“O papel do farmacêutico no mundo é tão nobre quão vital. O farmacêutico representa o órgão de ligação entre a medicina e a humanidade sofredora. É o atento guardião do arsenal de armas com que o médico dá combate às doenças. É quem atende às requisições a qualquer hora do dia ou da noite. O lema do farmacêutico é o mesmo do soldado: servir. Um serve à pátria; outro serve à humanidade, sem nenhuma discriminação de cor ou raça. O farmacêutico é um verdadeiro cidadão do mundo. Porque por maiores que sejam a vaidade e o orgulho dos homens, a doença os abate – e é então que o Farmacêutico os vê. O orgulho humano pode enganar todas as criaturas: não engana ao farmacêutico. O farmacêutico sorri filosoficamente no fundo do seu laboratório, ao aviar uma receita, porque diante das drogas que manipula não há distinção nenhuma entre o fígado de um Rothschild e o do pobre negro da roça que vem comprar 50 centavos de maná e sene.”
Foi inspirado nas ideias expostas por Monteiro Lobato nas palavras acima que o Dr. Francisco Mariano da Rocha (na foto), em reunião da recém fundada Sociedade de Medicina, no ano de 1931, demonstrou seu interesse em criar, na cidade de Santa Maria, a Faculdade de Farmácia e Odontologia. A recente regulamentação da profissão farmacêutica, em 1930, juntamente com a carência sentida pela classe médica de profissionais que pudessem auxiliá-la na manipulação e no receituário de medicamentos aos pacientes, foi o grande impulso para a criação do curso que orgulhosamente se reconhece como “a mãe” da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
A primeira escola de farmácia do Brasil foi instalada na então Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro, no ano de 1832. A Sociedade de Medicina de Santa Maria foi criada praticamente um século depois, em janeiro de 1931 e a posse de seu primeiro presidente – Dr. Francisco Mariano da Rocha – foi realizada em 11 de março, daquele mesmo ano. A moção de criação da Faculdade de Farmácia e Odontologia foi apresentada pela presidência da entidade em 30 de setembro de 1931. Por esse motivo, na próxima sexta-feira (30), o curso de Farmácia da Universidade Federal de Santa Maria comemora os 80 anos do ensino farmacêutico na cidade.
A apreciação da moção foi feita no dia 1º de outubro de 1931, culminando na criação da Faculdade de Farmácia da cidade de Santa Maria. A intenção de fundar uma faculdade que lecionasse ciências farmacêuticas e odontológicas acabou não se concretizando. Entraves burocráticos e a falta de profissionais especializados em odontologia dispostos, naquele instante, a construir um curso superior na área em Santa Maria impediram que a ideia original fosse levada adiante.
Assim, a instalação da faculdade de Farmácia foi concluída e inaugurada oficialmente, em 27 de fevereiro de 1932. A primeira turma (na foto), com sete formandos, concluiu o curso no ano de 1935. A oradora da turma foi Celeste Mariano da Rocha, filha do Dr. Francisco. O baile de formatura foi realizado no salão nobre da Sociedade União de Caixeiros Viajantes (SUCV), no centro de Santa Maria.
O primeiro diretor do curso foi o próprio Dr. Francisco Mariano da Rocha, e seu vice-diretor o Dr. Severo Evaristo do Amaral. Foram eles quem dirigiram a Faculdade de Farmácia até o ano de 1944. O primeiro farmacêutico a dirigir o curso foi o professor farmacêutico Hélios Homero Bernardi, nos anos de 1944 e 1945.
Em 1942, o governo federal, por meio de ação do então presidente da república Getúlio Vargas, reconheceu a validade do diploma dos farmacêuticos formados pela Faculdade de Farmácia de Santa Maria, quando a mesma enfrentava grandes dificuldades financeiras. A recessão econômica e o pessimismo gerados pela II Guerra Mundial afetaram a economia do Brasil. Nos anos de 1942, 1943 e 1944, não houve interessados em participar do vestibular da Faculdade de Farmácia.
O carinho pela instituição e a certeza de que a iniciativa do Dr. Francisco Mariano da Rocha prosperaria fez com que dois alunos – Walter Ritzel e Clodomiro Bertoldo – formados, respectivamente, nos anos de 1936 e 1939, retornassem às cadeiras do curso para que o mesmo não fosse fechado. Clodomiro Bertoldo retornou no ano de 1945 e Walter Ritzel, em 1946. Este último foi também diretor do curso de Farmácia, na já instalada UFSM, entre os anos de 1970 e 1980.
Também em 1946, Dr. José Mariano da Rocha Filho, sobrinho do fundador, assumiu a direção do curso, permanecendo até 1960, ano da fundação da Universidade Federal de Santa Maria. Até então o curso era pago. Investimentos de empresários, da comunidade médica, dos alunos e suas famílias e da sociedade santa-mariense asseguravam os recursos financeiros que mantinham a faculdade funcionando.
Trabalho e religiosidade: a fé que motiva
A fé, segundo Dr. Francisco, também contribuiu para a conservação do curso. Promessas e pedidos para superar a crise foram feitos à Nossa Senhora Medianeira. Católico praticante e fervoroso, o fundador do curso de Farmácia contou com sua devoção para enfrentar os piores momentos da história do curso. A única oportunidade, desde o seu surgimento, em que teve seu funcionamento ameaçado. Preces atendidas, promessa cumprida: a padroeira de Santa Maria tornou-se, também, padroeira da Universidade.
Segundo o professor José Edson Paz da Silva, atual coordenador do curso, e a professora Gizele Scotti do Canto, coordenadora substituta, é de fé, de persistência, competência e empreendedorismo que vive até hoje o curso de Farmácia da UFSM. A cada ano o curso recebe 100 novos alunos. Hoje são 482 matriculados. O curso conta com um dos corpos docentes mais bem conceituados da Universidade: 90% dos professores possuem doutorado.
Nesta semana inicia a Jornada Acadêmica Profº Fugued Calil. É a semana acadêmica do curso de Farmácia comemorando os 80 anos do ensino farmacêutico na cidade. Professor Fugued formou-se em Farmácia no ano de 1951 e no ano seguinte ingressou no corpo docente da faculdade. No evento, estará presente Almery Dias Athayde Bellem, a mais antiga farmacêutica formada em Santa Maria, no ano de 1936. Será um encontro histórico entre os farmacêuticos de todas as gerações da Faculdade de Farmácia da UFSM.
Repórter:
Fernanda Arispe – Acadêmica de Jornalismo.
Editor:
Lucas Missau – Jornalista.