Histórias de superação, narradas com emoção e bom humor,
foram a tônica do 4º Salão de Inovação e Empreendedorismo, que atraiu um
público de cerca de mil pessoas para o Centro de Convenções da UFSM na tarde e
noite de quinta-feira (9). Promovido pela Agência de Inovação e Transferência
de Tecnologia (Agittec), o evento proporcionou à comunidade palestras de quatro
personalidades de renome no meio em que atuam, seja o futebol, o humor, o
jornalismo, a música ou as causas ambientais.
Levando o público às gargalhadas, o primeiro palestrante foi
o ex-jogador de futebol Sandro Sotilli. Maior artilheiro da história do
Campeonato Gaúcho, com 111 gols marcados, hoje ele se dedica a uma inusitada porém
bem-sucedida carreira como humorista nas redes sociais. Ele contou um pouco de
sua trajetória, desde os tempos de menino, na pequena cidade de Rondinha (RS),
quando já sonhava em ser jogador, passando pela adolescência como seminarista
que desistiu da vida religiosa (à qual a família o tinha destinado) para concretizar
o sonho de infância.
Embora tenha jogado no Internacional, único clube grande em
sua carreira de cerca de 20 anos no futebol, o público lembra dele como o centroavante
oportunista e carismático em cada um dos inúmeros times pelos quais atuou,
principalmente no interior do Rio Grande do Sul mas também em outros estados,
incluindo ainda temporadas no México e na China.
Ao pendurar as chuteiras, em 2014, pensou em assumir outra
função nos gramados, a de técnico. Tentou inclusive entrar para a política,
candidatando-se a deputado estadual. Ambas as tentativas foram em vão. Mal
sabia ele que iria se reinventar em um ramo muito diferente e de forma
totalmente involuntária. Um fã seu (“mais colono do que eu”, ironiza), Bruno
Pires Schroder, da cidade de Santa Rosa, criou um perfil fake de Sotilli no Twitter (e posteriormente também no Facebook),
no qual despejava comentários sarcásticos das atualidades futebolísticas,
principalmente as relacionadas à dupla Grenal. Isso misturado a gozações com
hábitos típicos dos “colonos”, como os bailes de interior movidos a cerveja
barata e ao som de “bandinhas”.
Essa brincadeira despretensiosa cresceu tanto que hoje
Sandro e Bruno são, não só amigos, mas também sócios na carreira de humoristas,
atraindo diversos patrocinadores.
“Não é fácil, gente. Ninguém sabe o que eu treinava, o que
eu me esforçava. Porque eu queria ser sempre o melhor, eu queria aparecer no Globo Esporte (…), eu queria chegar em
casa e ver a satisfação do meu pai, da minha mãe e dos meus irmãos”, relembra
Sotilli.
A próxima a subir ao palco foi Geysa Borini, sócia da Assobio Soluções Socioambientais, instalada na cidade de Botucatu (SP). Ela apresentou
ao público o conceito de negócios sociais, no qual se baseia a sua empresa. Ele foi
desenvolvido pelo economista bengali Muhammad Yunus, vencedor do Prêmio Nobel
da Paz em 2006, que com sua política de microcrédito retirou da miséria milhões
de pessoas em seu país. Geysa conheceu o trabalho dele durante um intercâmbio
na Índia e, desde então, vem tentando aplicar parte de seus ensinamentos no
Brasil.
Para ela, os negócios sociais reúnem o melhor de dois mundos
distintos: como qualquer outra empresa, persegue o lucro, mas também se
preocupa com o meio ambiente e o bem-estar da população mais pobre, da mesma
forma que uma organização não-governamental (ONG). No caso da Assobio, o foco é
ajudar empresas (incluindo as de grande porte) a lidar com as exigências da
legislação ambiental e a cumprir demandas da Justiça e do Ministério Público,
incluindo termos de ajustamento de conduta e de compromisso de recuperação
ambiental.
Reflorestamento, projetos personalizados, licenciamento e
monitoramento ambientais são os principais “produtos” oferecidos pela Assobio,
que Geysa fundou junto com sua sócia Marina Andrade, ambas formadas em
Agronomia pela Universidade de São Paulo (USP). A sua crença na
sustentabilidade como base para o desenvolvimento é o que as faz, como
mencionado na palestra, “levantar da cama todos os dias”.
“O negócio social, sim, ele quer ganhar dinheiro. Nós
queremos ganhar dinheiro, nós precisamos ganhar dinheiro. E, como uma ONG, nós
também queremos causar impacto social”, afirma Geysa.
“Dinossauro analógico” confesso, o jornalista Marcelo Canellas,
repórter especial da TV Globo, foi o próximo palestrante. Prestes a completar
30 anos de profissão (é jornalista formado pela UFSM), ele declarou-se encantado com a
visita que fez antes da palestra ao Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica
(Cappa), projeto desenvolvido pela universidade no município de São João do Polêsine.
Ele citou o ainda inexplorado potencial turístico da riqueza paleontológica da
região como um desafio a ser enfrentado pelos empresários e instituições locais.
Da mesma forma que a riqueza da região precisa ser
desencavada debaixo do solo, Canellas enxerga na profundidade do conteúdo um
fator diferencial para os comunicadores que queiram se destacar no concorrido
mundo virtual, em um momento em que os meios tradicionais da comunicação de
massa (jornal, rádio, TV) se encontram em crise.
Fez o público rir e refletir com anedotas pitorescas da vida
de jornalista, contou bastidores da sua atuação na Globo e relembrou o trabalho
que mais lhe marcou em toda a sua carreira: a premiada e impactante série de
reportagens sobre a fome no Brasil, que foi ao ar em 2001 no Jornal Nacional.
Falou ainda dos trabalhos sociais que desenvolve junto à TV
Ovo em Santa Maria, incluindo o projeto de um novo centro cultural para jovens de
baixa renda e o site Cronicaria.
“Diferentemente do que é cantado aos quatro ventos, de que é
necessário reduzir os textos, de compactar, de usar uma linguagem de memes, de
usar uma linguagem sintética, inovar hoje é apostar na profundidade. É apostar
na prospecção, é apostar no contexto”, opina Canellas.
Para fechar a noite, Thedy Corrêa, vocalista do Nenhum de Nós, subiu ao palco não só para cantar alguns dos maiores hits da banda
(acompanhado pelo público), mas principalmente para falar sobre como a música
pode inspirar a inovação, seja nas pessoas individualmente ou nas empresas e
instituições.
Fez analogias entre diversos tipos de empresas, e seus
respectivos funcionários e públicos, com diferentes estilos musicais (erudito, samba,
rock, folclórico) e comparações dos papéis que cada um desempenha dentro de uma
organização com os membros de uma banda de rock (baterista, baixista,
guitarrista, tecladista, vocalista), mostrando de que forma cada um pode ser
decisivo para o sucesso ou fracasso de uma empreitada, seja ela musical ou não.
E usa exemplos da história de 31 anos de sua banda para mostrar a importância
de cada componente.
Para ele, a música é uma “guloseima para o cérebro”,
apoiando-se em pesquisas do neurocientista e escritor Oliver Sacks. Ela faz os
dois lados do cérebro trabalharem ao mesmo tempo: com o ritmo, põe em ação o
lado esquerdo, ligado à lógica e à matemática, e com o sentimento, faz
despertar o lado direito, afeito às emoções.
Em sentido metafórico, decidir que instrumento e que estilo
musical se quer tocar é o caminho para encontrar soluções criativas.
“Para a gente chegar nas soluções criativas, não é fácil e
não se ensina na escola a ser criativo. Aquela história de ‘pensar fora da
caixa’… Eu até não sou muito favorável a essa expressão, porque parece que
nos colocaram primeiramente dentro de uma caixinha e então a gente tem que sair
dela”, conclui Thedy.
Texto: Lucas Casali
Fotos: Gabrielle
Coradini, acadêmica de Jornalismo e bolsista da Agência de Notícias