a PEC do Teto dos Gastos Públicos aprovada em 2016, o Novo Regime Fiscal diminuiu drasticamente o investimento para pesquisas científicas.
Essa situação fez com que o Centro Regional Sul tivesse de escolher entre fechar as portas ou tratar com a Universidade uma nova política de gestão. Assim, após dois anos de negociações, chegou-se ao dia 3 de abril de 2018, quando será assinado o novo convênio da parceria entre o Inpe e a UFSM. O evento acontece na Reitoria, às 10h30, e contará com a presença de autoridades, como representantes da Prefeitura de Santa Maria e do Exército Brasileiro.
Para esta ocasião a Universidade receberá o diretor-geral do Inpe, Ricardo Magnus Osório Galvão. Graduado em Engenharia de Telecomunicações pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em 1969, o diretor é mestre em Engenharia Elétrica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e doutor em Física de Plasmas Aplicada pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) nos Estados Unidos. Galvão já geriu outros órgãos científicos importantes: foi diretor do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) de 2004 a 2011, e também presidente da Sociedade Brasileira de Física (SBF) de 2013 até ser nomeado diretor do Inpe, em setembro de 2016.
A Revista Arco conversou com Galvão para dimensionar o impacto destas mudanças e mensurar as estratégias que poderão vir em seguida.
ARCO: Pensando no público leigo, que muitas vezes não conhece o trabalho desenvolvido pelo Inpe: quais são os principais serviços e produtos desenvolvidos pelo Instituto?
Galvão: O Inpe é um instituto de pesquisas espaciais e sua principal missão é promover o avanço científico em ciências espaciais e a utilização de seus produtos para o benefício da sociedade brasileira. Nomeadamente, alguns dos produtos mais em evidência para o público leigo são a previsão numérica do tempo e estudo de mudanças climáticas feitos pelo CPTEC. Esta coordenação do Inpe é responsável por fornecer os dados necessários para praticamente todas as previsões meteorológicas feitas no país, com enorme relevância para várias aplicações, como agricultura, previsão de desastres naturais e de períodos de seca, navegação marítima e aérea, etc. O Inpe também realiza o monitoramento, por imagens de satélites, de desflorestamento e queimadas na Amazônia e outros biomas, em particular o cerrado, fornecendo os dados essenciais para as ações de controle exercidas pelo Ibama. Ainda, o monitoramento da incidência de descargas elétricas em todo o país, fornecendo dados essenciais para as ações do Operador Nacional do Sistema Elétrico, bem como o monitoramento dos efeitos de erupções solares, relacionadas com o chamado Clima Espacial, que, em condições adversas, pode afetar sistemas de telecomunicações, GPS, etc. Além disso, o Inpe é responsável pela produção do Atlas Brasileiro de Energia Solar que permite o planejamento de instalações de produção de energia elétrica fotovoltaica.
Também cabe ao Inpe projetar, desenvolver e controlar satélites artificiais para aplicações em sensoriamento remoto e missões científicas, com os satélites Amazônia 1, CBERS 4A, NanosatC-Br1, UbatubaSat, satélite SPORT, em colaboração com a NASA, etc. Através desta atividade, o INPE permite ao país ter o domínio soberano de uma tecnologia de grande relevância para a sociedade.
ARCO: Há um contingenciamento orçamentário em curso que poderá enxugar os centros regionais do Inpe?
Galvão: Em primeiro lugar, não houve contingenciamento orçamentário este ano, como no ano passado. O que houve foi uma redução orçamentária de cerca de 39% na Lei Orçamentária Anual deste ano, em relação ao valor do ano passado, que acabou sendo contingenciado.
Felizmente, a Secretaria Executiva do MCTIC está fazendo grande esforço para recompor o orçamento de suas unidades de pesquisa e já obteve notável êxito. Esta semana fomos comunicados de que o orçamento do Inpe terá um acréscimo de R$ 16.091.090,88, sendo R$11.623.955,70 referentes à recomposição do patamar de empenho 2017 mais R$ 4.467.135,18 de valor adicional.
Em particular, quero deixar claro que não há nenhuma determinação de “enxugar” ou fechar os centros regionais. Esta informação é absolutamente despropositada! Ao contrário, através da criação da Coordenação do Centros Regionais, o Inpe está fazendo grande esforço em promover as atividades nesses centros, em associação com as universidades junto às quais estão sediados.
O principal problema que está, de fato, afetando as atividades desenvolvidas não somente nos centros regionais, mas em todo o Inpe, é a forte taxa de redução de seu quadro de pessoal, devido principalmente às aposentadorias, sem perspectiva de recuperação em futuro próximo através de concursos públicos. Mas esse é um problema que afeta a todas as unidades de pesquisa do MCTIC e interpretá-lo como ação diretamente focalizada nos centros regionais não é correto.
ARCO: Como o senhor, como gestor, percebe os impactos cotidianos desta mudança, e as consequências de tamanho corte de verba para pesquisas?
Galvão: Algumas das pesquisas que ocorrem no CRCRS – Centro Regional Sul de Pesquisas Espaciais contam com a colaboração de pesquisadores da UFSM. Neste contexto, o Inpe assinará um novo acordo de colaboração com a UFSM que define, de forma bastante clara e objetiva, o compartilhamento de suas instalações no campus da Universidade e os encargos de cada instituição. Este instrumento permitirá uma redução dos custos de manutenção pelo Inpe, de forma que parte do orçamento que era utilizada no custeio de serviços poderá ser utilizada nas atividades finalísticas no CRCRS.
Reportagem: Taísa Medeiros
Fotografias: Infocampus UFSM/Arquivo e Marcos Santos/USP Imagens
Ilustrações: Pollyana Santoro