A instituição “universidade” pauta suas ações, cotidianamente, sobre a reflexão, o pensamento crítico, o desafio do conhecimento e a liberdade. A Universidade, como espaço da democracia, da diversidade e da liberdade de pensamento é aberta em todos os seus processos. Aliás, o acesso amplo e inclusivo, a permanência e a diplomação, que preparam para o exercício da cidadania emancipatória e para o mercado de trabalho, exigem a permanente postura reflexiva.
A construção de ideias e a atitude crítica fazem parte do processo educacional. Daí a necessidade do debate e do respeito às diferentes ideologias, justamente para preservação das diversas formas de pensar. Tolher a capacidade de dialogar entre os saberes e impor um pretenso saber “neutro” que, por sinal, não existe de fato, é acabar com o bem mais precioso do processo educacional e civilizatório: a liberdade. Sem liberdade não há democracia e nem tampouco possibilidade de escolha.
Assim, a via pela qual anda o projeto de lei “Escola Sem Partido”, além de equivocado conceitualmente, fere intensamente os direitos e garantias fundamentais, a liberdade de pensamento e de cátedra e a autonomia universitária e educacional em seus valores basilares.
É necessário ter a compreensão de que ao pressionar os professores em seus espaços de atuação, esta proposta está, igualmente, pressionando os estudantes e, de fato, assumindo uma postura ideológica às avessas, transitando pelo insólito caminho do fundamentalismo político-ideológico extremista que incita à intolerância, ao conflito e à violência. Também, por aí se agrega mais resíduo negativo: o medo entre os profissionais da educação, do conhecimento, da informação responsável e da ciência da perseguição por divergência de ideias, os discursos de ódio, de preconceito e de racismo.
Trato aqui de convidar a uma reflexão sobre a preservação dos princípios e garantias constitucionais (Art. 205 da Constituição Federal, que assegura a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber) e sobre respeitar as normas básicas da educação brasileira, como a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Art. 30), bem como fortalecer o entendimento do direito à educação internacional e multilateral entre nações ao redor do mundo, conforme defende e garante a Organização das Nações Unidas.
As instituições educacionais precisam se fortalecer e mobilizar a comunidade por aquilo que lhe é mais caro: pela continuidade da civilidade, da democracia e da liberdade. As universidades são bens inalienáveis para qualquer sociedade racionalmente organizada, independentes de partidos, ideologias, seitas, raças, etnias, gênero e orientação sexual.
Portanto, em respeito, às conquistas democráticas, às garantias constitucionais, ao livre e responsável debate nos espaços educacionais e à democracia, continuarei defendendo a universidade como o espaço público da paz, onde todas as ideologias possam se manifestar e ser ouvidas, fazendo prosperar a tolerância e o respeito mútuo a quaisquer diferenças, inclusive as do pensamento; onde a ciência, o conhecimento e a formação profissional de qualidade e cidadã se fortaleçam por um projeto de país livre e soberano.
Paulo Afonso Burmann
Reitor da UFSM
* Texto originalmente publicado na página 2, da edição desta quarta-feira (6), do jornal Diário de Santa Maria.