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Aceleração e desaceleração social como reflexos da crise climática 



Texto por: Amanda Spohr Demamann

A Teoria da aceleração social na vida moderna estabelecida por Hartmut Rosa define o tempo como um ciclo de retroalimentação. A sensação crônica da incessante falta de tempo fez com que a sociedade buscasse por dispositivos que possibilitassem a economia dele, como meios de transporte, de comunicação e de produção, uma espécie de “aceleração técnica”, conforme explicita o autor (Rosa, 2019). Apesar de correspondida, a demanda parece não ser suficiente: ao passo em que a sociedade busca por mais inovações que possam contribuir na economia de tempo dos afazeres diários, ele segue, cada vez mais rápido. É uma engrenagem coletiva que faz indivíduos sentirem-se como um hamster, correndo incessantemente na sua roda. 

Entretanto, em um mundo que tudo se torna tão rápido, há limitadores de velocidade naturais, desses que não podem ser modificados. Recentemente, o excesso de chuvas que atingiu o Rio Grande do Sul causou uma crise sem precedentes em diversas regiões, expondo o paradoxo de uma desaceleração forçada (Rosa, 2019) versus a aceleração de outros processos, como o do voluntariado e das produções noticiosas. 

No contexto de uma ruptura abrupta no tempo, a emergência da suspensão de atividades mercadológicas, escolares, e de outros nichos se deu porque grande parte das cidades ficaram submersas e foram destruídas pelas forças das águas, alterando as lógicas de funcionamento dos centros urbanos e das rotinas produtivas. As restrições de mobilidade em razão de deslizamentos em pistas e queda de pontes, a falta de acesso à água potável, energia elétrica e informação, e o aumento da demanda de atendimentos hospitalares fizeram com que o processo de desaceleração fosse sentido também pela população que não residia nessas regiões, mas de formas diferentes. Caracterizado por Rosa (2019) como uma espécie de freio, esse fenômeno de desaceleração forçada – nesse caso, encarado como uma resposta da natureza à intervenção humana – resultante de uma inércia acelerativa, decorre de um limitador natural e acontece quando a própria natureza reduz a sua capacidade frente ao processamento de ações humanas. 

Por outro lado, quem esteve na linha de frente dos resgates e do voluntariado – ao organizar abrigos e cozinhas solidárias, arrecadar donativos, processar uma lógica de entrega às cidades, atuar no atendimento hospitalar ou mesmo na produção noticiosa – vivenciou uma aceleração do tempo. Esse, por sua vez, não parecia ser suficiente para atender às demandas dos desabrigados ou resgatar aqueles que esperavam por ajuda em cima dos telhados das suas casas. Se para esse grupo o tempo não passava enquanto o resgate não chegava, para os voluntários cada minuto importava, instituindo uma situação paradoxal. A sensação de estar à frente do combate fez, inclusive, com que muitas pessoas se sentissem impotentes perante à crise climática e humanitária que se instalou no estado. 

Neste sentido, a cobertura jornalística ininterrupta também evidenciou uma necessidade ampliada da produção de notícias e dos próprios profissionais da área. A emergência da crise, apesar de restringir a mobilidade, não foi impedimento para que muitos jornalistas estivessem nos lugares afetados, e produzissem seus materiais in loco, salientando a relação existente entre o jornalismo e o tempo presente socialmente compartilhado. A demanda por informações constantemente atualizadas, ao mesmo tempo em que o acesso à informação era exclusivo de regiões não afetadas pela chuva, expôs, novamente, o paradoxo da inércia e do movimento, em que, de acordo com Rosa, encontramos movimentos de aceleração e desaceleração em equilíbrio, sem que se possa identificar a dominância em um dos sentidos (Rosa, 2019, p.179).

Apesar da intensidade aceleradora demonstrada pelo jornalismo, passado um mês do início das chuvas, ele voltou a se estabelecer nos conformes do dia a dia. As pautas, agora, permeiam o campo da reestruturação do Estado, mas não são mais as únicas a ganharem espaços nos meios de comunicação, ao mesmo tempo em que a cobertura sobre esses acontecimentos já não parece ser tão mais intensa. No reflexo do tempo social, o jornalismo passa, neste momento, por um processo de desaceleração, tal qual as populações diretamente afetadas pelas enchentes. Por outro lado, levando em conta a ideia de equilíbrio de Rosa (2019), as atividades nos centro urbanos vão se restabelecendo aos poucos e dentro da normalidade possível, fazendo a roda da engrenagem voltar a girar.

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