Em novembro de 2016, a comunidade do bairro Diácono João Luiz Pozzobon, em Santa Maria, via um espaço coletivo se converter em um aterro sanitário, sem seu consentimento. A Associação de Moradores Dom Ivo Lorscheiter (Amordil) tinha então duas opções: abrigar o Centro de Tradições Gaúchas ou, por sugestão do líder comunitário Luiz Antonio Loreto, transformar o espaço em uma horta comunitária. A segunda ideia foi a que angariou mais adeptos.
Para levar o projeto da horta adiante, ele precisava de apoiadores. Um dos primeiros a serem acionados foi o Conselho de Segurança Alimentar de Santa Maria (Consea-SM), cujo presidente do conselho era então Juarez Felisberto, técnico-administrativo do Departamento de Zootecnia da UFSM e que, com o tempo, tornou-se um apoiador fundamental para a continuidade da horta. Com essa parceria foi promovida, em julho de 2017, durante a 24ª Feira Internacional do Cooperativismo (Feicoop), a Roda de Conversa “Hortas Comunitárias Agroecológicas: O desafio da produção de alimentos saudáveis em espaços urbanos”.
Já em 2018, coordenado por Juarez Felisberto, o projeto começou a dar seus primeiros passos com o apoio do Fundo de Incentivo à Extensão Universitária (Fiex) da UFSM. A iniciativa, apoiada pela Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN), possui o objetivo de enfrentar a insegurança alimentar no país, sobretudo em comunidades de vulnerabilidade social. Também houve o apoio do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), que busca promover a agricultura sustentável e combater a fome.
O coordenador Juarez conta que a inspiração do projeto vem de Maringá, no Paraná, do Centro de Referência de Agricultura Urbana e Periurbana da Universidade Estadual de Maringá, uma iniciativa que conta com 40 hortas comunitárias espalhadas pela cidade. Além disso, o técnico ressalta a importância das parceiras tanto dentro da Universidade quanto fora: o Museu dos Solos, o Departamento de Solos, ambos da UFSM, o Projeto Esperança, coordenado pela irmã Lourdes Dill, a Pró-Reitoria de Extensão da UFSM, dentre outros.
O Colégio Politécnico começou a participar recentemente, por meio do Setor de Olericultura e do Setor de Máquinas Agrícolas. O técnico Raviel tem colaborado com orientações técnicas para a equipe que coordena o projeto, assim como produzindo mudas de hortaliças para serem implantadas. Já o Setor de Máquinas Agrícolas está colaborando na abertura de uma nova horta, situada na Rua Zilda Arns. Além das parcerias dentro da Universidade, também houve o apoio das empresas Cotrel, com empréstimo de máquinas, e a Multi Fértil, com adubos para adubação, bem como de pessoas da comunidade que se envolvem pela causa.
Entre os objetivos do projeto estão a geração de renda direta e indireta, por meio da venda dos excedentes da sua produção, e a promoção de saúde preventiva e holística, que ocorre por meio da produção de um canteiro para ervas medicinais. Também é uma meta implementar o sistema de agrofloresta, no qual a produção e o cultivo dos solos procura minimizar os efeitos e impactos ambientais sobre a mata nativa existente. Além disso, são cultivadas as Plantas Não Convencionais Alimentícias (PANCs) e utilizadas sementes crioulas, para resgatar a valorização dos saberes regionais. O nome escolhido para a horta foi uma homenagem à moradora do bairro e ativista social, falecida em 2018.
“O trabalho na Neide Vaz tem sido muito gratificante”
Luiz Antônio Loreto, líder comunitário conhecido como Mestre Militar, ressalta como a horta melhorou a qualidade de vida das famílias. “O trabalho na Neide Vaz tem sido muito gratificante, cada família tem um canteiro, o excedente é vendido para complementar a renda de cada uma, e os relatos sempre ressaltam como a horta é terapêutica e como é incrível acompanhar e depois comer o que você mesmo produziu”. Além disso, as crianças, que antes não comiam hortaliças, apenas gostavam de produtos industrializados, começaram a melhorar sua alimentação por gostar de consumir os alimentos da horta. “Nós, aqui em casa mesmo, nunca mais compramos verduras no mercado, e às vezes conseguimos fazer uma refeição inteira só com o que produzimos”.
Mesmo com a pandemia, e as dificuldades que o projeto passou para continuar com os bolsistas e as reuniões, as famílias não pararam de produzir. Nesse período, o apoio veio de uma emenda parlamentar para poder continuar com o apoio dos bolsistas durante 2020. A horta comunitária Neide Vaz, mesmo tão jovem, já é exemplo e instiga outras comunidades da região de Santa Maria a fazerem o mesmo, servindo de objeto para artigos científicos, apresentações de trabalhos na JAI da UFSM (Jornada Acadêmica Integrada) e também na Feicoop.
Programa poderá alcançar mais bairros da cidade
A melhor notícia que podia chegar nesse momento é a inclusão do Programa de Hortas Comunitárias no Plano Diretor de Santa Maria, podendo, assim, alcançar mais bairros com o auxílio da Prefeitura. Uma iniciativa de uma pequena comunidade, junto com o estímulo à pesquisa dentro da Universidade e a intenção de uma produção sustentável e humana – pautas essenciais para o Brasil de hoje -, tornam o projeto um exemplo a ser seguido não só pelos santa-marienses, mas por todos os brasileiros.
Texto: Clarisse Amaral, da Assessoria de Comunicação do Colégio Politécnico
Fotos: Juarez Felisberto/acervo do projeto