A Editora UFSM realizou nos dias 4 e 5 de junho a segunda edição do Propague. A atividade ocorreu no auditório Audimax do Centro de Educação e reuniu cerca de 120 participantes. A iniciativa começou no ano passado e tem como objetivo destacar a importância de propagar o conhecimento e inspirar pessoas.
Com o tema “Como redigir, publicar e avaliar artigos científicos”, a edição deste ano trouxe o professor Maurício Gomes Pereira, doutor em Epidemiologia e professor emérito da Universidade de Brasília. Ele foi responsável por ministrar o curso de aperfeiçoamento da escrita científica.
Em entrevista à Agência de Notícias, da Coordenadoria de Comunicação Social da UFSM, o professor Maurício contou sobre a sua relação com a escrita e deu dicas de como qualificar o texto acadêmico.
Agência de notícias – O que motivou o seu interesse pela escrita científica?
Maurício Pereira – Primeiro, a minha família é de leitores. Eu vivia no meio de bibliotecas, meu pai me contava histórias e me presenteava com livros. Sentia desde sempre que a ciência me atraía e, foi isso, que me guiou para essa área. O fato de trabalhar em uma universidade também contribuiu muito porque eu sou pago para dar aula, me atualizar e produzir artigos científicos. Eu aproveitei essa oportunidade, desenvolvi a mentalidade científica e passei a orientar os alunos. Por ser médico, já recebi muitos convites para trabalhar em clínicas mas eu não quis. Tento ao máximo direcionar minha carreira para a escrita científica, que é pelo que eu me interesso.
AN – Qual a importância de saber escrever um bom texto científico?
MP – É essencial porque ninguém lê textos difíceis. Então tem que saber comunicar o que você sabe. Se não conseguir fazer isso, as pessoas não vão te dar valor. A escrita científica é nada mais que saber comunicar o que você está pesquisando de uma maneira simples para que as pessoas entendam.
AN – A propagação da escrita científica pode beneficiar não só o pesquisador mas também o público a que se dirige? Como?
MP – Fundamentalmente. No meu caso, faço pesquisa para melhorar a saúde da população, mas essa relação não ocorre de forma direta. O pesquisador detém um conhecimento que a pessoa leiga não domina, então tem que fazer o texto científico chegar até a outra ponta do processo. Para isso acontecer devem ser feitas duas coisas igualmente importantes: publicar e divulgar [artigos científicos]. Com isso você colabora para que a população possa utilizar do conhecimento que é produzido na academia. Se isso não acontecer, a pesquisa científica não faz sentido.
AN – Quais são os erros mais comuns que você identifica na escrita acadêmica que impedem o texto de atingir um nível de excelência?
MP – A maior dificuldade é transformar o método científico, que é uma sistematização de procedimentos, em texto escrito. O pesquisador tem que dominar o método que ele utilizou para poder explicar as etapas que foram percorridas e qual a conclusão que se obteve ao final do processo. Essa transposição é muito difícil, principalmente para os iniciantes.
AN – Quais sugestões você dá para quem quer aperfeiçoar a escrita científica e busca eficiência na publicação de trabalhos?
MP – Revisão de texto é essencial e precisa ter foco. Em muitas das bancas que eu participo, a pergunta em torno da qual se desenvolve o artigo é mal formulada. Na progressão do trabalho, o pesquisador fica tateando e a conclusão não responde a problemática proposta. A pergunta tem que ser direta e objetiva, o que facilita o desenrolar da pesquisa. Para mim, os pontos cruciais são uma boa pergunta e um método assertivo. Depois que o texto está escrito é hora de aplicar as três dicas que eu dei durante o curso: revisão, revisão, revisão. Você tem que fazer com que a pessoa que vai ler entenda e se encante com seu texto, esse é o caminho.
AN – Em relação à capacitação para obter aprovação de artigos em revistas de alto impacto, a redação científica é em si um diferencial ou o que conta é um trabalho metodologicamente bem feito? Quais são os fatores que influenciam as seleções de trabalhos?
MP – É a união do texto bem escrito com um método eficiente. Outro fator decisivo é que as revistas de prestígio não aceitam artigos grandes. O trabalho tem que ser o mais conciso e claro possível.
AN – Quais são os maiores desafios para quem quer fazer ciência hoje no Brasil?
MP – O Brasil é um país complicado. Você demora anos para construir um grupo de pesquisa. De repente falta dinheiro e dentro de dias o grupo desaparece. Um grupo de pesquisa precisa de estabilidade para progredir. Nos países desenvolvidos existe disponibilidade de recursos porque são realizados investimentos em ciência e tecnologia. Existe um desconhecimento dos requisitos mínimos necessários para produção científica. Sem recurso nada funciona.
Texto e foto: Bruna Eduarda Meinen Feil, acadêmica de Jornalismo e bolsista da Agência de Notícias