O reitor da UFSM, Paulo Afonso Burmann, classificou os cortes orçamentários anunciados pelo MEC como um contingenciamento “sem precedentes” em entrevista coletiva à imprensa concedida no final da tarde desta quarta-feira (15), no plenarinho da Câmara de Vereadores de Santa Maria, antes da audiência pública em defesa da UFSM.
Burmann lembrou que a Universidade já vem tendo seus orçamentos encolhidos desde 2014, mas o corte que se anuncia para este ano, de 34%, representa um impacto muito grande, pois a Instituição terá a lei orçamentária anual mais enxuta desde 2010, e neste período a Universidade cresceu consideravelmente, havendo necessidade, pelo menos, de uma equiparação orçamentária.
Segundo o reitor, o momento é de muita dificuldade e, mantendo-se a previsão, o cenário para o segundo semestre é desanimador. “Estamos experimentando um momento de muita dificuldade, que se traduz na quase impossibilidade de honrar os compromissos a partir de setembro. O orçamento de custeio sofreu um impacto na ordem de R$ 37 milhões, e no de investimentos, que são obras e equipamentos, chegamos a quase R$ 12 milhões de bloqueio orçamentário. Isso engessa as ações da Universidade e também traz um impacto muito importante para a economia da região”, afirmou.
É justamente o corte para custeio o que mais preocupa no momento, segundo o reitor. Isso deve impactar no pagamento de despesas como energia elétrica e nos contratos com terceirizados, que deverão ser renegociados. No início deste ano já houve uma redução no número de trabalhadores terceirizados em setores como o de limpeza, assim como já ocorrera em 2017, e a tendência é de um enxugamento ainda maior. Atualmente a UFSM mantém mais de 900 terceirizados.
Em relação a obras, da mesma forma, nunca o cenário foi tão preocupante. Recursos já empenhados em 2018 garantem o ritmo de algumas obras apenas até este mês de maio. “Estamos discutindo como isso vai impactar nas obras daqui para a frente. Não há recurso disponível para empenho em obras neste momento, e isso significa, sim, pela primeira vez nos últimos cinco anos, em que respondemos pela gestão da UFSM, a paralisação de obras por falta de recursos”, afirmou Burmann.
A expectativa é de que o governo cumpra com o compromisso assumido de não deixar faltar recursos para obras que estejam mais de 80% concluídas – a UFSM tem dezenas nesta situação. Um exemplo é o campus de Cachoeira do Sul. Os prédios já em funcionamento, conforme o reitor, foram concluídos graças ao empenho da comunidade, pois dos R$ 129 milhões pactuados em 2014, somente pouco mais de R$ 18 milhões foram recebidos.
A reposição de servidores é outra preocupação, especialmente de técnico-administrativos, já que desde o ano passado houve a extinção de 360 cargos na UFSM, e as instituições, antes de abrirem concurso público, precisam consultar o Ministério da Economia para ver da possibilidade de terceirização. Em relação a docentes, por enquanto não há alteração prevista. “Esperamos que isso seja revisto pelo governo. Todos os servidores são importantes para que, além de ensino, pesquisa e extensão, formemos mais de cinco mil profissionais todos os anos”, afirmou.
A oferta de vagas para alunos também deve sentir os impactos da redução orçamentária, em todos os níveis. A abertura de novos cursos de pós-graduação, por exemplo, está comprometida. Mesmo o ensino a distância, disponibilizado pela Instituição por meio dos polos EaD, que tem um custo mais baixo, está “quase inviabilizado”.
Com relação a bolsas de pós-graduação, o reitor informou que houve a devolução para a Universidade de algumas bolsas que haviam sido recolhidas pela Capes com a justificativa de que estariam ociosas. Na verdade, as bolsas estavam em processo de transição entre alunos que terminaram a pós e os que estavam por assumir. Porém, o impacto da restrição orçamentária sobre a pós-graduação não se restringe às bolsas, já que compromete o custeio real da Universidade. “Todos nós sofremos as consequências”, ressaltou.
Questionado sobre as críticas do governo à área de Humanas, o reitor defendeu os cursos, que, segundo ele, têm sido cada vez mais valorizados pelo setor privado. “O MEC fala apenas em estatísticas e números, sem falar que na ponta do processo há pessoas”, afirmou. Também falou sobre o papel central na mobilização das universidades desempenhado pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), que, até três meses atrás, não teve qualquer abertura para dialogar com o governo.
Burmann avaliou que os protestos realizados nesta quarta-feira em todo o país se traduzem em uma mensagem muito clara da população às lideranças, independente de partidos e ideologias: a educação não pode ser tocada. “O ataque não é só ao orçamento, mas à ideia de universidade pública, como perspectiva de futuro para a sociedade brasileira”, afirmou. Quanto à convocação para o ministro da Educação, Abraham Weintraub, comparecer à Câmara dos Deputados na tarde em que ocorriam as manifestações, avaliou que é sinal de que há uma crise a ser resolvida, e disse esperar que surjam respostas do diálogo entre Executivo e Legislativo.
A entrevista coletiva contou com a presença do vereador Jorge Trindade, o Jorjão (Rede Sustentabilidade), que enfatizou o apoio da Câmara às causas da UFSM. “Aqui faremos uma grande resistência”, disse, no encerramento.
Reportagem: Agência de Notícias
Foto do destaque: Marcelo De Franceschi