Pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) publicaram nesta terça-feira (25) um estudo no periódico britânico Biology Letters em que apresentam uma solução evolutiva para um dos maiores desafios da paleontologia de vertebrados. A pesquisa propõe um rearranjo na base da árvore evolutiva dos ornitísquios, grupo que incluí os dinossauros com chifres e armaduras, como o Triceratops e o Ankylosaurus.
A árvore evolutiva dos dinossauros é composta por dois grupos principais, chamados de Saurischia e Ornithischia. Ambos tiveram origem durante o Período Triássico (entre 252 e 201 milhões de anos atrás).
A origem dos dinossauros saurísquios é bastante explorada, uma vez que são conhecidos diversos fósseis das formas mais primitivas deste grupo. Por outro lado, a origem dos dinossauros ornitísquios é um grande mistério, pois não há registros seguros de fósseis desses animais em rochas do Período Triássico, enquanto que em rochas dos Períodos Jurássico e Cretáceo o grupo é muito bem representado.
Sabe-se que os ornitísquios surgiram durante o Triássico por conta de “linhagens fantasmas”, as quais são reconstruídas por meio de análises filogenéticas (um tipo de reconstrução da árvore “genealógica” dos dinossauros). Em virtude disso, até o momento não se sabia como foi a origem deste grupo de dinossauros e nem como se pareciam as suas formas mais primitivas.
Estudo reduz “linhagem fantasma”
O novo estudo reduz a “linhagem fantasma” dos ornitísquios, preenchendo-a com um grupo de animais que eram considerados como “parentes próximos” dos dinossauros, mas não como dinossauros verdadeiros. Esses animais são chamados de silessaurídeos. Desta forma, os silessaurídeos passam a ser tratados como dinossauros e ainda são propostos como os “ancestrais” dos ornitísquios. Como os silessaurídeos são muito bem registrados em rochas do Período Triássico, eles fazem com que o grupo dos ornitísquios, que não tinha nenhum registro no Triássico, passe a apresentar uma grande diversidade em rochas dessa idade. De fato, os silessaurídeos são conhecidos em rochas de vários lugares do mundo, incluindo o Brasil, onde o grupo é representado pelo Sacisaurus agudoensis, um pequeno animal que viveu a cerca de 225 milhões de anos atrás e foi encontrado em Agudo, no Rio Grande do Sul.
Para chegar a esta nova hipótese, o paleontólogo da UFSM Rodrigo Temp Müller e o aluno do curso de Ciências Biológicas Maurício Silva Garcia combinaram, em uma única matriz de dados, as informações anatômicas de dezenas de novos esqueletos fósseis descobertos no mundo todo ao longo dos últimos anos. Ao unir os dados com o que se já conhecia, foi possível chegar a esta hipótese alternativa por meio de análises computacionais que processam a enorme quantia de dados anatômicos e recuperam as árvores evolutivas mais prováveis. Os últimos anos testemunharam descobertas significativas em relação aos dinossauros mais primitivos do mundo, inclusive muitas dessas descobertas realizadas em território brasileiro. Por outro lado, antes deste estudo, todas essas novas informações ainda não haviam sido combinadas em um único conjunto de dados abrangente.
Além de novas descobertas, nos últimos anos também foram propostas outras hipóteses evolutivas relacionadas aos dinossauros. Inclusive, chegou a ser proposto que os silessaurídeos pudessem estar relacionados aos dinossauros ornitísquios. Entretanto, diferente dos cenários anteriores, a nova proposta sugere que os ornitísquios teriam evoluído a partir de formas típicas de silessaurídeos, acumulando gradualmente as características típicas do grupo ao longo de milhões de anos. Todavia, os pesquisadores responsáveis pela pesquisa reconhecem que ainda é cedo para que a questão relacionada a origem dos ornitísquios possa ser considerada respondida, na verdade, a partir de agora a hipótese alternativa será testada à medida que novos esqueletos sejam descobertos e novas interpretações venham à tona.
Outra novidade que a hipótese alternativa revelou foi que o ancestral dos dinossauros ornitísquios foi possivelmente um carnívoro. Todos os ornitísquios conhecidos até o momento apresentavam características relacionadas a uma dieta herbívora (isto é, adaptados para comer plantas), porém, a nova hipótese sugere que o ancestral do grupo deve ter sido um animal pequeno e com dentes adaptados a dieta carnívora. Este mesmo padrão também tem sido observado para o grupo dos dinossauros sauropodomorfos (grupo que inclui os gigante pescoçudos), que teriam sido originados de um ancestral pequeno, bípede e carnívoro.
Texto e ilustração: Cappa/UFSM