Dias atrás, enquanto caminhava pela cidade, vi um menino que andava de bicicleta e, sem nenhum pudor ou medo, soltava as mãos do guidão e abria os braços como asas, feliz da vida, descendo a rua em alta velocidade.
Invejei-o. Como invejei aquele menino em uma fração de segundos que ele passou por mim! Invejei-o como há muito não invejava algo ou alguém.
Não o invejei só porque ele fazia isso com a tranquilidade e a maestria de um profissional, ou porque ainda por cima de tudo conseguia fechar os olhos e sorrir sentindo a brisa batendo em seu rosto enquanto o peso de seu corpo o levava sem destino, mas principalmente porque ele, embora corresse um risco real – já que não possuía nenhum equipamento de segurança e a via por onde andava não era das mais tranquilas com relação ao trânsito de outros veículos que o ultrapassavam desarvorados às seis da tarde – não se importava com o que acontecia ao seu redor.
Aquele menino não tinha antes nem depois. Senti inveja dele porque simplesmente não parecia estar indo para lugar algum. Ele sequer parecia ter vindo de qualquer lugar. A vida dele naquele instante era somente entrever sua existência gargalhar contra o vento, sem lhe passar pela cabeça o perigo da queda sobre a bicicleta desassegurada. Vida em estado puro, movimento-sopro que se refratava no instante de sua passagem.
Aquele menino era tudo o que eu também queria ser. Trajeto sem destino, ponto de partida misterioso, ponto de chegada sem controle.
Fração de vida que preferia, em uma breve passagem, ser por inteiro, esquecer os para sempre e os por enquanto inventando um soluço de tempo entre os dois.
Aquele menino era apenas existência contra o vento, riso solto, e só.
*Cristian Poletti Mossi é formado em Desenho e Plástica – Bacharelado e Licenciatura e atualmente cursa Doutorado em Educação na UFSM