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Eliane Brum: a difícil arte de ver e escutar



 

 

A palestra específica de jornalismo da 36ª SECOM aconteceu na tarde da quarta-feira, diante de um Auditório Sérgio Pires lotado. Vencedora de diversos prêmios nacionais e internacionais, entre eles o Esso, o Vladimir Herzog e o Jabuti, a jornalista e escritora Eliane Brum compartilhou suas experiências ao longo de mais de duas décadas de carreira, em veículos como o jornal Zero Hora e a revista Época. Eliane, uma das principais jornalistas literárias do país na atualidade, partiu do pressuposto de que uma boa reportagem está intimamente ligada com a capacidade de ver e escutar daquele que a escreverá – uma boa história pode estar em qualquer lugar, mas cada repórter deve descobrir quais são, e como vai contá-las. Para contar sua própria história na profissão, ela optou por mesclar comentários sobre sua experiência com leituras de trechos de reportagens que escreveu.

“Não existem vidas comuns. O que existem são olhos viciados”. O trabalho de Eliane inclui uma marcante observação sobre o cotidiano de pessoas anônimas e tidas como “desinteressantes” pela maior parte dos editores. Essa característica ficou explícita na série de reportagens “A vida que ninguém vê”, publicada originalmente pela Zero Hora no final dos anos 90 e mais tarde reunida no livro homônimo. Com o tempo, contou Eliane, os leitores passaram a escrever não apenas para contar suas histórias, mas para manifestar como a leitura daqueles perfis de gente comum havia lhes provocado a descoberta de que suas próprias vidas não eram, afinal de contas, “tão sem graça assim”.

Listando, ao longo da fala, uma série de casos e reportagens específicas que fez, Eliane Brum traçou um interessante panorama de seu trabalho e, ainda mais, da sua forma de ver o jornalismo. Por vezes, a fala atingia níveis inesperados de emotividade – as nuances e a profundidade revelada das pessoas invisíveis, os estereótipos derrubados por uma apuração mais minuciosa, e relatos de dramas acompanhados pela repórter eram descritos com tal delicadeza que, muitas vezes, parte da plateia era levada às lágrimas. Casos como os das “mães do tráfico”, as mulheres que começavam a pagar o caixão dos filhos ainda em vida, sabedoras de que o destino deles seria uma morte precoce nos conflitos da favela; ou então o da ex-merendeira Ailce de Oliveira Souza, diagnosticada com um câncer incurável e acompanhada nos últimos 115 dias de vida pela repórter.

Da reportagem sobre Ailce, Eliane tirou algumas lições profissionais e também de vida. Muitas de suas decisões posteriores – abandonar o cotidiano da revista e se dedicar mais a projetos pessoais, iniciar uma carreira na literatura de ficção – partiram de uma frase dita por Ailce durante o convívio de ambas. A merendeira havia acabado de se aposentar quando descobriu a doença sem cura e, a certa altura, comentou: “quando eu tive tempo, descobri que meu tempo tinha acabado”. Para o jornalismo de Eliane Brum, a experiência também foi marcante – cada vez mais, diz ela, seu trabalho consiste em fazer menos perguntas. Embora nem sempre seja possível fazer uma entrevista sem o direcionamento de um questionário, o segredo do jornalismo literário é escutar. Eliane diz que, se tivesse começado o convívio com Ailce questionando algo óbvio – por exemplo, como era a vida desde que se descobrira o câncer – jamais saberia que ela nunca se referiu à doença que a mataria pelo nome; o câncer sempre foi, para Ailce, “a doença”.

“Se eu não soubesse disso, teria contado uma outra história, e não seria a Ailce”, disse a repórter, que ainda comentou sobre a necessidade de o jornalista ter a noção de que qualquer trabalho seu, seja uma nota ou “uma matéria de vinte páginas”, tem o poder de influenciar e dizer, para quem a ler no futuro, “o que foi o nosso tempo na história”.

Repórteres:

Maurício Brum e Camila Marchesan – Acadêmicos de Jornalismo.

Edição:

Gisele Dotto Reginato – Professora do curso de Jornalismo – UFSM.

A cobertura colaborativa da 36ª Semana Acadêmica de Comunicação Social da UFSM, realizada pelos alunos do sexto semestre de Jornalismo da UFSM, está disponível no site http://facoscolaborativa.wordpress.com.

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