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Geoparques Caçapava e Quarta Colônia recebem certificação da Unesco

Além do certificado, o Geoparque Caçapava foi premiado como exemplo de “Boas Práticas”



Cerimônia reconheceu o trabalho realizado nos dois territórios (Foto: Deni Zolin, Grupo Diário)

Após momentos de aflição vividos no Marrocos, por conta do terremoto que atingiu a região na noite de sexta-feira (08), a emoção e a alegria tomaram conta dos representantes dos Geoparques de Caçapava e Quarta Colônia, na cerimônia de recebimento do selo de territórios mundiais da Unesco, que ocorreu neste sábado (9), por volta das 14 horas (horário de Brasília). 

A entrega da certificação ocorreu no Complexe Culturel Mohamed VI des Habous, em Marrakesh, no Marrocos, em um espaço montado para a cerimônia após a interdição do prédio onde o evento aconteceria inicialmente. O início da solenidade contou com um minuto de silêncio pelas vítimas da tragédia.

No momento da certificação, 18 novos territórios foram reconhecidos pela Unesco e Caçapava e da Quarta Colônia foram os primeiros a serem chamados para a cerimônia. O certificado foi recebido por Jacielle Sell, em nome da Quarta Colônia, e por André Borba, por Caçapava. “Foi um momento muito esperado. É a coroação de um processo de muito trabalho, entrega e dedicação de muitas pessoas. Foi muito legal ver o reconhecimento de tudo que a gente sempre sonhou e acreditava que ia acontecer.”, comenta Jaciele, diretora do Geoparque Quarta Colônia e coordenadora da Rede Nacional de Geoparques.

Parte da equipe brasileira durante a certificação (Foto: Naiane Dotto)

A mesma perspectiva é compartilhada por Flavi Ferreira Lisboa Filho, Pró-Reitor de Extensão da UFSM. “Eu enxergo esse momento como a coroação de um trabalho conjunto alavancado pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), seus docentes, técnico-administrativos em educação, estudantes e, em especial, os extensionistas, que não medem esforços para ir a campo, estar em contato com as pessoas, com as instituições, com os territórios, com as comunidades e trabalhar no dia a pela transformação social dessas realidades”, afirma o pró-reitor. Além disso, ele destaca, também, a importância da atuação conjunta para o êxito do projeto. “Esse momento reflete o resultado de um trabalho sério que envolveu UFSM, Universidade Federal do Pampa, com seu campus em Caçapava do Sul, prefeituras, entidades da regiões dos territórios e, principalmente, pessoas. Sem essas parcerias, os Geoparques não seriam viáveis”, reflete.

Sobre a cerimônia de certificação, Jaciele relata, ainda, a emoção do recebimento deste reconhecimento em meio a um cenário tão triste como o vivido naquele país no último dia. “Algo que nos marcou muito foi que durante a cerimônia, a todo momento, ouvíamos o som das ambulâncias de fundo. Então não tinha como esquecer o que estava acontecendo do lado de fora. Vivemos um momento histórico e bastante simbólico, porque o evento reúne uma grande quantidade de profissionais da área da geografia, da geologia, então todo mundo estava querendo entender mais sobre o que estava acontecendo. Muitas falas foram no sentido de que ‘é sobre isso que a gente estuda’, sobre entender os processos da natureza, conhecer o que acontece e como acontece e entender toda vulnerabilidade social envolvida. Porque as áreas de maior destruição e maior prejuízo são sempre nas periferias. Então tudo isso é falado, comentado, pensado enquanto estamos recebendo essa certificação. E esse é um dos objetivos do Geoparque: fazer com que as pessoas melhorem as condições de vida que elas têm, que elas entendam o meio que elas vivem e que a gente consiga entender o que está acontecendo de forma mais acertada”, finaliza.

Exemplo de boas práticas

A certificação como Geoparques Mundiais da Unesco não foi o único motivo de comemoração para a delegação brasileira. O Geoparque Caçapava recebeu o prêmio “Boas Práticas” da Rede Global de Geoparques pelo incentivo e qualificação da Novelaria Santa Marta e de seu processo produtivo. O ateliê produz novelos de lã com tingimento natural através do uso de plantas adaptadas ao bioma da região. Além de artesanal, a produção não deixa resíduos e o que sobra das tintas é utilizado na produção de aquarelas.

Novelos produzidos pela Novelaria Santa Marta (Foto: Divulgação Novelaria)

André Borba, coordenador científico do Geoparque Caçapava, explica que esse reconhecimento é dado para as melhores iniciativas dos Geoparques e a indicação para o recebimento, parte dos avaliadores que estiveram no território em 2022.

“O reconhecimento se deu ao trabalho desenvolvido pela Novelaria, que atua de forma completamente artesanal. Inicialmente, a lã é lavada com sabão feito do sebo da própria ovelha, depois ela é cardada e fiada por processos artesanais, como a roca de pedal, algo muito tradicional da cultura gaúcha, posteriormente, ela é tingida com infusões, como se fossem chás, de ervas nativas ou hortaliças. É um processo todo artesanal e muito tradicional do Rio Grande do Sul, então é um tipo de empreendimento que chamou muito a atenção dos nossos avaliadores”, explica André. 

Além disso, o empreendimento de Marta Teixeira Silveira fica localizado dentro do Geossítio Guaritas, o mais importante do geoparque Caçapava. Na propriedade, que tem uma parceria com os Geoparques no sentido de qualificação e estímulo do trabalho desenvolvido, é possível ter a “Experiência do Cordeiro ao Novelo”, onde o visitante conhece o rebanho de ovelhas as raças e os cachorros ovelheiros. Depois, é explicado sobre a lã produzida e as pessoas são convidadas para ver o processo artesanal de manufatura dessa lã, desde lavar, cardar, fiar, fazer o novelo e o tingimento.

No vídeo, Flavi mostra as certificações e os prêmios que os Geoparques Caçapava do Sul e Quarta Colônia trazem na mala da 10ª Conferência Internacional dos Geoparques Globais da Unesco 2023 para o Rio Grande do Sul.

Marlova Jovchelovitch Noleto, diretora e representante da Unesco no Brasil, ressalta a alegria com o reconhecimento dos dois novos geoparques brasileiros e elogiou o trabalho realizado pela Universidade Federal de Santa Maria nos territórios.

O primeiro passo para um futuro com desenvolvimento sustentável

A importância das parcerias e das pessoas que compõem o território é presente no sentimento de todos. Além disso, a universidade, mais do que uma instituição apoiadora, se mostra fundamental quando inserida na sociedade, dialogando com pessoas e buscando formas de qualificar a vida de todos.

Para Flavi, o trabalho realizado só faz sentido quando conectado com a comunidade. “Quando a Universidade foca nas pessoas e territórios e trabalha em prol da transformação social, ela faz a diferença. Ela faz sentido para as pessoas quando está próxima a elas no dia a dia. Sabemos que nem todos têm acesso à educação superior, então quando a universidade chega nas comunidades mais vulneráveis e essas comunidades reconhecem a universidade, isso dá sentido ao trabalho. Quando a universidade abraça o público dos territórios e ajuda a planejar e até executar algumas das políticas públicas, isso faz diferença e cria sentido para essas pessoas. Quando a universidade desenvolve a pesquisa qualificada e essa pesquisa tem repercussão mundial, inclusive estampa a capa da Nature, isso é incrível. Mas quando essa capa da Nature se reflete em produtos e serviços para essa comunidade, ela se apropria daquela descoberta e transforma isso em possibilidades de negócio, a partir da valorização de seus patrimônios. Isso cria sentido e faz transformação social”, afirma o pró-reitor. “

O gestor destaca, ainda, que esse é um momento de muita alegria, mas também de mais trabalho. “É uma alegria muito grande essa certificação. Estamos muito contentes com esse momento e já pensando no trabalho que vem pela frente. A certificação tem um prazo determinado e ela precisa passar por uma revalidação ao término do prazo. Então o trabalho não para e o ponto de partida, agora, é naquilo que os avaliadores indicaram como melhorias que devem ser implementadas. Mas hoje vamos comemorar! Vamos celebrar essas conquistas pensando com responsabilidade nos próximos passos. Isso é  motivo de júbilo para toda nossa grande região central, envolvendo esses dois territórios certificados pela Unesco como Geoparques Quarta Colônia e Caçapava”, celebra.

Esse mesmo sentimento é compartilhado pelo prefeito de Caçapava do Sul, Giovani Amestoy, que destaca que o reconhecimento da relevância internacional do patrimônio geológico, histórico e artístico marca uma virada de chave no futuro da região e das próximas gerações. “Fica o nosso agradecimento à Universidade Federal de Santa Maria e à Universidade Federal do Pampa que realizam esse projeto de desenvolvimento regional e, principalmente, à  população, empresários, artesãos, os quais são as forças vivas que movem nossa região”, cita.

Luciano Orsi,  presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), avalia que esse reconhecimento traz um novo olhar para as cidades da região, como itinerários turísticos e também com a ampliação das possibilidades de crescimento, trazendo novas oportunidades para as cidades nas regiões dos Geoparques. “O turismo, tanto regional como internacional, traz emprego, renda e aumenta a qualidade de vida para os habitantes com uma matriz econômica totalmente limpa. Por isso, temos orgulho de ter os Geoparques de Caçapava e da Quarta Colônia certificados pela Unesco”. Além disso, Orsi conta que a Famurs oficializou, na última semana, a criação de uma câmara temática (estruturas técnicas voltadas para estudos, avaliações e recomendações) em apoio aos Geoparques. O objetivo deste núcleo é criar oportunidades de capacitação profissional na área de turismo local aos habitantes dos municípios onde se localizam os geoparques. 

O presidente da Organização das Cidades Brasileiras Patrimônio Mundial (OCBPM), Mário Augusto Ribas do Nascimento, analisa que com o reconhecimento dos dois novos Geoparques, o Rio Grande do Sul apresenta potencial para se tornar referência tanto do turismo nacional quanto internacional, já que dos cinco territórios reconhecidos pela Unesco como Geoparques Globais, três estão no estado gaúcho. “A Organização Mundial do Turismo diz que nos próximos 50 anos a área turística irá crescer muito no Brasil. Vamos aproveitar esse ‘cavalo que está passando encilhado’, montá-lo e conduzi-lo para transformar o Rio Grande do Sul em uma referência nacional de turismo e tornar essa atividade uma das molas propulsoras da nossa economia”, afirma. O presidente da OCBPM observa que as ações realizadas pela UFSM são cruciais para que esse objetivo seja atingido. “A Universidade Federal de Santa Maria com seu conhecimento e equipe técnica tem sido muito importante para orientar os gestores municipais na teoria e na prática. Não existe desenvolvimento sem a participação da academia”, finaliza.

Em conjunto, todos sabem os próximos passos: trabalhar para manter a certificação e qualificar ainda mais as ações já desenvolvidas em todos os territórios.

Texto: Bernardo Silva, estudante de jornalismo e bolsista da Agência de Notícias
Foto de capa: Deni Zolin, Grupo Diário

Vídeos: Flavi Lisboa Filho
Edição: Mariana Henrique
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